Recomeçaram as aulas. E também o estudo da parte especial do direito penal para alguns alunos. Aula sobre o crime de homicídio. Dúvida de aluno encaminhada por email: os irmãos siameses ou xifópagos podem ser autores do delito? Por certo é um aluno "verde" em direito penal. Um mero curioso. Mas a questão ganha importância quando alguns "maduros" examinadores de concursos insistem em cobrar esse conhecimento inútil. Vou até arriscar: é possível que a página de algum manual estivesse marcada nos comentários relativos ao sujeito ativo do crime do art. 121 do CP nos dias que antecederam o concurso e, assim, achou por bem eliminar alguns infelizes.
Euclides Custódio da Silveira afirmava que “a deformidade física não excluía o reconhecimento da imputabilidade penal e, assim, ambos poderiam responder como autores, apenas sendo possível a impunidade do autor do disparo quando, mesmo não havendo acordo de vontades entre os irmãos para a realização da ação criminosa, a separação cirúrgica fosse impraticável por algum motivo” [1]. O motivo pode ser a recusa do inocente com o intuito de preservar sua vida tendo em vista os riscos da intervenção cirúrgica. Mas Barros Monteiro tira um coelho da cartola para resolver essa situação. O ilustre magistrado, num passe de mágica, menciona que se deve aguardar que o gêmeo inocente venha cometer um delito e por ele seja condenado, porque assim ambos poderão cumprir a pena juntos [2].
Como é necessário treinar o italiano: Mamma mia! Lenio Streck já havia escrito sobre a crise da dogmática jurídica com a qual os manuais acadêmicos colaboram e muito. E a presente solução só contribui para o aumento desta estatística. Além de fugir completamente da realidade é uma completa alienação. O que será que o togado pensou? Que é sempre bonita ver uma família reunida? Enfim, a partir de agora devemos redobrar nossa atenção com esses gêmeos.
Examinadores: chega de pensar na velocidade de uma tartaruga. Há questões muito relevantes, e atuais, quando o assunto é o crime de homicídio. Sugerimos: a disponibilidade do bem jurídico, nexo de imputação objetiva, concursos aparentes de normas, etc.
[1] SILVEIRA, Euclides Custódio. Direito Penal. São Paulo: RT, 1973, p. 25.
[2] BARROS, Flávio Augusto Monteiro. Direito Penal. Parte Especial. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 13.
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