quarta-feira, 30 de março de 2011

Informativo STJ

APN. ARQUIVAMENTO. COISA JULGADA MATERIAL.

Cuida-se de habeas corpus em que se discute, em síntese, se a decisão que determina o arquivamento da ação penal (APn) no âmbito da Justiça comum, reconhecendo a atipicidade do fato e a incidência de cláusula excludente da ilicitude, impede a instauração da APn pelo mesmo fato perante a Justiça especializada, no caso a Justiça Militar. A Turma concedeu a ordem ao entendimento de que a decisão de arquivamento do inquérito policial no âmbito da Justiça comum, acolhendo promoção ministerial no sentido da atipicidade do fato e da incidência de causa excludente de ilicitude, impossibilita a instauração de ação penal na Justiça especializada, uma vez que o Estado-Juiz já se manifestou sobre o fato, dando-o por atípico, o que enseja coisa julgada material. Registrou-se que, mesmo tratando-se de decisão proferida por juízo absolutamente incompetente, deve-se reconhecer a prevalência dos princípios do favor rei, favor libertatis e ne bis in idem, de modo a preservar a segurança jurídica que o ordenamento jurídico demanda. Precedentes citados do STF: HC 86.606-MS, DJ 3/8/2007; do STM: CP-FO 2007.01.001965-3-DF, DJ 11/1/2008; do STJ: APn 560-RJ, DJe 29/10/2009; HC 90.472-RS, DJe 3/11/2009; RHC 17.389-SE, DJe 7/4/2008; HC 36.091-RJ, DJ 14/3/2005, e HC 18.078-RJ, DJ 24/6/2002. HC 173.397-RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 17/3/2011.

Tornozeleiras eletrônicas

O uso de tornozeleiras eletrônicas em presos do estado de São Paulo vem sendo barrado por decisões judiciais. A utilização do equipamento de monitoramento foi aprovada no ano passado pela lei n. 12.258/2010 e, desde então, a intenção da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) era utilizar esse dispositivo para controlar os detentos do regime semiaberto, que todos os dias saem das unidades prisionais para trabalhar, voltando à noite.

Os gastos do Estado com os aparelhos giram em torno de R$ 50 milhões, com a contratação de 4,5 mil aparelhos pelo período de 30 meses. No entanto, foram concedidas apenas 1.180 autorizações de rastreamento, uma vez que há ainda certa resistência de alguns juízes, os quais entendem que a lei permite o uso dos mecanismos eletrônicos de supervisionamento em duas situações: em caso de prisão domiciliar ou durante as oportunidades de saída temporária. Segue este entendimento a juíza Fernanda Menna Pinto Peres, da 2ª Vara de Itanhaém, que tem indeferido o uso do equipamento.

São a favor do monitoramento eletrônico os juízes especializados da capital, responsáveis pela região oeste do estado. A primeira autorização para uso da tornozeleira foi concedida pelo juiz Ulysses de Oliveira Gonçalves Junior, da 1ª Vara de Execuções Criminais. As decisões conflitantes devem conduzir o caso para apreciação dos tribunais superiores. Mesmo na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) ainda não há um posicionamento consolidado.

Fonte: Instituto Brasileiro de Ciências Criminais

Crimes sexuais

A juíza da 10ª Vara Criminal da comarca de Goiânia, Placidina Pires, considerou de grande importância, em processo criminal que apura crime contra a Dignidade Sexual, os exames psicológicos realizados pela Junta Médica Oficial do TJGO para comprovação de abuso sexual praticado contra vítima de apenas três anos de idade. Com base na palavra da vítima e nos testes psicológicos realizados, a magistrada julgou procedente acusação formulada pelo Ministério Público e condenou pai que abusou sexualmente da filha ao cumprimento de pena de 10 anos e seis meses de reclusão.

De acordo com a magistrada, os testes realizados com o pai apontaram que ele possui personalidade correspondente a de um agressor sexual. Em relação à criança, os exames constataram que ela apresenta indícios de ter sido sexualmente vitimizada. Para a juíza, os testes de HTP, TAT, Zulliger, de fábulas e Rorschach, em especial, são primordiais para fundamentação da decisão nesses casos.

Na sentença, Placidina destacou jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), cujo entendimento é de que, nos crimes sexuais, a palavra da vítima - especialmente quando corroborada por outros elementos de convicção, tem grande validade como prova, já que, na maior parte dos casos, estes delitos, por sua natureza, não contam com testemunhas e sequer deixam vestígios. (Os dados do processo não foram fornecidos pela fonte).

Fonte: Tribunal de Justiça de Goiás

Furto de dizimo

A 1ª Turma Criminal do TJDFT manteve sentença do juiz da 2ª Vara Criminal, que condenou um operário da Igreja Batista por furtar, em três ocasiões distintas, doações em dinheiro ofertadas pelos fiéis. O réu foi condenado em dois anos, quatro meses e vinte e quatro dias de reclusão no regime aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos, mais quinze dias-multa, conforme estabelece a legislação vigente.

Consta dos autos que nos dias 8/6/2006, 10/8/2006 e 12/8/2006, nas dependências da Igreja Batista Central de Brasília, situada na SGAS Quadra 603, o réu subtraiu cerca de R$ 400,00, consistentes em doações em dinheiro depositadas pelos fiéis. Para isso, ele confeccionou artefato, composto de um pedaço de arame envolto na ponta em fita adesiva dupla face, com o qual os envelopes das doações eram "pescados". O réu se apossava daqueles que continham dinheiro e devolvia os que traziam cheque.

Condenado em 1ª Instância, a defesa recorreu da sentença pleiteando a absolvição do réu, invocando o princípio da insignificância, por se tratar de quantia irrisória em relação ao patrimônio da igreja. Caso não deferido o pedido, que fosse afastada a qualificadora relativa à ação empreendida com destreza e reconhecido, como atenuante, o arrependimento posterior do operário.

Ao negar o recurso do réu, a Turma Criminal esclareceu que para o reconhecimento do princípio da insignificância não basta se aferir o valor do prejuízo frente ao patrimônio da vítima. Outros requisitos são necessários, como ofensividade mínima da conduta, ausência de periculosidade social e reduzido grau de reprovação do ato delitivo, bem como inexpressiva lesão jurídica.

No caso em questão, segundo os desembargadores, "não se pode afirmar que a ação não foi reprovável, eis que o réu agiu com destreza e se prevaleceu do fato de estar em seu local de trabalho e usufruir da confiança do pastor para retirar doações ofertadas por fiéis, frutos de suas parcas economias, frustrando um gesto abnegado de amor ao próximo e à igreja. Portanto, não há como acolher a aplicação do principio da insignificância", concluíram.

Quanto à qualificadora da destreza, os julgadores consideraram estar comprovado que o agente fabricou um instrumento que, embora rudimentar, possibilitava a retirada do dinheiro contido na urna. Em relação ao arrependimento, a Turma acrescentou, que este deveria ter se dado antes de o réu ter sido descoberto, e não depois.

Não cabe mais recurso no âmbito do TJDFT. Processo: 20070110359455

Fonte: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios

Assédio sexual

Condenado à pena de um ano e seis meses de detenção, por assédio sexual, professor da Universidade Federal de Roraima (UFRR) recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, alegando que as provas dos autos são insuficientes e que se encontram ausentes os requisitos do crime previsto no artigo 216-A do Código Penal.

De acordo com a sentença, o professor assediou uma aluna que precisava fazer exame especial, por ter recebido notas baixas na disciplina ministrada por ele.

Segundo a denúncia do Ministério Público Federal, o professor, conforme o MPF, disse que a aluna só conseguiria ter êxito na matéria se ela o convidasse para ir a um lugar no qual os dois pudessem ficar à vontade.

Em juízo, a aluna afirmou que após o episódio resolveu comunicar o fato ao coordenador do curso e passou a gravar as conversas do professor em seu celular. Após esses procedimentos ouviu comentários na universidade de que “a maioria das alunas do acusado tinham sofrido o mesmo assédio”.

O departamento da UFRR ao qual o professor estava vinculado instaurou comissão de sindicância para apurar a representação feita pela aluna.

O relator do processo no TRF/ 1.ª Região, desembargador federal Mário César Ribeiro, afirmou em seu voto que, após analisar o acervo de provas, verificou que “a materialidade e a autoria do crime (...) encontram-se efetivamente demonstradas pela sindicância realizada pela Universidade Federal de Roraima, pelas declarações das vítimas (...), pelo depoimento das testemunhas (...), todos colhidos em Juízo (...)”.

O desembargador salientou, ainda, que o relatório da procuradoria-geral da universidade, após a conclusão de sindicância, concluiu que “o denunciado (...) infringiu o inciso IX do art. 117 da Lei n.º 8112/90, que dispõe sobre a utilização do cargo para lograr proveito pessoal (...), em detrimento da dignidade da função pública, que comina pena de demissão, nos termos do inciso XII do art. 132 do mesmo diploma legal”.

A decisão unânime da Quarta Turma do Tribunal foi no sentido de que a sentença recorrida “não merece censura”.

Nº do Processo: 2004.42.00.001457-3/RR

Fonte: Tribunal Regional Federal da 1ª Região

Fraude em licitação

A ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal, é a relatora do Habeas Corpus (HC 107614) impetrado pela defesa de Adevilson Lourenço de Gouveia, ex-prefeito de São Sebastião da Amoreira (PR), e Robis Zilda Lourenço de Gouveia Vaghetti, sua irmã e ex-chefe do Setor de Compras do município. Os dois foram condenados em ação penal pública a três anos e seis meses de detenção por dispensarem procedimento de licitação para a compra de combustíveis para o município.

O HC pede que o Supremo declare a atipicidade dos fatos praticados ou, subsidiariamente, que a 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgue novamente agravo regimental interposto por Adevilson e Robis. Liminarmente, pede que seja sobrestado o trânsito em julgado do agravo, que levará ao início do cumprimento das penas.

A defesa questiona a tipicidade do delito (previsto no artigo 89 da Lei 8.666/93 - Lei das Licitações) com a alegação de que o caso só é punível quando produz resultado danoso. Afirma que “o dolo genérico não é suficiente para levar o administrador à condenação”, e que é “penalmente irrelevante a conduta formal de alguém que desatente às formalidades da licitação quando não há consequência patrimonial para o órgão público”.

Segundo a defesa, existiam na cidade apenas três postos de combustível e o ex-prefeito e a ex-chefe do Setor de Compras, “agindo com inequívoca boa-fé”, determinaram um rodízio entre os três. “Agride ao mais comezinho senso de justiça manter a condenação de agentes públicos quando a conduta de realizar rodízio entre os postos é inequívoca manifestação de que não houve intenção de frustrar fraudulentamente a licitação”, afirmam os advogados.

Processo relacionado: HC 107614

Fonte: Supremo Tribunal Federal

Concussão

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou seguimento (arquivou) ao Habeas Corpus (HC) 107598, em que os policiais civis A.C.C. e J.C.C.L. pediam o relaxamento da prisão ou, alternativamente, o direito de responder em liberdade à ação penal a que respondem na 28ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca de São Paulo pelo crime de concussão (artigo 316, Código Penal - CP).

Os dois policiais foram presos em flagrante no dia 2 de novembro do ano passado, sob acusação de terem exigido a quantia de R$ 20 mil para devolver bens apreendidos em estabelecimento comercial. Ao aceitar a denúncia, em 25 de outubro passado, o juízo paulistano de primeiro grau indeferiu os pedidos de relaxamento da prisão ou de concessão de liberdade provisória.

Alegações

A defesa alegava inexistência de flagrante, pois a natureza formal do crime de concussão e o intervalo entre a suposta exigência de vantagem indevida e a efetivação da prisão impediriam essa constatação. Além disso, segundo os advogados, a gravidade abstrata do delito, a conveniência da instrução criminal e a necessidade de se resguardar a futura aplicação da lei penal não são motivos hábeis a justificar o indeferimento do pedido de liberdade provisória.

O ministro Gilmar Mendes, entretanto, citou jurisprudência que levou a Suprema Corte a editar a Súmula 691, que veda a concessão de liminar em HC quando igual pedido tiver sido negado por relator de tribunal superior, em medida semelhante. Ele lembrou que, somente em casos excepcionais, o STF tem abrandado a aplicação da súmula. E tais casos consistem apenas na premente necessidade de concessão de liminar para evitar flagrante constrangimento ilegal e o fato de a negativa dessa medida por tribunal superior importar a caracterização ou a manutenção de situação que seja manifestamente contrária à jurisprudência do STF.

Entretanto, segundo o ministro, não é o caso destes autos, pois neles, “à primeira vista, não se caracteriza nenhuma dessas situações ensejadoras do afastamento da incidência da Súmula 691”. Ademais, conforme o ministro, mesmo que fosse superado esse óbice, o caso não comportaria a concessão de liminar.

“É que da leitura do decreto prisional há um dado para mim elementar, que é justamente o fato de os pacientes, policiais civis, atuarem conjuntamente com outros policiais, a fim de praticar crimes de extorsão”, observou o ministro. “A insegurança que a liberdade dos pacientes gera para a ordem pública para mim é elementar, pois o que se espera de agentes policiais é a atuação no intuito de combater práticas delituosas, e não atuação no sentido de fomentá-las”.

Processo relacionado: HC 107598

Fonte: Supremo Tribunal Federal

Cola etetrônica

Com a afirmação de que o Supremo Tribunal Federal (STF) já teria reconhecido que a chamada “cola eletrônica” não é crime nem pode ser equiparada a estelionato, a servidora pública aposentada J.E.M.L. - denunciada por supostamente se beneficiar deste tipo de fraude em concurso para o cargo de auditora fiscal da Receita Federal ajuizou Reclamação (RCL 11470) no Supremo Tribunal Federal (STF). Ela pretende ver anulada a ação penal que responde por estelionato, crime previsto no artigo 171, parágrafo 3º, do Código Penal.

O advogado da servidora diz que ajuizou habeas corpus no Tribunal Regional Federal da 3ª Região pedindo a suspensão liminar do processo, e no mérito seu trancamento definitivo, mas teve o pedido negado pelo relator do caso naquela instância. Mesmo tendo reconhecido a delimitação da conduta imputada a ela, o relator indeferiu o pleito da defesa. Essa decisão, revela o advogado, deixa claro que o desembargador partilha do entendimento de que cola eletrônica seria crime, “uma vez que aceita sua equiparação ao estelionato”.

Para a defesa, essa decisão afrontaria o entendimento assentado pelo STF no julgamento do Inquérito 1145. Ao tratar da matéria “cola eletrônica”, o Plenário da Corte teria sentenciado, na ocasião, que, por falta de previsão legal, este tipo de fraude não seria crime, não podendo ser equiparada ao estelionato ou falsidade ideológica, e por isso teria determinado o trancamento do inquérito em questão, por atipicidade da conduta descrita nos autos como cola eletrônica.

Com este argumento, a defesa pede que seja encerrada a ação penal contra a servidora aposentada. O caso está sob relatoria do ministro Dias Toffoli.

Fonte: Supremo Tribunal Federal

terça-feira, 29 de março de 2011

lançamento de nova edição


Martinho Neves Miranda está lançando a segunda edição do livro O Direito no Desporto. Embora não seja a área que diretamente trabalhe, o Direito Desportivo é um excelente campo para atuar no mercado profissional.

Quanto ao livro, a segunda edição encontra-se atualizada com as novas legislações portuguesa, argentina e francesa, revisada com novas referências jurisprudenciais e ampliada com muitos comentários sobre temas como o desporto enquanto patrimônio cultural brasileiro, o caráter subjetivo ou objetivo das punições por doping, dentre outros, acrescidos por mais fontes de bibliografia oriundas das publicações que se seguiram ao lançamento da primeira edição desta obra. Espero que agrade a indicação. O Martinho é profissional sério e respeitado. Recomendo porque vale a pena.


Violência doméstica

Nos crimes de violência doméstica, os quais, geralmente, ocorrem à distância de testemunhas, a palavra da vítima assume especial relevo, consistindo em prova suficiente para a condenação. Esse é o entendimento da 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça ao negar provimento a réu condenado por ter ameaçado matar uma mulher e por ter desobedecido a decisões judiciais que determinavam o seu afastamento da vítima.

Na comarca de Jaguarão o réu, já reincidente, foi condenado à pena de 7 meses e 15 dias de detenção em regime semiaberto. Da sentença, recorreu ao Tribunal de Justiça.

A defesa argumentou que inexistia prova segura e convincente para a condenação.

Para o Desembargador Gaspar Marques Batista, relator, conforme se depreende do que consta do processo, tanto em sede policial, como em juízo, a vítima, ex-companheira do acusado, afirmou que o réu bateu na janela da sua residência e proferiu-lhe ameaças de morte.

Observa ainda que a versão da vítima é corroborada pelo policial militar que atendeu a ocorrência, o qual afirmou que localizou o acusado a menos de vinte metros da casa da vítima, sendo que ele deveria manter-se afastado a, no mínimo, 100 metros da ex-companheira.

Salientou o Desembargador Gaspar que nos crimes de violência doméstica, os quais, geralmente ocorrem à distância de testemunhas, a palavra da vítima assume especial relevo, consistindo em prova suficiente para a condenação.

Os Desembargadores Constantino Lisbôa de Azevedo e Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, que presidiu o julgamento ocorrido nessa quinta-feira (24/3), acompanharam o voto do relator. Processo: (ACr) 70039664339

Fonte: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

Interrogatório é no final

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram aplicar nova regra do Código de Processo Penal (CPP), modificada pela Lei 11.719/08, que alterou o momento de realização do interrogatório dos acusados para o fim da fase de instrução criminal. Por unanimidade dos votos, eles negaram provimento a um recurso (agravo regimental) interposto pelo Ministério Público Federal (MPF) na Ação Penal (AP) 528.

O MPF pedia para que os interrogatórios dos dois acusados fossem ultimados antes da apresentação da defesa prévia, destacando que um dos réus teria perdido o direito de exercer o ato de autodefesa justamente por não ter comparecido a audiência previamente designada em Belém (PA), apesar de devidamente citado. Afirma que o outro sequer foi encontrado naquela localidade, apesar de diversas tentativas do oficial de Justiça.

No recurso, o MPF sustentava que os argumentos da norma especial - Lei 8.038/90, que mantém o sistema tradicional, prevalecem sobre a geral (CPP), que coloca o interrogatório do réu ao final da instrução.

A Ação Penal tem por objeto a condenação de dois acusados por suposto cometimento do crime de peculato, disposto no artigo 312, parágrafo 1º, do Código Penal. A denúncia foi recebida à unanimidade do Plenário do Supremo no dia 19 de novembro de 2009.

De acordo com o relator, ministro Ricardo Lewandowski, o Plenário do Supremo já iniciou a discussão se a mudança legislativa do CPP afeta a lei especial (Lei 8038/90), mas ainda não houve conclusão do debate. O Supremo sinalizou que o interrogatório é um instrumento de defesa do réu e, portanto, deve ser colocado ao final.

Assim, em vista da previsão da Lei 11719/08 que modificou o artigo 400 do CPP e transferiu o interrogatório para o final do processo, Lewandowski, no dia 20 de outubro de 2010, despachou na AP 528 no sentido de que os réus sejam interrogados ao final do processo, considerando a nova sistemática mais favorável à defesa. Isso porque, frisou, os interrogatórios até o momento não ocorreram tendo em vista o não comparecimento de um à audiência e uma vez que o outro não foi encontrado.

Voto

“Não se pode negar que se trata de um tema de altíssima relevância dado o reflexo que a referida inovação legal exerce sobre o direito constitucional, a ampla defesa, embora não tenha tido ainda o Supremo Tribunal Federal a oportunidade de posicionar-se definitivamente a respeito dele, nem mesmo em sede de questão de ordem”, avaliou o ministro Ricardo Lewandowski. Ele lembrou que o tema chegou a ser debatido pelos ministros na sessão plenária do dia 7 de outubro de 2010, em uma questão de ordem suscitada na AP 470, contudo, como naquela ação penal o interrogatório já havia sido realizado e a discussão prosseguiu.

Para o relator, a PGR não tem razão. “Parece-me relevante constatar que, se a nova redação do artigo 400, do CPP, possibilita ao réu exercer de modo mais eficaz a sua defesa, tal dispositivo legal deve suplantar o estatuído no artigo 7º, da Lei 8038, em homenagem aos princípios constitucionais que são aplicáveis à espécie”, afirmou.

Segundo Lewandowski, é mais benéfico à defesa possibilitar que o réu seja interrogado ao final da instrução, depois de ouvidas as testemunhas arroladas, bem como após a produção de outras provas como eventuais perícias. Nesse caso, conforme o relator, o acusado terá a oportunidade de esclarecer divergências “que não raramente afloram durante a edificação do conjunto probatório”.

Quanto à discussão sobre o aspecto formal, o ministro entendeu que o fato de a Lei 8038 ser norma especial em relação ao CPP (norma geral), “em nada influencia o que até aqui se assentou”. “É que, a meu sentir, a norma especial prevalece sobre a geral apenas nas hipóteses em que estiver presente alguma incompatibilidade manifesta insuperável entre elas, nos demais casos, considerando a sempre necessária aplicação sistemática do direito, cumpre cuidar para que essas normas aparentemente antagônicas convivam harmonicamente”, explicou Ricardo Lewandowski.

Dessa forma, o relator negou provimento ao agravo regimental interposto pelo MPF, entendendo que o interrogatório deve ocorrer no final do processo.

Processo relacionado: AP 528

Fonte: Supremo Tribunal Federal

Lei Maria da Penha

Por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, nesta quinta-feira (24), a constitucionalidade do artigo 41 da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), que afastou a aplicação do artigo 89 da Lei nº 9.099/95 quanto aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, tornando impossível a aplicação dos institutos despenalizadores nela previstos, como a suspensão condicional do processo. A decisão foi tomada no julgamento do Habeas Corpus (HC) 106212, em que Cedenir Balbe Bertolini, condenado pela Justiça de Mato Grosso do Sul à pena restritiva de liberdade de 15 dias, convertida em pena alternativa de prestação de serviços à comunidade, contestava essa condenação. Cedenir foi punido com base no artigo 21 da Lei 3.688 (Lei das Contravenções Penais), acusado de ter desferido tapas e empurrões em sua companheira. Antes do STF, a defesa havia apelado, sucessivamente, sem sucesso, ao Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul (TJ-MS) e ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). No HC, que questionava a última dessas decisões (do STJ), a Defensoria Pública da União (DPU), que atuou em favor de Cedenir no julgamento desta tarde, alegou que o artigo 41 da Lei Maria da Penha seria inconstitucional, pois ofenderia o artigo 89 da Lei 9.099/95. Esse dispositivo permite ao Ministério Público pedir a suspensão do processo, por dois a quatro anos, nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime. A DPU alegou, também, incompetência do juízo que condenou Cedenir, pois, em se tratando de infração de menor poder ofensivo, a competência para seu julgamento caberia a um juizado criminal especial, conforme previsto no artigo 98 da Constituição Federal (CF), e não a juizado especial da mulher. Decisão Todos os ministros presentes à sessão de hoje do Plenário - à qual esteve presente, também, a titular da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres, Iriny Lopes - acompanharam o voto do relator, ministro Marco Aurélio, pela denegação do HC. Segundo o ministro Marco Aurélio, a constitucionalidade do artigo 41 dá concretude, entre outros, ao artigo 226, parágrafo 8º, da Constituição Federal (CF), que dispõe que “o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”. O ministro disse que o dispositivo se coaduna com o que propunha Ruy Barbosa, segundo o qual a regra de igualdade é tratar desigualmente os desiguais. Isto porque a mulher, ao sofrer violência no lar, encontra-se em situação desigual perante o homem. Ele descartou, também, o argumento de que o juízo competente para julgar Cedenir seria um juizado criminal especial, em virtude da baixa ofensividade do delito. Os ministros apontaram que a violência contra a mulher é grave, pois não se limita apenas ao aspecto físico, mas também ao seu estado psíquico e emocional, que ficam gravemente abalados quando ela é vítima de violência, com consequências muitas vezes indeléveis. Votos Ao acompanhar o voto do relator, o ministro Luiz Fux disse que os juizados especiais da mulher têm maior agilidade nos julgamentos e permitem aprofundar as investigações dos agressores domésticos, valendo-se, inclusive, da oitiva de testemunhas. Por seu turno, o ministro Dias Toffoli lembrou da desigualdade histórica que a mulher vem sofrendo em relação ao homem. Tanto que, até 1830, o direito penal brasileiro chegava a permitir ao marido matar a mulher, quando a encontrasse em flagrante adultério. Entretanto, conforme lembrou, o direito brasileiro vem evoluindo e encontrou seu ápice na Constituição de 1988, que assegurou em seu texto a igualdade entre homem e mulher. Entretanto, segundo ele, é preciso que haja ações afirmativas para que a lei formal se transforme em lei material. Por isso, ele defendeu a inserção diária, nos meios de comunicação, de mensagens afirmativas contra a violência da mulher e de fortalecimento da família. No mesmo sentido votou também a ministra Cármen Lúcia, lembrando que a violência que a mulher sofre em casa afeta sua psique (autoestima) e sua dignidade. “Direito não combate preconceito, mas sua manifestação”, disse ela. “Mesmo contra nós há preconceito”, observou ela, referindo-se, além dela, à ministra Ellen Gracie e à vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat. E esse preconceito, segundo ela, se manifesta, por exemplo, quando um carro dirigido por um homem emparelha com o carro oficial em que elas se encontrem, quando um espantado olhar descobre que a passageira do carro oficial é mulher. “A vergonha e o medo são a maior afronta aos princípios da dignidade humana, porque nós temos que nos reconstruir cotidianamente em face disto”, concluiu ela. Também com o relator votaram os ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Ayres Britto, Gilmar Mendes, Ellen Gracie e o presidente da Corte, ministro Cezar Peluso. Todos eles endossaram o princípio do tratamento desigual às mulheres, em face de sua histórica desigualdade perante os homens dentro do lar. O ministro Ricardo Lewandowski disse que o legislador, ao votar o artigo 41 da Lei Maria da Penha, disse claramente que o crime de violência doméstica contra a mulher é de maior poder ofensivo. Por seu turno, o ministro Joaquim Barbosa concordou com o argumento de que a Lei Maria da Penha buscou proteger e fomentar o desenvolvimento do núcleo familiar sem violência, sem submissão da mulher, contribuindo para restituir sua liberdade, assim acabando com o poder patriarcal do homem em casa. O ministro Ayres Britto definiu como “constitucionalismo fraterno” a filosofia de remoção de preconceitos contida na Constituição Federal de 1988, citando os artigos 3º e 5º da CF. E o ministro Gilmar Mendes, ao também votar com o relator, considerou “legítimo este experimento institucional”, representado pela Lei Maria da Penha. Segundo ele, a violência doméstica contra a mulher “decorre de deplorável situação de domínio”, provocada, geralmente, pela dependência econômica da mulher. A ministra Ellen Gracie lembrou que a Lei Maria da Penha foi editada quando ela presidia o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ensejou um impulso ao estabelecimento de juizados especiais da mulher. Em seu voto, o ministro Cezar Peluso disse que o artigo 98 da Constituição, ao definir a competência dos juizados especiais, não definiu o que sejam infrações penais com menor poder ofensivo. Portanto, segundo ele, lei infraconstitucional está autorizada a definir o que seja tal infração. Processo relacionado: HC 106212 Fonte: Supremo Tribunal Federal

segunda-feira, 28 de março de 2011

Muñoz Conde

Tive a alegria de conhecer pessoalmente o Professor Catedrático de Direito Penal da Universidad Pablo Olavide (Sevilla), Francisco Muñoz Conde, no seminário que me referi no post anterior. Sua palestra teve como tema "As reformas penais na Espanha". Segundo ele, a última reforma do Código Penal situa-se entre a tolerância zero e o direito penal do inimigo. Curiosamente chamou atenção, igualmente, para algo que venho afirmando algum tempo por aqui, ou seja, a ausência de relação ou (quando existe) a má relação entre o Poder Legislativo e o Poder Judiciário.

Além de um grande jurista, mostrou sua sensibilidade de pessoa, sendo atencioso não somente comigo, mas com qualquer aluno que dele se aproximava. Um daqueles "avôs" que tem ótimas histórias para se escutar. Não pensava tratar-se de pessoa tão humilde. Talvez por isso ele seja reverenciado em toda a Espanha. Um baita exemplo a seguir.

Congresso de Salamanca


Na semana passada estive em Salamanca participando do 23° Congresso Universitário de Alunos de Direito Penal. Tive a companhia de alguns alunos de graduação da Universidade de Castilla-La Mancha, campus Albacete. A ocasião foi ótima para verificar a opinião de vários professores sobre as reformas verificadas no Código Penal Espanhol em vigor desde dezembro de 2010.


O primeiro bloco de palestras se referiu ao tema da responsabilidade penal dos entes coletivos. Luigi Foffani, Catedrático de Direito Penal na Universidade de Modena, Itália, traçou um paralelo entre a legislação de seu país e a reforma espanhola. A principal diferença é que na "Velha bota" as sanções têm natureza administrativa, ao passo que na legislação ibérica elas têm cunho penal. Uma semelhança é que em ambas não é possível a punição de pessoas jurídicas de direito público ou que prestam serviços de importância constitucional (como, por exemplo, os partidos políticos). O ilustre professor também discorreu sobre o conceito de culpabilidade das pessoas jurídicas no sentido de se tratar de um "defeito de organização" (Klaus Tiedmann). Na seqüência palestrou o professor da Universidade de Valladolid, Manuel Gómez Tomillo, mencionando a necessidade de um nexo de atuação, ou seja, a pessoa física que pratica o delito deve integrar a pessoa jurídica. Também discorreu criticamente sobre o "defeito de organização" enfatizando que não há de se falar em déficit de organização, por exemplo, em situações em que torcedores arremessam para dentro do campo rádios, garrafas plásticas ou outros, porquanto é impossível que os sistemas que fazem a segurança possam detectar tais infrações. Depois, Ivan Meini, Professor Ordinário de Direito Penal na Universidade Católica do Peru, em linhas gerais, destacou o fator empresa como gerador de riscos na atual sociedade (Ulrich Beck). Destacou que o defeito de organização deverá ser considerado pela falta de vigilância ou controle por parte da pessoa jurídica em relação a seus funcionários. Ainda questionou sobre a responsabilização da pessoa jurídica no caso de holding de empresas, isto é, seria possivel extender a todo grupo de empresa o defeito de organização que se verifica em uma das empresas àquele grupo pertencente? Respondeu que isso não é correto, pois uma responsabilidade indireta representaria consagrar a responsabilidade objetiva, vetada em Direito Penal.


O congresso seguiu com palestras relacionadas aos novos delitos de mobbing, pirataria e tráfico de órgãos humanos com a presença dos Professores Catedráticos Ramón García Albero (Lleida), Carmen Gómez Rivero (Sevilla) e da Professora Ana Pérez Machío (Universidad del País Vasco). Especificamente sobre o tráfico de órgãos, declinou o professor Ramón que se trata de problema transnacional e em que qualquer hospital na Espanha se pode realizar facilmente. Destacou quais os bens jurídicos que merecem a proteção penal, pelo que recorreu a bens individuais (tutela da saúde do doador, da vida do receptor e da dignidade de ambos) e aqueles que se podem chamar supraindividuais (altruísmo, solidariedade, etc.).

Temas como o sistema de sanções penais, a liberdade vigiada, as alternativas a pena privativa de liberdade foram debatidos por Eduardo Demetrio Crespo (Catedrático na Universidade Castilla-La Mancha), José María Sumalla (Catedrático na Universidade de Lleida), Julian Carlos Martín (Professor da Universidade de Comillas em Madrid) e Manuel Morán Gonzáles (Magistrado de Salamanca). O tema é interessante porque a Espanha é considerada na União Européia como o país com o maior número de detentos, sem embargo não seja aquele em que se verifique o maior número de delitos. Isso significa, portanto, que as penas cominadas aos delitos são muito altas.

Entre os demais módulos, destaco aquele relativo à criminalidade desportiva. Trata-se de tema que é muito discutido na Espanha em razão do legislador prever, textualmente, a punição penal pelo doping desportivo, pelas fraudes desportivas, entre outros. Rosario de Vicente, Catedrática de Direito Penal na Universidade Castilla-La Mancha abriu os trabalhos frisnado a não incidência do direito penal nesse setor, reivindicando a consagração da ultima ratio. Na sequencia falaram os professores da Universidade de Extramadura (Emilio Cortés) e Alicante (Antonio Doval) pelo que igualmente enfatizaram a intervenção mínima do direito penal na seara desportiva.

O discurso de encerramento foi proferido pelo ilustre Francisco Muñoz Conde.


sábado, 26 de março de 2011

Lei da Ficha Limpa

Segue como se pronunciou o STF no julgamento sobre a lei da ficha limpa. No livro em conjunto com a Mariana (Direito Penal Eleitoral) defendíamos a aplicação imediata.

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Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a Lei Complementar (LC) 135/2010, a chamada Lei da Ficha Limpa, não deve ser aplicada às eleições realizadas em 2010, por desrespeito ao artigo 16 da Constituição Federal, dispositivo que trata da anterioridade da lei eleitoral. Com essa decisão, os ministros estão autorizados a decidir individualmente casos sob sua relatoria, aplicando o artigo 16 da Constituição Federal.

A decisão aconteceu no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 633703, que discutiu a constitucionalidade da Lei Complementar 135/2010 e sua aplicação nas eleições de 2010. Por seis votos a cinco, os ministros deram provimento ao recurso de Leonídio Correa Bouças, candidato a deputado estadual em Minas Gerais que teve seu registro negado com base nessa lei.

Relator

O ministro Gilmar Mendes votou pela não aplicação da lei às eleições gerais do ano passado, por entender que o artigo 16 da Constituição Federal (CF) de 1988, que estabelece a anterioridade de um ano para lei que altere o processo eleitoral, é uma cláusula pétrea eleitoral que não pode ser mudada, nem mesmo por lei complementar ou emenda constitucional.

Acompanhando o relator, o ministro Luiz Fux ponderou que “por melhor que seja o direito, ele não pode se sobrepor à Constituição”. Ele votou no sentido da não aplicabilidade da Lei Complementar nº 135/2010 às eleições de 2010, com base no princípio da anterioridade da legislação eleitoral.

O ministro Dias Toffoli acompanhou o voto do relator pela não aplicação da Lei da Ficha Limpa nas Eleições 2010. Ele reiterou os mesmo argumentos apresentados anteriormente quando do julgamento de outros recursos sobre a mesma matéria. Para ele, o processo eleitoral teve início um ano antes do pleito.

Em seu voto, o ministro Marco Aurélio também manteve seu entendimento anteriormente declarado, no sentido de que a lei não vale para as eleições de 2010. Segundo o ministro, o Supremo não tem culpa de o Congresso só ter editado a lei no ano das eleições, “olvidando” o disposto no artigo 16 da Constituição Federal, concluiu o ministro, votando pelo provimento do recurso.

Quinto ministro a se manifestar pela inaplicabilidade da norma nas eleições de 2010, o decano da Corte, ministro Celso de Mello, disse em seu voto que qualquer lei que introduza inovações na área eleitoral, como fez a Lei Complementar 135/2010, interfere de modo direto no processo eleitoral – na medida em que viabiliza a inclusão ou exclusão de candidatos na disputa de mandatos eletivos – o que faz incidir sobre a norma o disposto no artigo 16 da Constituição. Com este argumento, entre outros, o ministro acompanhou o relator, pelo provimento do recurso.

Último a votar, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, reafirmou seu entendimento manifestado nos julgamentos anteriores sobre o tema, contrário à aplicação da Lei Complementar nº 135/2010 às eleições do ano passado. “Minha posição é bastante conhecida”, lembrou.

Peluso ressaltou o anseio comum da sociedade pela probidade e pela moralização, “do qual o STF não pode deixar de participar”. Para o presidente, “somente má-fé ou propósitos menos nobres podem imputar aos ministros ou à decisão do Supremo a ideia de que não estejam a favor da moralização dos costumes políticos”. Observou, porém, que esse progresso ético da vida pública tem de ser feito, num Estado Democrático de Direito, a com observância estrita da Constituição. “Um tribunal constitucional que, para atender anseios legítimos do povo, o faça ao arrepio da Constituição é um tribunal em que o povo não pode ter confiança”, afirmou.

O ministro aplicou ao caso o artigo 16, “exaustivamente tratado”, e o princípio da irretroatividade “de uma norma que implica uma sanção grave, que é a exclusão da vida pública”. A medida, para Peluso, não foi adotada “sequer nas ditaduras”.

Divergência

Abrindo a divergência, a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha votou pela aplicação da Lei Complementar nº135/10 já às eleições de 2010, negando, assim, provimento ao Recurso Extraordinário 633703, interposto por Leonídio Bouças, que teve indeferido o registro de sua candidatura para deputado estadual pelo PMDB de Minas Gerais, com fundamento na LC 135.

A ministra disse que, ao contrário da manifestação do relator, ministro Gilmar Mendes, não entende que a LC tenha criado desigualdade entre os candidatos, pois todos foram para as convenções, em junho do ano passado, já conhecendo as regras estabelecidas na LC 135.

Quanto a seu voto proferido na Medida Cautelar na ADI 4307, ela lembrou que, naquele caso, de aplicação da Emenda Constitucional nº 58/2009 retroativamente às eleições de 2008, votou contra, pois se tratou de caso diferente do da LC 135, esta editada antes das convenções e do registro de candidatos.

Ao votar, o ministro Ricardo Lewandowski, que também exerce o cargo de presidente do TSE, manteve entendimento no sentido de negar provimento ao RE, ou seja, considerou que a Lei da Ficha Limpa deve ser aplicável às Eleições 2010. Segundo ele, a norma tem o objetivo de proteger a probidade administrativa e visa a legitimidade das eleições, tendo criado novas causas de inelegibilidade mediante critérios objetivos.

Também ressaltou que a lei foi editada antes do registro dos candidatos, “momento crucial em que tudo ainda pode ser mudado”, por isso entendeu que não houve alteração ao processo eleitoral, inexistindo o rompimento da igualdade entre os candidatos. Portanto, Lewandowski considerou que a disciplina legal colocou todos os candidatos e partidos nas mesmas condições.

Em seu voto, a ministra Ellen Gracie manteve seu entendimento no sentido de que a norma não ofendeu o artigo 16 da Constituição. Para ela, inelegibilidade não é nem ato nem fato do processo eleitoral, mesmo em seu sentido mais amplo. Assim, o sistema de inelegibilidade – tema de que trata a Lei da Ficha Limpa – estaria isenta da proibição constante do artigo 16 da Constituição.

Os ministros Joaquim Barbosa e Ayres Britto desproveram o recurso e votaram pela aplicação imediata da Lei da Ficha Limpa. O primeiro deles disse que, desde a II Guerra Mundial, muitas Cortes Supremas fizeram opções por mudanças e que, no cotejo entre o parágrafo 9º do artigo 14 da Constituição Federal (CF), que inclui problemas na vida pregressa dos candidatos entre as hipóteses da inelegibilidade, e o artigo 16 da CF, que estabelece o princípio da anterioridade, fica com a primeira opção.

Em sentido semelhante, o ministro Ayres Britto ponderou que a Lei Complementar nº 135/2010 é constitucional e decorre da previsão do parágrafo 9º do artigo 14 da CF. Segundo ele, faz parte dos direitos e garantias individuais do cidadão ter representantes limpos. “Quem não tiver vida pregressa limpa, não pode ter a ousadia de pedir registro de sua candidatura”, afirmou.

Repercussão geral

O STF reconheceu, por unanimidade, a repercussão geral da questão, e autorizou que os ministros apliquem, monocraticamente, o entendimento adotado no julgamento de hoje aos demais casos semelhantes, com base no artigo 543 do Código de Processo Civil.

Fonte: publicações on line

Anuario de Derecho Deportivo


Em breve será lançado o segundo volume do Anuário de Derecho Deportivo. Eu e o amigo Rafael Teixeira Ramos somos os brasileiros com artigos selecionados para essa edição. No âmbito penal, além da minha contribuição, destaco os artigos sobre doping de Rosario de Vicente Martínez e de Sergio Castanheira. Segue:

DOCTRINA

La constitucionalización del deporte, por Leonardo Schmitt de Bem

El delito de dopaje deportivo: la inoportuna intervención punitiva en materia de Derecho deportivo, por Rosario de Vicente Martínez.

O novo regime jurídico portugués da luta contra a dopagem no desporto. A aproximação ao Código da Agência Mundial Antidopagem, por Sérgio Castanheira.

Na mesma obra ainda há um pequeno resumo da obra que coordenei com o Rafael em homenagem ao eterno Marcílio Krieger.

Revista Systemas

O Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos de Mato Grosso do Sul (CEPEJUS) lança, hoje, o novo número (3) da “Systemas – Revista de Ciências Jurídicas e Econômicas”, disponível, gratuitamente, no seguinte endereço eletrônico: www.revistasystemas.com.br.

De acordo com o atual presidente do CEPEJUS e editor-chefe dessa revista eletrônica, Marco Aurélio Borges de Paula, “o número 3 da Systemas revela a determinação dos seus editores pela continuidade de um projeto que se quer rico na diversidade temática e no conteúdo”.

Eis os nomes dos autores e respectivos artigos que compõem a nova edição:

MÁRCIA MIEKO MORIKAWA (Doutora e Mestre em Ciências Jurídico-Políticas pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra), “Good governance e o desafio institucional da pós-modernidade”.

MANOJ KUMAR SINHA (Professor de Direito na The West Bengal National University of Juridical Sciences), “Human rights and good governance”.

GILMAR FERREIRA MENDES (Ministro do Supremo Tribunal Federal do Brasil), “A supralegalidade dos tratados internacionais de direitos humanos e a prisão civil do depositário infiel no Brasil”.

MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO (Professor Titular de Direito Constitucional da USP), “Notas sobre o direito constitucional pós-moderno, em particular sobre certo neoconstitucionalismo à brasileira”.

JORGE MIRANDA (Professor Catedrático das Faculdades de Direito da Universidade de Lisboa e da Universidade Católica Portuguesa), “A Constituição de Angola de 2010”.

SUSANA AIRES DE SOUSA (Professora Assistente da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra), “Algumas considerações sobre a responsabilidade criminal do dirigente empresarial”.

Lei Maria da Penha

A campanha que acompanhará e monitorará efetividade da Lei Maria da Penha (Lei nº. 11.340, que coíbe e pune a violência doméstica contra as mulheres) será lançada em São Paulo, com o apoio do Tribunal de Justiça (TJSP), em data a ser brevemente definida.

A campanha - criada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e que conta com a parceria da Secretaria Nacional de Futebol do Ministério dos Esportes - será apresentada nos estádios de futebol durante os jogos dos campeonatos estaduais, por meio de faixas que poderão ser apresentadas pelos próprios jogadores.

A forma de difusão da campanha, que foi realizada inicialmente no Ceará e agora estará em todo o país, ressalta a importância da referida legislação entre a população brasileira, difunde sua aplicabilidade em todos os Estados e, sobretudo, auxilia na prevenção e no combate à violência contra as mulheres, deixando clara a informação de que, nos casos de agressão ou ameaça, devem recorrer ao Poder Judiciário.

Jornada - A divulgação consiste em uma das várias ações do CNJ no trabalho de apoiar e intensificar a compreensão dos brasileiros sobre a lei. Dentre elas, a realização, ontem (22), da quinta edição da chamada “Jornada Maria da Penha”. Esse evento anual tem por finalidade discutir políticas públicas do Poder Judiciário sobre o tema e sua integração com outros entes governamentais. Expõe, também, o quadro atualizado da instalação e do funcionamento dos juizados e varas especializadas, além de abordar aspectos jurídicos da lei em paineis de debate que contam, sempre, com a presença de magistrados, juristas e operadores de Direito.

Desde a sanção da lei Maria da Penha, em 2006, o CNJ tem realizado o monitoramento de sua aplicação em todo o país. O CNJ tem atuado na difusão do texto entre a população, na implantação de iniciativas que envolvem ações diversas nos Estados, além do acompanhamento dos dados estatísticos referentes aos processos em aberto, às medidas protetivas e às sentenças proferidas.

Fonte: Tribunal de Justiça de São Paulo

Redução da pena por estudo

O relator, Amauri Teixeira, destacou que pais de família também estão nos presídios.O Plenário aprovou simbolicamente, nesta quarta-feira, substitutivo ao Projeto de Lei 7824/10, do Senado, que muda a Lei de Execução Penal (7.210/84) para permitir a redução de um dia de pena do presidiário para cada 12 horas de atividades de ensino. Como foi alterada, a matéria retorna para análise do Senado.

Segundo o texto aprovado, do deputado Amauri Teixeira (PT-BA), os condenados em regime aberto ou semiaberto e aqueles em liberdade condicional poderão frequentar cursos presenciais ou a distância. Já o condenado que cumpre pena em regime fechado, conforme emenda do deputado Fernando Francischini (PSDB-PR), terá direito à redução da pena pelo trabalho ou pelo estudo apenas se essas atividades forem restritas ao presídio, permitindo-se também o ensino a distância.

Serão admitidas as atividades de ensino fundamental, médio - inclusive profissionalizante - e superior ou de requalificação profissional. Elas deverão estar divididas em, pelo menos, três dias.

"É um benefício para aquelas pessoas que podem ter cometido um crime fortuito. Alguns pensam que há no presídio apenas pessoas ligadas ao crime organizado. Pai de família também comete crime", argumentou o relator ao defender a aprovação do projeto.

Jurisprudência

A remissão da pena com o estudo é aplicada pela Justiça com base em jurisprudência, mas os juízes divergem sobre quantas horas de estudo são necessárias para diminuir um dia de pena. O projeto disciplina essa questão e também permite a contagem desse tempo de estudo e de trabalho para todos os efeitos, como progressão de regime.

A redução da pena depende de certificado de frequência expedido pelas autoridades educacionais competentes e, se o condenado trabalhar e estudar, deverá haver compatibilidade dessa carga horária diária.

Crime hediondo

Teixeira incorporou ao texto aprovado emenda do deputado Mandetta (DEM-MS) que proíbe a remissão de pena pelo trabalho ou pelo estudo aos condenados por crimes hediondos ou equiparados.

Na discussão do tema, entretanto, o deputado Mendonça Filho (DEM-PE) alertou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já considerou inconstitucional matéria semelhante. "Votei a favor dessa proibição junto com toda nossa bancada, mas infelizmente o STF vai se manifestar contra", ressaltou.

Falta grave

Se o presidiário que trabalha ou estuda cometer falta grave, o juiz poderá revogar até 1/3 do tempo a ser descontado da pena estipulada. A partir da data dessa infração, começará a contagem de novo período. Atualmente, a lei prevê a perda do tempo total obtido, regra mantida caso houver reincidência na falta grave.

Estudo fora

A diretoria do presídio deverá encaminhar mensalmente ao juízo da execução penal um registro de todos os condenados que estejam trabalhando ou estudando e dos dias de trabalho ou de frequência em atividade de ensino de cada um deles.

O condenado autorizado a estudar fora do presídio deverá comprovar todo mês a freqüência e o aproveitamento escolar por meio de declaração da unidade de ensino.

Bolsa de estudo

O texto aprovado pela Câmara excluiu dois pontos do projeto do Senado. Um deles permitia ao condenado pleitear bolsa no Programa Universidade para Todos (Prouni) e o outro concedia aumento de 1/3 do tempo conseguido no caso de conclusão dos níveis de ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena.

Fonte: Câmara dos Deputados Federais

Roubo em avião - competência

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a competência da Justiça Federal para processar e julgar as causas que envolverem delitos cometidos a bordo de aeronaves, independentemente delas se encontrarem em solo. A decisão foi proferida num habeas corpus em que o réu pedia a anulação de uma decisão proferida pela 2ª Vara Criminal de São Paulo, que o condenou a 13 anos e quatro meses de reclusão por um roubo ocorrido em uma aeronave no pátio do aeroporto de Congonhas, em São Paulo.

O crime em questão ocorreu no interior de um avião Embraer 810, em pouso, onde um grupo de homens armados roubou malotes no valor de mais de R$ 4 milhões. O montante era transportado pela empresa Protege S/C Ltda. e pertencia ao Banco do Brasil. De acordo com a defesa do réu que contestava a condenação, os crimes praticados contra o banco não deslocariam a competência da justiça comum para a Justiça Federal, tampouco o fato de o delito ter sido praticado contra uma empresa de transporte de valores em um aeroporto.

No entanto, para o relator no STJ, desembargador convocado Adilson Macabu, a Constituição Federal é clara e taxativa quanto à competência dos juízes federais neste caso. Segundo o artigo 109, IX, da Constituição Federal, eles são responsáveis por processar e julgar delitos cometidos a bordo de aeronaves, independentemente delas se encontrarem em solo. O réu teve a condenação confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) por roubo e formação de quadrilha. HC 108478

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

Quantidade de droga

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) acolheu parcialmente pedido da Defensoria Pública da União e determinou ao juízo de primeiro grau que proceda a nova individualização da pena de dois homens presos por tráfico de entorpecentes. Condenados à pena de cinco anos e seis meses de reclusão, os dois vêm tentando reduzi-la em dois terços, patamar máximo previsto no artigo 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas), mas em todas as instâncias a pretensão foi rejeitada com base na quantidade da droga apreendida: 98 pedras de crack.

O relator do HC 106135, ministro Gilmar Mendes, assinalou que a quantidade de droga deve ser sopesada na primeira fase da individualização da pena, e é impróprio invocá-la por ocasião da escolha do fator de redução prevista na Lei de Drogas, sob pena de “bis in idem” - duas penas sobre um mesmo fato gerador.

O parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas admite a redução da pena de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, tenha bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa. Os autos registram que os dois apenados preenchem esses requisitos, pois, de acordo com a sentença, além de serem primários e terem bons antecedentes, havia “indícios de que se tratam de usuários que comercializam a droga para manter o próprio vício”, circunstâncias extrapenais consideradas favoráveis aos réus.

Apesar disso, o juiz de primeiro grau aplicou a redução em patamar intermediário, e não máximo. Esse entendimento foi mantido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ/MG) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo o STJ, “na fundamentação de primeiro grau já se percebe que os pacientes merecem a redução máxima”. Mas, por considerar “significativa” a quantidade de entorpecente apreendida, o Tribunal denegou a ordem.

Para a Defensoria Pública, o STJ teria contrariado sua própria jurisprudência, segundo a qual a redução da pena, uma vez preenchidos os requisitos legais, deve ser aplicada sem levar em consideração a quantidade de droga apreendida. Ao não fazê-lo, teria imposto condições “mais gravosas, e não constantes em lei”, para a não fixação da diminuição no máximo previsto.

O ministro Gilmar Mendes acolheu a argumentação da defesa, e seu voto foi no sentido de determinar nova individualização da pena, na medida em que a causa da redução não foi devidamente fundamentada. “O magistrado não deve utilizar a quantidade de droga apreendida para efeitos de motivar a redução a menor”, afirmou. A decisão foi unânime.

Processo relacionado: HC 106135

Fonte: Supremo Tribunal Federal

quarta-feira, 23 de março de 2011

Exame criminológico

O ministro Marco Aurélio aplicou jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e indeferiu pedido de liminar formulado no Habeas Corpus (HC) 106678, em que Benedito dos Santos, condenado pela Justiça do Espírito Santo à pena unificada de 40 anos e 10 meses de reclusão e multa pela prática de diversos crimes, pedia a progressão no cumprimento da pena, do regime fechado para o semiaberto, sem submeter-se a exame criminológico.

A defesa alegava que ele já tinha tempo suficiente para obter a progressão do regime. Sustentava, ademais, que a Lei nº 10.792/2003 suspendeu a obrigatoriedade do exame criminológico para concessão da progressão do regime prisional, antes prevista no artigo 112 da Lei de Execuções Penais (LEP, Lei nº 7.210/1984). Entretanto, o juiz da Segunda Vara Criminal da Comarca de Viana (ES) negou-lhe o pedido, por entender ser indispensável o exame criminológico.

Dessa decisão, a defesa recorreu sucessivamente em HCs para o Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJ-ES) e para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas ambos negaram o pedido. No entendimento das duas cortes, a Lei nº 10.782/2003, ao dar nova redação ao artigo 112 da LEP, não retirou do juiz a faculdade de, em decisão fundamentada, condicionar a concessão do benefício à realização do exame criminológico.

Decisão

Ao indeferir o pedido de liminar, o ministro Marco Aurélio lembrou que, pessoalmente, é contra a exigência do exame criminológico em casos como este. Entretanto, afirmou não ter como sobrepor à visão da maioria dos ministros do STF, atuando como porta-voz da Corte com “a convicção pessoal quanto à derrogação da Lei de Execução Penal”.

Lembrou, a propósito, voto nesse sentido proferido por ele no julgamento do HC 96853, relatado pelo ministro Ricardo Lewandowski.

Processo relacionado: HC 106678

Fonte: Supremo Tribunal Federal

Súmula n. 471 do STJ

O artigo 5º da Constituição Federal de 1988 garante os direitos fundamentais do cidadão e, em seu inciso XL, proíbe que a lei retroaja, a não ser para beneficiar o réu. Esta foi uma das fundamentações apresentadas pela ministra Maria Thereza de Assis Moura na proposta do projeto que deu origem à mais nova súmula do Superior Tribunal de Justiça.

A súmula, de número 471, trata da evolução do regime prisional em casos de crimes hediondos, focando na quantidade de pena cumprida suficiente para que a progressão seja realizada. A aplicação do sistema progressivo de execução da sanção nestes casos já era um ponto pacificado: o entendimento, tanto no STJ quanto no STF (Supremo Tribunal Federal), era de que é permitida a progressão do regime fechado para um mais brando mesmo aos condenados por crimes hediondos. Restava a dúvida sobre a quantidade de pena a ser cumprida.

Assim, a súmula definiu o parâmetro para a progressão de regimes: o art. 112 da LEP utiliza o critério de 1/6 da pena, enquanto a Lei de Crimes Hediondos, alterada pela lei 11.464/2007, usa o critério de 2/5 e 3/5. Portanto, a lei de 2007 (menos benéfica) não pode retroagir para os condenados antes de sua vigência.

Também embasaram a edição da súmula o artigo 2º do Código Penal (“Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.”) e o artigo 112 da LEP, que define as regras para a progressão de regime.

A inconstitucionalidade da vedação de progressão de regime foi declarada no julgamento do Habeas Corpus (HC) 82.959, de 23 de fevereiro de 2006. Após essa declaração, a lei 11.464/07 modificou a Lei de Crimes Hediondos. Mais tarde, no julgamento do HC 134-158, de relatoria do ministro Og Fernandes, a nova posição foi exposta. O mesmo foi reforçado pelo desembargador Celso Limongi no HC 100.277, em que foi destacada a inaplicabilidade da proibição nos crimes anteriores á Lei 11.464/07. Por fim, no HC 83.799, a ministra Maria Thereza de Assis Moura teve o mesmo entendimento, destacando que a Lei de Crimes Hediondos ganhou novos parâmetros para progressão do regime.

O texto da Súmula 471, do STJ, tem a seguinte redação: “Os condenados por crimes hediondos ou assemelhados cometidos antes da vigência da Lei n. 11.464/2007 sujeitam-se ao disposto no artigo 112 da Lei n. 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) para a progressão de regime prisional”.

Fonte: Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM

Discriminação racial

Até quando teremos notícias dessa brutalidade?

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Ultimamente, relatos de pessoas perseguidas e/ou agredidas em estabelecimentos comerciais, em função de sua cor de pele ou aparente situação sócio-econômica, têm sido comuns. Nesses casos, as notícias de maior repercussão envolvem grandes redes de supermercados, mas passam de meros exemplos do que se vê todos os dias, seja em uma gigante magazine, seja na vendinha da esquina. Dizer que não há preconceito racial no Brasil não passa de uma grande hipocrisia.

Um caso emblemático envolveu o vigilante Januário Alves Santana, que, em agosto de 2009, foi brutalmente agredido no estacionamento do supermercado Carrefour, em Osasco, por seguranças terceirizados. Santana foi acusado de estar roubando um automóvel, um EcoSport de cor prata, e por isso foi submetido a sofrimento físico e mental a fim de obter a confissão. Os seguranças terceirizados não acreditaram que o carro, comprado em 72 prestações de pouco menos de R$790,00, era dele. Alegavam que era “impossível um neguinho ter um EcoSport”.

Na sessão de tortura, que durou aproximadamente 20 minutos, Santana foi agredido com cabeçadas, coronhadas, socos e tentativas de esganadura que resultaram em fraturas na face, na perda de um dente e na necessidade de uma cirurgia no maxilar. Depois de um escândalo como esse, a rede de supermercados rapidamente publicou nota comunicando que a empresa de segurança e a gerência foram substituídos e que um pedido formal de desculpas foi feito. Em 2010, houve um acordo extrajudicial em que Santana recebeu uma indenização cujo valor não pôde ser divulgado.

Este triste episódio de racismo foi apontado por entidades de Direitos Humanos como exemplo de intolerância contra negros no país. Na época do ocorrido, a Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP) divulgou nota de repúdio, através da Comissão do Negro e de Assuntos Antidiscriminatórios (CONAD), e apontou que "é necessário que a sociedade repudie todo tipo de intolerância racial, especialmente quando o ato de racismo busca fazer a associação entre o componente étnico e o banditismo".

A princípio a Polícia Civil tratou o caso como “lesão corporal dolosa”, mas conforme a investigação avançou, a tipificação foi alterada. Após um ano e meio de inquérito, cinco seguranças envolvidos no espancamento foram indiciados por tortura. O indiciamento é considerado inédito entre os casos de discriminação racial no Brasil. Há ainda um sexto participante que impetrou habeas corpus e, de acordo com o delegado responsável, resta apenas a decisão judicial a respeito dessa ação para conclusão do inquérito.

Em mais de 1,2 mil processos judiciais de discriminação racial analisados pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT), entre 1997 e 2010, não há sequer um caso de inquérito policial baseado na lei federal n. 9.455/97, Lei da Tortura. De acordo com Hédio Silva Junior, ex-secretário de Justiça de São Paulo e membro do CEERT, o caso é emblemático e “sinaliza que as autoridades começaram a reconhecer a gravidade dos casos de racismo e das o tratamento merecido a eles. Não foi ‘constrangimento ilegal’ nem ‘lesão corporal dolosa’. Foi tortura.”.

No indiciamento são citados três policiais militares que, supostamente, atenderam a presumida ocorrência de roubo de veículo e negligenciaram prestação de socorros a Santana após a agressão. A Polícia Militar abriu procedimento interno para apurar as acusações contra os agentes.

O fato de os seguranças de empresa terceirizada terem torturado o vigilante é, em si, absurdo. A situação fica pior ainda quando se percebe que a motivação para supor que Santana estivesse roubando o automóvel e agredi-lo foi o simples fato de ele ser negro. Este não foi o primeiro nem vai ser o último episódio do gênero. Infelizmente. Há ainda muitos outros casos de violência e desproporcional tratamento a pessoas suspeitas de furtar itens; situações em que o indivíduo torna-se um suspeito “padrão” por conta de sua cor de pele ou por parecer ter condições de vida mais humildes.

Um dos exemplos de abuso ocorreu com Franciely Marques que, mesmo depois de ter apresentado o comprovante de pagamento, foi acusada injustamente de ter furtado duas canetas em uma loja da rede Sendas, no Rio de Janeiro. A vítima foi indenizada.

Outra cena de tratamento extremamente desproporcional foi vivenciada por Ademir Perano, o qual furtou coxinhas, pães de queijo e creme de cabelo, itens que somavam o valor de R$26,00. O delito foi praticado em um mercado da empresa Dia%, em São Carlos. Perano foi conduzido a um banheiro, onde foi agredido com chutes, socos e um rodo e ficou trancado até às 22h. Buscou socorro, mas não foi suficiente: morreu por causa de hemorragia interna e uma série de traumatismos.

Em maio de 2010, o aposentado Domingos da Conceição dos Santos tentou entrar em uma agência bancária e foi baleado na cabeça. A porta giratória emitiu sinal de alerta porque o cliente usava marca-passo; ele mostrou o documento que comprovava o uso do aparelho e, mesmo assim, o segurança não o deixou entrar. Os dois discutiram até que o segurança sacou a arma e efetuou um disparo que atingiu a cabeça de Santos. Na época, a família alegou que o aposentado fora vítima de racismo.

Outro caso de racismo que está sendo investigado pela polícia ocorreu em janeiro deste ano. Um menino de apenas 11 anos alegou ter sido conduzido a uma “salinha” nos fundos de um Hipermercado Extra, em São Paulo, quando se dirigia à saída do estabelecimento. O garoto foi abordado pelos seguranças e acusado de ter furtado os biscoitos, salgadinhos e refrigerantes que levava consigo. Na referida sala reservada, segundo relato do menino, foi obrigado a tirar as roupas e chamado de “negrinho sujo e fedido”. Depois de revistar e insultar a criança, os seguranças verificaram a nota fiscal que comprovava a compra dos itens no valor de R$14,65. “Não acreditavam que eu não tinha roubado nada”, conta o menino.

Mais recentemente, em fevereiro, a dona de casa Clécia Maria da Silva teve uma crise de hipertensão e quase sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) depois de ter sido acusada de furto e ter sua bolsa revistada em uma unidade da rede Walmart. Mais uma vez, a vítima tinha como comprovar que pagou pelos produtos. De acordo com Silva, a pessoa que a revistou teria dito que “isso acontece mesmo com os pretos”. O ocorrido foi registrado como calúnia.

Não só pelos lamentáveis exemplos expostos acima, é fácil perceber que o preconceito racial ainda está fortemente arraigado à sociedade brasileira. De tal forma que gera uma estigmatização social, a qual exerce, inclusive, forte influência sobre escolhas relativas à política criminal. Como visto, na esfera da segurança privada, essa estigmatização também interfere na determinação de quem será o “suspeito padrão”, aquele que, inconscientemente até, passará a ser monitorado ao entrar em algum estabelecimento comercial. Mas, evidentemente, esse tipo de atitude não é exclusivo de ambientes como os mencionados; está em todos os lugares, parte de pessoas das mais diversas etnias, condições sócio-econômico-culturais, orientações políticas e independe de gênero, faixa etária ou opção sexual.

Frente aos escândalos que apontam para condutas racistas, as empresas que levam os nomes dos locais onde acontecerem episódios vergonhosos como os expostos aqui logo asseguram colaborar no que puderem e anunciam a implementação de ações que auxiliem na difusão de conceitos de diversidade e promoção da inclusão social. O que já significa alguma coisa, mas não é suficiente. Admitindo ou não, no Brasil há, ainda, significativa discriminação e, para que cenas como estas não se repitam, é preciso mudar não só o treinamento de empregados que trabalham com vendas, segurança ou prestação de serviços, mas extinguir certos pré-conceitos, certas pré-disposições da sociedade como um todo.

Fonte: Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM

Pecultato

Após confirmada condenação a uma pena de nove anos e dois meses de reclusão, em regime fechado, o ex-vereador de Curitiba e ex-deputado estadual, Aparecido Custódio da Silva, foi preso na manhã de ontem, 21. O mandado de prisão foi cumprido por integrantes do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado, por solicitação da Promotoria de Justiça de Proteção ao Patrimônio Público, após mandado de prisão expedido pela 6ª Vara Criminal da capital.

A condenação ocorreu nos autos da Ação Penal nº 2000.3332-4, da 6ª Vara Criminal, confirmada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná na Apelação Criminal nº 351.419-4, que tramitou na 2ª Câmara Criminal do TJ, tendo por fundamento os artigos 312 e 71 do Código Penal (peculato continuado). O vereador foi condenado por ter se apropriado, por 233 vezes, de parte da remuneração que era destinada a servidores nomeados para cargos em comissão em seu gabinete na Câmara Municipal de Curitiba, entre 1993 e 2000.

Além desta condenação, o ex-vereador tem outra, ainda não transitada em julgado, a uma pena quatro anos e dez meses de reclusão em regime semi-aberto, além de 180 dias-multa (Ação Penal nº 9.332/7 da 7ª Vara Criminal desta Capital e Apelação Criminal nº 609.388-7, da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná).

Ambas as ações foram propostas pela Promotoria de Justiça de Proteção ao Patrimônio Público do foro central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba.

Assim sendo, somando ambas as condenações criminais, o ex-vereador e ex-deputado estadual, Aparecido Custódio da Silva, poderá cumprir uma pena de 14 anos de reclusão em regime fechado, além de 15.558 dias-multa.

Fonte: Ministério Público do Paraná

Lei Maria da Penha

O plenário do Conselho Nacional de Justiça aprovou resolução que determina aos tribunais de justiça de todos os estados e do Distrito Federal a criação de coordenadorias estaduais voltadas para o atendimento às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. Na prática, a resolução determina, após a publicação do texto, prazo de quatro meses para que tais tribunais instalem suas coordenadorias e passem, a partir delas, a repassar informações sobre os processos abertos e a colaborar com o combate a este tipo de violência. Prazo, este, que deverá vigorar até setembro. Dentre outras atribuições, as coordenadorias deverão elaborar sugestões para o aprimoramento da estrutura do Judiciário na área do combate e prevenção da violência contra as mulheres e dar suporte aos magistrados, servidores e equipes multiprofissionais neste tipo de trabalho, como forma de melhorar a prestação jurisdicional. Deverão, ainda, promover articulações entre o Judiciário e outros órgãos - tanto governamentais como não-governamentais - que levem a parcerias para o andamento destas ações.

Procedimentos - Também caberá às coordenadorias, recepcionar em cada estado dados, sugestões e reclamações referentes aos serviços de atendimento à mulher em situação de violência e fornecer os dados referentes aos procedimentos que envolvem a Lei Maria da Penha (Lei 11.340, que coíbe a violência doméstica e familiar contra as mulheres) ao CNJ.

Conforme o teor da resolução, cada coordenadoria estadual da mulher em situação de violência deverá ser dirigida por um magistrado com competência jurisdicional ou conhecida experiência na área. Além disso, poderá contar com a colaboração ou assessoria de outros magistrados - sem dispensa da função jurisdicional - e estrutura de apoio administrativo e equipe multiprofissional (preferencialmente, do quadro de servidores do Judiciário).

Assistência - De acordo com os conselheiros do CNJ, a resolução leva em consideração o dispositivo constitucional previsto no artigo 226 da Carta Magna, segundo o qual, compete ao Estado assegurar assistência a cada um dos integrantes da família, criando mecanismos que venham a coibir a violência no âmbito de suas relações. E, também, a Lei 11.340 (Lei Maria da Penha) no artigo 1º, que estabelece que cabe ao poder público desenvolver políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres na seara das relações domésticas e familiares.

A resolução foi aprovada no momento em que o CNJ se prepara para abrir a quinta edição da Jornada Maria da Penha, programação que consiste em painéis e discussão sobre a aplicabilidade e eficácia da lei com autoridades e especialistas diversos. A Jornada deste ano está programada para acontecer hoje (22/03) no plenário do Conselho. Tem por finalidade, discutir políticas públicas do Poder Judiciário sobre o tema. Objetiva, ainda, expor o quadro atualizado da instalação e do funcionamento dos juizados e varas especializadas em violência doméstica e familiar contra a mulher, além de abordar aspectos jurídicos com magistrados, juristas e operadores de Direito.

Fonte: Conselho Nacional de Justiça

Cola etetrônica

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou seguimento ao Habeas Corpus (HC 107613) impetrado em favor do servidor público federal M.A.D.L., preso preventivamente desde 17 de dezembro do ano passado, após operação da Polícia Federal que desbaratou uma quadrilha especializada no fornecimento de “cola eletrônica” a candidatos que disputavam vagas em concursos públicos. A defesa alegou ocorrência de constrangimento ilegal por suposta falta de justa causa para a ação penal, em trâmite na 3ª Vara Federal de Santos (SP).

O ministro relator verificou que o habeas corpus impetrado no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) pela defesa do servidor público ainda não teve seu mérito julgado, circunstância necessária para atrair a competência do Superior Tribunal de Justiça. No STJ, essa situação foi verificada pelo relator do HC, que indeferiu a liminar. “Não há o que ser censurado nessa decisão [do STJ]. Percebe-se que o habeas corpus não foi conhecido pelo STJ porque as questões nele levadas para discussão - e trazidas no presente writ - não teriam sido objeto de análise de forma definitiva por aquele TRF. Com efeito, a apreciação desses temas, de forma originária, neste momento, configuraria verdadeira dupla supressão de instância não admitida”, salientou Dias Toffoli.

M.A.D.L. foi denunciado por estelionato (art. 171 do Código Penal) e formação de quadrilha (art. 288 do Código Penal) por fraude decorrente da obtenção das respostas para a prova do concurso público para ingresso no cargo de auditor fiscal da Receita Federal, organizado pela Escola de Administração Fazendária (Esaf), por meio de dispositivo eletrônico (“cola eletrônica”). Segundo denúncia do Ministério Público Federal, o suposto líder da quadrilha foi quem repassou as respostas ao candidato M.A.D.L., via ponto eletrônico, e também a outro homem, conhecido como “Pangaré”; os dois faziam as provas na sala com os demais fraudadores.

O dispositivo eletrônico utilizado consistia num colar colocado no pescoço do candidato, que funcionava simultaneamente como microfone e dispositivo de transmissão, e era ligado por um fio a um telefone celular. M.A.D.L. também teria usado uma escuta. O chefe da quadrilha ligava para este celular e ditava as respostas. O áudio da ligação telefônica era retransmitido para o colar que, por sua vez, retransmita as informações por radiofrequência para uma ou mais escutas (“pontos eletrônicos”) colocadas nos ouvidos dos candidatos. Por isso, apenas um candidato precisava estar com o celular, com o colar e com o ponto eletrônico; os demais necessitavam apenas do ponto eletrônico no ouvido. Como o colar funcionava também como microfone, M.A.D.L. podia se comunicar com o chefe da quadrilha.

No HC impetrado no Supremo, a defesa do servidor público federal argumentava que a utilização da chamada “cola eletrônica” em concursos públicos não está prevista no ordenamento jurídico como crime. “Ainda que possa ser reprovada social e moralmente, a conduta não é típica. E, consequentemente, sem a prática de crime, não há que se falar em formação de quadrilha. Logo, falta justa causa à ação penal, que deve ser trancada. A denúncia não poderia sequer ter sido recebida pela juíza de origem”, salientou a defesa de M.A.D.L.

Fonte: Supremo Tribunal Federal

domingo, 20 de março de 2011

Ainda o bafômetro: é necessário!

Ontem eu destaquei um post sobre a utilização do bafômetro que foi bem acessado, porém mal comentado por alguns. Infelizmente se valeram do anonimato para insultar e desrespeitar quem procura fazer um trabalho sério no Direito Penal. Tudo bem! Vou mostrar juridicamente o meu pensamento (em poucas palavras) sobre essa questão do bafômetro.

Certamente quem me insultou não sabe qual é a minha posição a respeito do tema. Propus no livro (Direito Penal de Trânsito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010) que a embriaguez ao volante seja uma qualificadora do homicídio culposo de trânsito. Isso significa que os patamares mínimo e máximo da pena seriam elevados automaticamente se comprovado que o motorista ultrapassou o grau etílico permitido em lei.

Antes da reforma ocorrida em 2008 a embriaguez era uma causa de aumento dos delitos de dano (art. 302, parágrafo único, V). Depois se tornou letra morta quando relacionado ao homicídio culposo de trânsito, pois o delito de perigo (art. 306) é subsidiário ao delito de dano (art. 302). Também entendo que na dosagem da pena base do crime de dano o magistrado pode considerar a embriaguez como circunstância negativa do delito e, assim, definir a pena inicial acima do mínimo legal.

Vejam, portanto, que em momento algum eu incentivo os condutores a beber. Também não disse que eles não devem se submeter ao etilômetro. Apenas considero inconstitucional a prova da materialidade do delito do art. 306 obtida por meio desse aparelho. Certamente muitos julgam o livro apenas pela capa. Só pode ser.

Ah, os anônimos também devem consultar um dicionário, pois soprar existe tanto como assoprar.

Bom sábado.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Bafômetro: não me calo!


Recentemente postei no blog que o STJ, agora pelo Ministro Celso Limongi, Desembargador convocado do TJSP, entendeu que é possível a utilização do bafômetro para aferição da materialidade delitiva do art. 306 do CTB. Como o acórdão já está disponível, resolvi passar os olhos na decisão. Desconsiderando o relatório, sobraram 6 páginas de "fundamentação". Com a citação de doutrina e de precedentes jurisprudenciais, de fato, há duas páginas produzidas. E nessa última redução, algumas transcrições do acórdão do Tribunal de origem e do parecer ministerial. Do que li, confesso, nada agradou. Vou enumerar minhas insatisfações.

1) Inicia o relator perguntando se a demonstração da quantidade de álcool no sangue de uma pessoa (condutor) pode ser aferida pelo etilômetro (vulgo: bafômetro). Presumo, portanto, que essa é a tese principal a ser analisada. Como resposta valeu-se do que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul asseverou no julgamento da apelação e concluiu positivamente. No pouco que fundamentou, a meu ver, o fez de forma incorreta.

1.1) Recorreu em um primeiro momento ao art. 277 do CTB que está inserido dentro do capítulos das medidas administrativas. Sabemos que há duas infrações relacionadas à embriaguez: uma de perfil administrativo e outra de cunho penal. Segundo a Lei n. 9.503/97, com algumas modificações processadas pela Lei n. 11.705/08, as medidas administrativas são aplicáveis às infrações administrativas.

A primeira infração (de natureza administrativa) está prevista no art.165 do CTB. Quem tiver a ousadia de abrir a lei constatará que o parágrafo único do último preceito citado é claro em sua redação: "a embriaguez também poderá ser apurada na forma do art. 277". Ademais, também aqueles que tiverem força de vontade para passar os olhos em todo o art. 277 verificarão que o legislador em seu § 2 foi expresso ao destacar que "a infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas". Basicamente o art. 277 tem relação com a prova testemunhal, pois não há discussão em relação à possível utilização do etilômetro quanto à infração do art. 165. Assim, quando o condutor se negar a realização do exame pericial (incluído o bafômetro) os policiais responsáveis pela diligência poderão constatar que aquele está conduzindo sob a influência do álcool por qualquer outro meio. Depois, os seus depoimentos irão embasar o laudo e este será apto para futura punição administrativa.

Assim, em sintese: a) para efeitos penais, recorrer ao art. 277 é incorreto em razão de sua posição arquitetônica no CTB; e, b) como o art. 277 se refere à possibilidade de utilização da prova testemunhal, não haveria nem razão de ser citado, porque o próprio relator limitou a "fundamentação" do seu voto aquela questão inicial, ou seja, será possível utilizar o aparelho de bafômetro para fins criminais?

1.2) Depois o relator fez menção ao art. 306, parágrafo único, do CTB que determinou ao Poder Executivo Federal que etipulasse a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia. E aí citou o Decreto n. 6488/08 que assim procedeu. Por evidente, ao falar de utilização do bafômetro, está-se a referir de matéria probatória. Agora, pergunto: a quem compete em nosso país legislar sobre processo penal? Amigo, tendo um tempinho, abra um livro chamado Constituição Federal e leia o art. 22, I. Lá não estará escrito que o Presidente tem essa competência. Quem entre nós legisla é o Poder Legislativo. Todavia, como se trata de matéria que afronta a CF, a competência de análise é do STF. Mas apenas quis deixar claro que esse Decreto, lembrado pelo relator, a princípio, é inconstitucional.

2) Depois há citação doutrinária para destacar que o crime é de perigo abstrato. Considerações mais aprofundadas não são apresentadas. Em sintese, EU digo que nesse tipo de delito uma lesão ou uma concreta colocação em perigo do bem jurídico é estranha ao preceito normativo. O fundamento da punição está vinculado a mera desobediência à vigência da lei (aqui, puro Gunther Jakobs). Nem irei me debater sobre essa questão. Já fiz em outros momentos e o farei em tantos outros ainda. Passo a destacar as jurisprudências colacionadas na sequencia do voto.

2.1) O primeiro precedente utilizado visou fundamentar ou reforçar a corrente seguinta pelo Min. Celso Limongi, qual seja, que o art. 306 do CTB é um crime de perigo abstrato. Pois bem, textualmente o que verifico é que a decisão por ele usada segue posição contrária. Textualmente: "ausente o dano potencial à coletividade, o fato será atípico penalmente, subsistindo, apenas, a responsabilidade administrativa, para a qual basta o perigo abstrato" (Habeas Corpus n. 153.311, rel. Min. Gilson Dipp, DJe 18/10/2010).

2.2) Outro precedente citado está viciado. Como assim? Na parte que discuto, a Ministra Laurita Vaz fez menção ao processo RHC 26.432/MT, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 22/02/2010 no qual este togado aderiu de modo expresso ao parecer ministerial (que se valeu de outro julgado do STJ) no qual a fundamentação APENAS se valheu de legislação NÃO MAIS ESTAVA VIGENTE. Quem duvida do que estou falando, por favor, consultar com toda a atenção um antigo post destacado nesse blog e abaixo referido:


Quero acreditar que a Ministra Laurita e sua equipe passaram os olhos em todo o julgado referido, porém confesso minha descrença. Ficaram apenas na ementa. Eu, contudo, analisei todo o julgado e os precedentes nele citados. O vírus preguicitum lectura de voctum não me atingiu. Porém, nota-se que a contaminação é evidente. No link citado eu me pronunciei a respeito e tive a colaboração do magistrado Alexandre Moraes da Rosa ao torná-la pública no último congresso do IBCCRIM realizado em São Paulo. O espanto foi geral!

2.3) Outro precedente é justamente da lavra do Min. Napoleão Nunes Maia Filho (Habeas corpus n. 151,087/SP, DJe 26/04/2010). Ele igualmente se valeu de anteriores e incorretas decisões do STJ, como, por exemplo, o Recurso em Habeas corpus n. 20.129/MT, rel. Min. Gilson Dipp, DJ 04/06/2007. Atentem à data de publicação desta decisão. Ela é anterior à reforma legislativa que se operou na Lei de Trânsito. Pergunto: isso não impressiona? Ademais, quem ler a decisão em sua integralidade descubrirá que seu conteúdo está relacionado à possibilidade de aferição da materialidade por exame clínico (leia-se, prova testemunhal). Acaso alguém tenha esquecido a tese principal do Min. Celso Limongi, eu recordo: ele pretende saber da possibilidade de utilização do bafômetro!

3) Depois desse carnaval, o relator denegou a ordem, pois como o condutor fez voluntariamente (soprou o aparelho do bafômetro) ele mesmo deu sustentação para o oferencimento da futura denúncia, uma vez que a concentração de álcool supera o limite equivalente previsto no Decreto referido. Mas mesmo esse comportamento voluntário não mascara a inconstitucionalidade do uso da prova pericial coletada. Cabe ao defensor propor novos habeas, agora ao STF, para que esse se manifeste sobre a violação do art. 5, II e do art. 22, I, de nossa Constituição. O que o relator fez foi reparar a omissão expressa no preceito incriminador do art. 306 que não demonstra o grau mínimo de álcool nos pulmões para aferição da materialidade delitiva. Mas isso não podiii!!!

4) Minha preocupação reside na falta de critério para escolha de precedentes a fim de justificar um ponto de vista. Abre-se a ferramenta de busca do respectivo tribunal, jogam-se as palavras chaves, e o que aparecer copia-se e cola-se. Nem leitura fazem. Não há a mínima cautela em analisar eventual contradição entre a doutrina citada e o precedente utilizado para reforçá-la, ou entre o que se questiona em um voto e o que os demais julgados realmente apresentam como matéria de fundo. Devo dizer que atualmente não tenho vínculo nem com o Judiciário e nem com a prática da advocacia. Somente procuro fazer o que as escolas européias por seus professores voltados à pesquisa realizam: um trabalho de investigação e análise sério dos julgados dos Tribunais Superiores. Enquanto o STF não se manifestar sobre a possível inconstitucionalidade do preceito com certeza NÃO ME CALAREI!