sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Adauto Suannes escreveu e vale a pena ler

Currículos

Quando pertencia ao Tribunal de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados de São Paulo, tive oportunidade de lançar um parecer no qual demonstrava o descabimento de todos os advogados poderem usar o título de "doutor", coisa que vinha do Império, mais exatamente quando, em 11 de agosto de 1827, criaram-se os primeiros cursos jurídicos no país. De acordo com as leis da República, doutor é aquele que defende tese original perante banca autorizada a aprová-la, como diz a lei nº 9.394/96, dita Lei de Diretrizes e Bases da Educação. A lei n° 8.906/94, que é o Estatuto da OAB, não repete o que vinha na lei imperial, que passou a ser incompatível com a legislação que rege a outorga de tal título, como é óbvio. Pura questão de hermenêutica. Ou de exegese, se quiseres.
Por falar nisso, já ouviu falar de Carlos Maximiliano Pereira dos Santos? Não? Então procure no Google e você descobrirá quem foi ele e o que fez na vida. Dentre outras coisas, saberá que foi nomeado, aos 63 anos, Ministro do Supremo Tribunal Federal, graças a seu "notável saber jurídico" e sua "conduta ilibada".
Está bem, você já tem quarenta anos e nunca tinha lido a palavra ilibado. Nem ouvido. Talvez porque os hábitos atuais das pessoas não incluem mais a ilibação, que é o "ato ou efeito de ilibar". Mas a palavra notável você certamente conhece. Se arável é o terreno que dá para ser arado, comestível é aquilo que dá para ser comido, notável é aquilo que dá para ser notado. Uma gravidez de 8 meses é uma coisa notável. Livros jurídicos, artigos jurídicos, teses jurídicas são trabalhos que nos permitem notar se seu autor possui ou não "saber jurídico". De acordo, Nelson Jobim?
Carlos Maximiliano, aos 52 anos de idade, publicou Hermenêutica e Aplicação do Direito, obra de tal importância que até hoje, já na 19ª edição, é consultada por quem leva o Direito e o Poder Judiciário a sério. As edições que se seguiram à aposentadoria do autor trazem um capítulo final que é a reprodução do discurso por ele pronunciado quando se despediu do STF. Entre outras coisas, ele diz que, a partir de agora, voltará a gozar da vida social, que julgava algo incompatível com a relevância do cargo que até então ocupava. Sua conduta, antes, durante e depois foi, sem a menor dúvida, limpíssima. E seu saber jurídico pôde e pode ser apreciado dos trabalhos escritos que deixou.
Imaginemos que Carlos Maximiliano houvesse tentado por duas vezes ingressar na Magistratura por concurso. Reprovado, desistiu de uma terceira tentativa, quando, certamente, mais bem preparado, não teria tido dificuldade em ser aprovado, chegando, com o tempo, a desembargador, "como toda a gente", com a licença do Eça. Faltou-lhe coragem? Reconheceu seu despreparo? Descobriu não ser essa sua verdadeira vocação? Nunca saberemos, pois estamos no campo das conjecturas.
Digamos que, por motivos vários, não houvesse ele subscrito os lapidares pareceres que lavrou como Consultor-Geral da República e seu Procurador-Geral, cargo que ocupou até tornar-se Ministro do STF. Nem tivesse publicado seus Comentários à Constituição Brasileira de 1891, seu inigualável Direito das Sucessões ou seu conhecidíssimo estudo sobre a propriedade condominial. Alguém, sem trair o que dizem os dicionários, poderia dizer ter ele "notável saber jurídico"? Digamos mais: mesmo sem ter o chamado "notável saber jurídico", nem merecer o título de "doutor" pelas leis da República, nem o título de "mestre", nem o de "pós-doutorado" (lato ou stricto sensu), nem de especialização em coisa nenhuma, que diríamos se houvesse Carlos Maximiliano sido contratado para dar assistência a algum governo estadual ou municipal, durante um ano, recebendo, por mês, valor correspondente a 140% daquilo que viria a receber no Supremo Tribunal Federal, mesmo tendo o tal Estado ou o tal Município um corpo de advogados que são remunerados exatamente para defendê-lo? No caso, o serviço a ser prestado por Carlos Maximiliano não se revestiria "de natureza singular, nem considerados os serviços em si, nem considerado o seu prestador, de quem não se requeria notória especialização, visto tratar-se de demandas com temática rotineira", como registraria o juiz que, eventualmente, viesse a julgar ilegal aquela hipotética contratação.
Quem dará a resposta a tais indagações não serei eu. Deixo-a a cargo do Superior Tribunal de Justiça, intérprete máximo das leis federais, como sabe qualquer Advogado-geral da União:
"Pode a Administração Pública, excepcional e motivadamente, mesmo quando conta com consultoria jurídica própria, contratar advogados. Mas, para fazê-lo, precisa licitar, exceto quando notável o saber jurídico do Advogado e absolutamente singular o serviço a ser prestado. Quanto a este último requisito, o que se observa in casu é que a Prefeitura de Itatiba buscou singularidade no atacado, como forma de disfarçar a terceirização em bloco de atividades que são próprias e bem podem ser executadas pelos Advogados que integram, com vínculo público, a Administração. Já no que tange ao primeiro requisito, cabe lembrar que, em Direito, notória especialização é aquela de caráter absolutamente extraordinário e incontestável. Ela fala por si. É posição excepcional, que põe o profissional no ápice de sua carreira e do reconhecimento, espontâneo, do mundo jurídico, mesmo que regional, seja pela longa e profunda dedicação a um tema, seja pela publicação de obras e exercício da atividade docente em instituições de prestígio". É o que se lê no Recurso Especial n° 488.842/SP (2002/0163048-3), relator o Ministro Castro Meira.
A coluna Circus, integrante do site Migalhas (www.migalhas.com.br), é assinada pelo ilustre migalheiro Adauto Suannes, autor do livro "Justiça & Caos" (clique aqui). Conheça também o blog do colunista clicando aqui.

Revista Systemas

A quem possa interessar comunico que a chamada por artigos inéditos (de 10 a 30 páginas) para publicação na Revista Systemas (2.º semestre/09) começou a ser feita. Trata-se de excelente trabalho coordenado por Marco Aurélio Borges. O prazo máximo para envio dos artigos é dia 15 de novembro. A edição sairá até o final do ano.

Congresso Nacional do Ministério Público

Entre 25 e 28 de novembro, em Florianópolis, realizar-se-á o próximo Congresso Nacional do Ministério Público. Tentei fazer minha inscrição, mas descobri, posteriormente, que o encontro é destinado única e exclusivamente para membros e associados. Infelizmente, assim, não poderei participar da seleção de teses para devida apresentação. Havia escrito sobre o crime embriaguez ao volante. Continuo batendo nesse assunto. E a oportunidade não seria melhor, porquanto uma boa parte do MP não escreve adequadamente sobre o assunto. Fica a sugestão para uma abertura de horizontes nos próximos congressos: permitir a participação de "estrangeiros".
Não obstante, tenho a possibilidade de realizar a apresentação da tese aqui. Na verdade, não vou destacar a tese, mas apenas uma síntese dogmática e sua fundamentação, bem como os motivos que me fizeram escrever sobre o assunto. Segue:

Síntese Dogmática e Fundamentação

Esta tese enfoca o crime de embriaguez ao volante com o propósito de sugerir novos critérios para tipificação da ação delitiva e o conseqüente aperfeiçoamento da legislação de trânsito. Para esse desiderato faz-se necessário: a) uma análise do real bem jurídico tutelado na incriminação; b) uma análise da estrutura do delito competente para legitimar a infração; c) uma análise da tipicidade delitiva e constatação de procedimento único para aferição da dosagem alcoólica; d) uma análise da inconstitucionalidade de certos meios para comprovação da alcoolemia.

A primeira análise partirá necessariamente da desconstituição de postura doutrinária reverenciada por grande parte do Ministério Público e que diz respeito ao bem jurídico penal tutelado na incriminação: a incolumidade pública no aspecto da segurança de trânsito. Essa construção, também amplamente aceita nas Cortes de Justiça, não passa de um retrocesso. Os argumentos de sua ruptura devem passar pela interpretação de três problemas, a saber: à essência de definição do bem jurídico penal; a antecipação da legitimação do direito penal; e, a legitimação da cominação de pena exagerada ao delito.

A segunda análise discorrerá sobre a estrutura do delito. Como a presente incriminação não se trata de crime de dano e nem crime de perigo, questionar-se-á sobre a legitimidade de uma infração de perigo abstrato regular uma proibição, pois esta é a natureza jurídica do atual delito de embriaguez ao volante.

A terceira e quarta análise serão unificadas. Partirá da mais relevante polêmica descortinada com a promulgação da nova Lei de Trânsito e que diz respeito ao nascimento sem vida do preceito em relação à constatação da concentração da embriaguez se o condutor do veículo automotor se negar em ceder seu corpo ou parte dele para a realização do exame pericial, para alcançar a conclusão que não há mais possibilidade de suprir uma eventual negativa por meio de qualquer prova em direito admitida e que a utilização do bafômetro é inconstitucional. No estudo serão rebatidas todas as teses conhecidas no sentido de fazer valer a qualquer custo a presente redação do crime. Será desconstituída a alegação de que os direitos fundamentais individuais devem ser restringidos em face da prevalência dos direitos fundamentais coletivos. Na seqüência serão apresentadas outras construções, quase todas sem fundamentação jurídica, algumas sugeridas por membros do Ministério Público, com as respectivas negativas teóricas. No final serão propostos critérios para uma nova redação do respectivo crime.

As razões da escolha da tese estão estreitamente relacionadas aos objetivos do Congresso. Justifico os porquês com a seqüência relacionada no art. 1º do Regimento Interno (vide conteúdo no site do congresso).

Quanto ao inciso I e sob dois ângulos: a) primeiro: relacionado apenas ao desempenho do Ministério Público: se a tônica é ainda continuar fazendo valer os ensinamentos de populares da Instituição – leia-se Damásio de Jesus e Fernando Capez – que apenas se registre que esses ainda não realizam uma análise do direito penal e do direito processual penal sob um viés constitucional. Torna-se perigoso, portanto, continuar manuseando esses autores; b) segundo: relacionado às atribuições constitucionais e legais: como a Constituição consagra a legitimidade de atuação ministerial, esta deve ser sempre justa, verdadeira e ética. Logo, nenhum representante ministerial pode tratar os direitos fundamentais como questões estéreis ou questiúnculas – o que inclusive contraria um objetivo constante no inciso seguinte – e também não pode desvirtuar decisão do Poder Judiciário como interpretação conforme ao seu interesse – o que inclusive afasta a interação que se deseja em outro inciso.

Quanto ao inciso II: se a pretensão é mitigar conflitos para efetivar direitos fundamentais apenas não se deve esquecer que não se pode tolerar uma violação de direito fundamental em nome de resultados, isto é, a promoção da justiça deve ser feita no estrito marco da legalidade, proporcionalidade e razoabilidade.

Quanto aos incisos III e IV: considerando as inúmeras denúncias não recebidas pela ausência de materialidade e considerando os vários recursos indeferidos pela apresentação de alegações infundadas, como o quadro atual no que diz respeito ao presente delito, questiona-se: até quando será interessante colocar em prática o adágio espanhol de “que mais vale morrer de pé do que viver em joelhos”, cada autoridade ministerial a seu modo, para fazer valer a incriminação? Não está na hora de se valer do Órgão que representam para deflagrar bandeira pela revogação do presente crime e proposição de um novo texto legal, quiçá, sem estipular um limite mínimo de álcool, destacando que o condutor esteja sob o seu efeito e sendo possível aferir essa circunstância por meio de qualquer prova em direito admitida? Em síntese, enquanto não se verificar a aproximação com o Poder Legislativo, mais distante estará a realização da justiça e a pacificação social.

Quanto aos incisos V e VI: todo o texto tem o objetivo de melhorar a legislação de trânsito especificamente em relação ao crime de embriaguez ao volante. Por fim, o congraçamento pode ser alcançado ainda que não valham os argumentos das autoridades, mas a autoridade dos argumentos.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Doutorado UFSC

Hoje recebi a notícia pelo próprio colega de docência Júlio Marcellino Júnior de sua aprovação no doutorado da Universidade Federal de Santa Catarina. Resta parabenizá-lo por essa importante conquista, na qual todos ganham: Júlio, pela possibilidade de nova confirmação de sua capacidade de pesquisador e professor; os futuros colegas, pela possibilidade de somarem conhecimento com sua presença; a Universidade, por permitir - como fruto de direito adquirido honestamente - que competente profissional adentre ao seu recinto; e, por certo, todos aqueles que tiverem chance de conversar, escutar e discutir com o aprovado. Vale, a título de ilustração, destacar passagens dos Prof. Doutores Alexandre Morais da Rosa e Jacinto de Miranda Coutinho, presentes no livro abaixo apresentado, de autoria do recém aprovado.


domingo, 6 de setembro de 2009

A língua é o chicote da bunda, parte 1

Já é antiga essa expressão "a língua é o chicote da bunda". E realmente quem fala demais ou fala aquilo que não ocorreu deve arcar com as consequências. Exemplificando...

A 1ª Câmara Criminal do TJSC negou provimento ao recurso interposto por Jaimir Ribeiro, contra sentença da Comarca de Seara, que o condenou à pena de 3 anos e 3 meses de reclusão, mais multa, por ter denunciado policiais civis como responsáveis por tortura que sofrera quando preso, mesmo sendo eles inocentes. Segundo os autos, o réu teria falsamente denunciado os policiais civis, alegando que em 30 de outubro de 2003, quando retornava para sua casa, foi preso por dois policiais civis, posteriormente, identificados como sendo Gilmar Bonatto e Jair Frido Groth, que se aproximaram armados e o agrediram. Afirmou que, após o interrogarem a respeito de seu envolvimento na morte de um taxista, o conduziram à delegacia de Polícia de Itá, onde teria sido torturado e mantido algemado até o dia seguinte, quando transferido para a delegacia de Seara. Alegou, ainda, que, durante os dez dias em que ficou detido, fora mantido sujo e de roupas íntimas, recebendo pão e água para comer. Tais declarações deram causa à instauração de investigação policial, onde se apurou que os fatos eram inverídicos, sendo o inquérito policial arquivado. Por ter dado causa aos trabalhos de investigação contra policiais civis, imputando-lhes falsamente a autoria de um crime, foi processado por denunciação caluniosa. Inconformado, apelou ao Tribunal, objetivando sua absolvição, por total ausência de provas. Segundo a relatora da apelação, desembargadora Marli Mosimann Vargas, o depoimento do médico que estava de plantão diz nitidamente que o apelante não possuía marcas de tortura. "Ele afirmara que recebera choques, queimaduras, mas nada foi encontrado que confirmasse a violência. Além disso, uma testemunha (...) servente da delegacia, há 17 anos, esclareceu que a cela é provida de uma cama e banheiro, normal como qualquer delegacia e que foi fornecida roupa e cama, inclusive coberta e travesseiro, além de comida, nos horários de rotina e que Jaimir ainda fazia ginástica ao sol", disse a magistrada. A votação unânime. (AC 2008.035311-8)

A língua é o chicote da bunda, parte 2

Essa é para descontrair ...

No dia 20 de julho de 1969, Neil Armstrong, comandante do módulo lunar Apolo 11, se converteu no primeiro ser humano que pisou na Lua. Suas primeiras palavras ao pisar no nosso satélite foram: "Este é um pequeno passo para o ser humano, mas um salto gigantesco para a humanidade". Estas palavras foram transmitidas para a Terra e ouvidas por milhares de pessoas. Justamente antes de voltar à nave, Armstrong fez um comentário enigmático. "Boa Sorte, Sr.Gorsky." Muita gente na NASA pensou que foi um comentário sobre algum astronauta soviético. No entanto, depois de checado, verificaram que não havia nenhum Gorsky no programa espacial russo ou americano. Através dos anos, muita gente perguntou-lhe sobre o significado daquela frase sobre Gorsky, e ele sempre respondia com um sorriso. Em 5 de julho de 1995, Armstrong se encontrava na Bahia de Tampa, respondendo perguntas depois de uma conferência, quando um repórter lembrou-lhe sobre a frase que ele havia pronunciado 26 anos atrás. Desta vez, finalmente Armstrong aceitou responder. O Sr.Gorsky havia morrido e agora Armstrong sentia que podia esclarecer a dúvida. É o seguinte: Em 1938, sendo ainda criança em uma pequena cidade do meio oeste americano, Neil estava jogando baseball com um amigo no pátio da sua casa. A bola voou longe e foi parar no jardim ao lado, perto de uma janela da casa vizinha. Seus vizinhos eram a senhora e o senhor Gorsky. Quando Neil agachou-se para pegar a bola, escutou que a senhora Gorsky gritava para o senhor Gorsky: "Sexo anal? Você quer sexo anal? Sabe quando você terá sexo anal? Só no dia que o filho da vizinha caminhar na lua!".
E será que ela cumpriu a promessa?

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Direitos Humanos e Direito Penal

No início de outubro haverá outro encontro dos doutorandos aqui em Milão. O tema proposto pelo coordenador do curso, Professor Doutor Francesco Viganò, é uma análise do direito penal substantivo italiano diante dos julgados da Corte Européia de Direitos Humanos. Há excelentes trabalhos sobre o assunto. No final indico a principal referência da “velha bota”.

Quanto ao tema destacado, posso dizer que a Corte Interamericana de Direitos Humanos com sede na Costa Rica equivale à Corte Européia de Direitos Humanos com sede em Strasburgo. Ambas representam a Instância Máxima de Tutela Jurisdicional dos direitos fundamentais dos indivíduos dos países signatários das respectivas Convenções de Direitos Humanos. E dentro deste contexto um dos assuntos que será trabalhado é a tutela do indivíduo contra atos de tortura (tratamento desumano e degradante).

Posso dizer que aqui no curso sou o Embaixador do Brasil. Aliás, sou o único estrangeiro, mas isso não é nenhuma conquista. Penso que a contribuição dos colegas italianos é fabulosa, contudo o estudo comparado (quanto maior a sua abrangência) revela-se um diferencial no crescimento intelectual e jurídico de um professor. O interessante que nos corredores da Universidade sempre escuto a pergunta: e como é no Brasil? E penso que não será diverso no meu primeiro encontro oficial no doutorado. A resposta está articulada. Vou apresentar a responsabilidade do Brasil no caso Damião Ximenes Lopes, torturado numa casa de repouso no Estado do Ceará, como a primeira condenação do Estado pela Corte Interamericana.

Soube deste fato numa leitura do blog do Alexandre Morais da Rosa. E depois consultando outros blogs me inteirei do assunto. Não há como não ficar emocionado com o depoimento da irmã da vítima. Não há como não ficar indignado com o controle social pautado na hipocrisia que é o tratamento psiquiátrico (punitivo, sem discurso punitivo). Não há como dissociar o bônus de estar fazendo um curso de doutroado no estrangeiro com o ônus de apresentar esse triste fato da realidade tupiniquim. Tudo faz parte.

Mês que vem posto como se concretizou o encontro. Agora destaco alguns locais nos quais os eventuais interessados podem conhecer um pouco mais do fato e da Corte Interamericana dos Direitos Humanos.
http://www.global.org.br/portuguese/damiaoximenes.html
http://institutodamiaoximenes.blogspot.com/

Referências biliográficas:
Nicosia, Emanuele. Convenzione Europea Dei Diritto Dell’Uomo e Diritto Penale. Giappichelli Editore, Torino, 2006.

Também recomendo a qualquer estudante e professor de direito penal, sobre o tema controle social e sistema penal as seguintes leituras:
Zaffaroni, Eugenio Raúl; Pierangeli, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro. São Paulo: RT, 1997; Santos, Juarez Cirino. Direito Penal. Curitiba: ICPC, 2006; Batista, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 2007.



quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Sonegação fiscal

Rodrigo Takayassu foi meu aluno na UFSC. Juntos publicaremos artigo sobre sonegação fiscal na próxima Revista IOB Síntese de Penal e Processo Penal. Até a edição em outubro vale a leitura da necessidade de sancionar penalmente a conduta de sonegação fiscal.
A imposição fiscal é revestida de rejeição social, nas palavras de Ives Gandra Martins, pois são comportamentos que naturalmente os cidadãos tendem a evitar ou a se afastar, mormente porque, no caso, trata-se de verdadeira constrição ao seu patrimônio. No entanto, como a tutela penal da arrecadação tributária é imprescindível, uma vez a necessidade do Estado em angariar fundos, houve por primordial a tipificação de ações de sonegação, pois “sem norma sancionatória, ninguém cumpriria suas obrigações fiscais – ou muito poucos o fariam – ao contrário do que se vê nas normas de aceitação social, em que a norma sancionatória é apenas aplicável aos casos patológicos, como ocorre em relação ao direito à vida” (MARTINS, 2002, p. 23). À oportunidade, recorda-se de Alberto Nogueira, para quem a reconstrução dos Direitos Humanos na tributação passeia, necessariamente, pela idéia de tributo mais racional e equânime, sendo que todos, dentro de suas possibilidades, devem contribuir, sendo que nesse sistema ideal “não há lugares para sonegadores de impostos”. Infere-se textualmente de sua doutrina: “a sonegação tem duplo e sinistro efeito: favorece seu autor e penaliza o contribuinte cumpridor de seus deveres fiscais, pois é este que afinal acabará assumindo, com a inevitável elevação do tributo, o ônus não atendido por aquele. Além desse duplo efeito, sofrerá, difusamente, com a degradação dos serviços públicos que dependem para seu regular e satisfatório funcionamento em grande parte da receita tributária” (NOGUEIRA, 1997, p. 411). Por isso, como ensina Luciano Amaro, cumpriu ao legislador criar mecanismos, de caráter penal, para buscar a ordem no campo tributário (AMARO, 2003, p. 447-51). Tanto é assim que o Código Penal, promulgado em dezembro de 1940, já previu alguns tipos penais, como, por exemplo, o descaminho e o contrabando (art. 334), tradicionais figuras delituosas que reprimem a evasão de tributos, embora também concentrem sua força coercitiva na importação ou exportação de mercadoria proibida, buscando, desse jeito, a impermeabilidade de nosso ordenamento a ameaças externas, mesmo que sejam em forma de bens indesejáveis. Anota-se, ainda, o crime de falsificação de estampilha (art. 293, I), que, de certa feita, visa também o não desvio da incidência tributária, tendo em vista a função desse instrumento na arrecadação de imposto ou taxa. Na seqüência, o legislador nacional especificou o recolhimento de contribuições previdenciárias arrecadadas dos segurados como forma especial de apropriação indébita na Lei n. 3.807/60 (art. 86), e, depois, seguiu mesmo procedimento com o imposto de renda, empréstimos compulsórios e para o extinto imposto de selo, quando descontados de terceiros, conforme a Lei n. 4.357/64. Todavia, foi a Lei n. 4.729/65 que realmente configurou o que se chamou de crimes de sonegação fiscal, sendo uma série de tipos penais propriamente tributários. Em seguida, o Decreto-Lei n. 1.060/69 previu prisão administrativa (requerida pelo Ministro da Fazenda à Justiça Federal) como punição ao enriquecimento ilícito oriundo da não-declaração de bens (pois o imposto relativo a essa operação pertenceria ao Estado). Finalmente, marco no combate à sonegação fiscal, a Lei n. 8.137/90, atualmente vigente, “[...] deu disciplina penal mais ampla à matéria, alargando-se a lista de fatos típicos que passaram a configurar aquilo que ela designou genericamente como ‘crimes contra a ordem tributária’” (AMARO, 2003, p. 450).