sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Mensagem final de 2010

Feliz Ano Novo, repleto de conquistas pessoais e realizações profissionais. E que 2011 passe muito rápido porque eu quero muito voltar ao Brasil.... Abraços

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Caos carcerário

A população carcerária no país é de 498.487 presos, somando os condenados dos regimes fechado, semi-aberto e parte do aberto, além dos presos provisórios que aguardam decisão definitiva.

Do total da população carcerária, 277.601 são presos condenados e 220.886 são presos provisórios o que equivale a uma taxa de encarceramento de 260 presos para cada grupo de 100 mil habitantes. Os dados fazem parte de um relatório do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e das Medidas Socioeducativas (DMF), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

O relatório informa que há um déficit de 197.872 vagas, sendo necessários 396 estabelecimentos penais com capacidade para 500 presos, cada um, para acomodar todos os presos do Sistema. Os estudos do DMF concluem que a população carcerária no Brasil cresceu 41,05% no período de 2005 a 2010.

A realidade do sistema carcerário no Brasil passou a ser melhor compreendida a partir dos mutirões carcerários, atividades realizadas pelo CNJ em parceria com os Tribunais de Justiça e Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Este ano foram realizados mutirões carcerários nos estados do Paraná, Acre, Amazonas, Piauí, Tocantins, Minas Gerais, Espírito Santo, Pará, Alagoas, Rio Grande do Norte e Mato Grosso e no Distrito Federal.

Segundo relatório do DMF, o estado de Minas Gerais é o que apresenta números mais significativos de população carcerária: são 31.926 presos provisórios (65%); 17.211 presos condenados (35%); 30.401 vagas e déficit de 18.736. A população carcerária de Minas Gerais é de quase 50 mil presos (49.137).

O mutirão ocorrido em Minas, com duração de 59 dias, analisou 28.830 processos, concedeu 5.573 benefícios (19%) e proporcionou liberdade para 3.170 presos (11%).

O Acre (AC), segundo o relatório do DMF, é o estado de menor população carcerária no país com 3.613 presos em seu sistema prisional. Desse total 986 são presos em regime provisório (27%) e 2.627 são condenados pela Justiça (73%). O sistema prisional do Acre possui 1.608 vagas e déficit de 2005. Durante 31 dias de mutirão carcerário foram analisados 3.096 processos ocasionando 454 benefícios (15%) com a concessão de liberdade para 263 presos (8%).

Fonte: Conselho Nacional de Justiça

Violência doméstica

A Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça firmou convênios com o Ministério Público para a implementação de 17 núcleos/promotorias especializadas no atendimento à mulher vítima de violência doméstica ou familiar em 6 estados (São Paulo, Amapá, Acre, Rio Grande do Norte, Paraíba e Tocantins). Atualmente, 16 núcleos estão em pleno funcionamento em 11 estados brasileiros.

Ao longo de 2010, os recursos liberados pela SRJ para a criação desses núcleos especializados, que fazem parte do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), alcançaram a marca de R$ 2,3 milhões. As regiões priorizadas pela secretaria foram Norte e Nordeste.

Cadastro dos casos de violência doméstica

Seguindo o disposto na Lei Maria da Penha (nº 11.340/06), o Ministério Público, sem prejuízo de outras atribuições, passará a cadastrar os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher. De acordo com o Secretário de Reforma do Judiciário, Marivaldo Pereira, o cadastro servirá para traçar o perfil sócio-demográfico dos envolvidos nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.

“A SRJ tem trabalhado para que o cadastro seja implementado em todo país. A partir dessa implementação vamos tornar efetiva a divulgação dos dados", complementou o secretário. Rio Grande do Norte e Paraíba já celebraram convênios para a dar início à coleta dos dados para a efetivação do cadastro.

Fonte: Ministério da Justiça

Crimes cibernéticos

O substitutivo do Senado ao projeto de lei que trata dos crimes cibernéticos (PL 84/99) define várias condutas a serem consideradas crimes virtuais – como roubo de senhas, disseminação de código malicioso, invasão de sites protegidos e distribuição de informações sigilosas. A proposta ainda torna crime a cópia de documentos eletrônicos.

Na opinião do relator da matéria na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática, deputado Julio Semeghini (PSDB-SP), a definição dos crimes é consensual. "Quanto a essas tipificações não há restrições, não há dúvidas; não se trata de propriedade intelectual, apenas da tipificação de crimes, que precisa ser feita", afirma. Ele admite, porém, que não há consenso quanto ao texto como um todo.

Já o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), também integrante da comissão, avalia no entanto, que as definições propostas pelo senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) são todas polêmicas: “Os tipos penais propostos são muito abrangentes e permitem criminalizar qualquer prática, como por exemplo, baixar música na internet.”

Teixeira antecipa que já preparou a minuta de um novo projeto a ser apresentado em breve na Câmara. De acordo com ele, a proposta, elaborada em conjunto com Azeredo, apresenta novas definições para os crimes virtuais. Ele informou ainda que o Ministério da Justiça está para definir quando será enviado ao Congresso o projeto de marco civil da internet proposto pelo Executivo.

Fonte: Câmara dos Deputados Federais

Reintegração social

As ações empreendidas pelo Projeto Começar de Novo, iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), disponibilizaram até o final do mês de novembro, 1.281 vagas de emprego, distribuídas por todo o país (além das 416 vagas já preenchidas) e 1.485 vagas em cursos que qualificam e promovem a cidadania de presos egressos do sistema carcerário.

O projeto tem por objetivo promover ações de sensibilização de órgãos públicos e da sociedade civil para apoiar presos e egressos do sistema carcerário e cumpridores de penas e medidas alternativas.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) coordena, em âmbito nacional, as propostas de trabalho e de cursos de capacitação profissional, estimulando a adoção de medidas que contribuam para a ressocialização dos quase 500 mil presos brasileiros.

Fonte: Conselho Nacional de Justiça

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Princípio da insignificância

Está mantida a prisão de um homem e uma mulher acusados de furtar 30 barras de chocolate (dez da Garoto, dez da Lacta e dez de Diamante Negro) e um isqueiro Bic. A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou habeas corpus à dupla porque os bens, ainda que devolvidos à vítima, alcançavam o valor de quase 50% do salário mínimo.

O furto, ocorrido em 2008, na cidade de Passo Fundo (RS), só não foi consumado porque a dupla foi flagrada colocando alguns objetos na bolsa de uma e na cintura do outro.

A relatora do habeas corpus, ministra Maria Thereza de Assis Moura, destacou que o STJ e o Supremo Tribunal Federal (STF) têm jurisprudência de que a incidência do princípio diz respeito a fatos dotados de mínima ofensividade, desprovidos de periculosidade social, de reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e que a lesão jurídica provocada seja inexpressiva. Contudo, no caso em questão, apesar de a vítima ser um supermercado, não tendo ocorrido efetivo prejuízo, visto que a mercadoria foi recuperada, não se pode esquecer que à época do furto - fevereiro de 2008 - o valor dos bens furtados (R$ 178,40) era apenas um pouco inferior à metade do salário mínimo (R$ 360). HC 133991

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

Pergunta: e quanto já custou esse processo para a justiça brasileira?

Cooperação para reinserção social

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) firmou acordos de cooperação técnica para a implantação de programa de reinserção social de presos, egressos do sistema prisional, cumpridores de penas e medidas alternativas.

Os acordos, assinados durante o ano de 2010, também contemplam o apoio a adolescentes em conflito com a lei, incentiva o trabalho e à profissionalização com ações implantandas pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e das Medidas Socioeducativas e seus parceiros.

Os Termos de Acordo de Cooperação Técnica (TACT) envolvem o Ministério Público do Trabalho, o Ministério do Trabalho e Emprego, e os Tribunais de Justiça dos Estados da Bahia, Alagoas e Minas Gerais.

Entidades do estado do Espírito Santo e o Instituto Minas pela Paz também participam do acordo de cooperação técnica.

Fonte: Conselho Nacional de Justiça

Competência Justiça Federal

A Justiça Federal é responsável para julgar os crimes de falsificação de documentos civis emitidos por órgão da administração militar. O entendimento é da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que declarou o Juízo Federal da 2ª Vara de Ribeirão Preto (SP) competente para julgar o crime praticado por civil perante a Capitania dos Portos do Tietê-Paraná, em Barra Bonita (SP).

O acusado apresentou à equipe de inspeção naval documento falso. Os autos foram enviados à Justiça Militar. A 1ª Auditoria da 2ª Circunscrição Judiciária Militar da União se declarou incompetente para julgar o caso e remeteu o processo para a Justiça Federal. O Juízo Federal da 2ª Vara suscitou o conflito de competência ao STJ.

Segundo o relator, ministro Gilson Dipp, embora o objeto da falsificação seja carteira de habilitação de Arrais-Amador (para condução de embarcação), verifica-se a competência da Justiça Federal. A emissão desse tipo de carteira é feita pela Marinha do Brasil, órgão integrante das Forças Armadas.

De acordo com o artigo 21, XXII, da Constituição Federal, a execução da polícia marítima é da competência da União e exercida por meio da Polícia Federal, o que atrai o julgamento da 2ª Vara Federal de Ribeirão Preto.

Processo: CC 108134



Fonte: Superior Tribunal de Justiça

Decisão fundamentada

A prisão preventiva embasada no modo como o crime foi concretamente praticado é suficiente para justificar a medida. A decisão é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que manteve a prisão de acusado por homicídio tentado mesmo após a intervenção e na presença de policiais.

Segundo o Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (TJMS), a vítima dirigiu-se a uma unidade da Polícia Militar e alertou os policiais de que tinha medo de ser atacado pelo réu. Em seguida, quando retornava ao local em que seus colegas estavam, foi atacado. O acusado feriu a vítima no braço com uma faca. A vítima se defendeu, o que possibilitou aos policiais que atuassem em seu socorro.

Ainda conforme o TJMS, o réu foi advertido verbalmente por um dos policiais, que, ante a sua desobediência, atirou para o alto. Mesmo assim, o acusado continuou investindo contra a vítima, tentando lhe acertar com a faca. Os policiais tiveram que contê-lo com disparos de arma de fogo, que o atingiram na perna e na região glútea. Porém, mesmo atingido, o réu continuou tentando acertar a vítima com golpes de faca. Só parou, finalmente, após ser contido pelos policiais militares.

Ordem pública

O juiz que decretou a prisão registrou também que o réu já fora condenado por furto e porte ilegal de arma de fogo. A pena, de quatro anos de reclusão, havia sido convertida em restritiva de direitos e prestação de serviços comunitários, tendo ele sido colocado em liberdade na data da sentença condenatória.

Para o juiz, “a atitude demonstra que [o réu] não possui responsabilidade, compromisso com a Justiça, sendo certo que em liberdade continuará a delinquir, o que causa descrédito à Justiça, sensação de impunidade e, assim, sua prisão mostra-se necessária para acautelar o meio social”.

Fundamentação

Para o ministro Napoleão Nunes Maia, a prisão cautelar foi justificada de forma suficiente. A decisão do juiz fundou-se na necessidade de garantia da ordem pública e para assegurar a aplicação da lei penal, dada a periculosidade do réu. O risco estaria bastante demonstrado no modo de execução da conduta ilícita, praticada na presença de policiais militares, além da existência de condenações anteriores, por furto e porte de arma.

Conforme o relator, esses fundamentos são idôneos para a decretação da prisão. “A preservação da ordem pública não se restringe às medidas preventivas da irrupção de conflitos e tumultos, mas abrange também a promoção daquelas providências de resguardo à integridade das instituições, à sua credibilidade social e ao aumento da confiança da população nos mecanismos oficiais de repressão às diversas formas de delinquência”, concluiu.

Processo: HC 178362



Fonte: Superior Tribunal de Justiça

Investigação pelo MP

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello negou recurso ordinário em Habeas Corpus (RHC 83492) que pretendia anular investigação feita pelo Ministério Público do Rio de Janeiro. Em sua decisão, o ministro ressaltou que “o Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade própria, investigação de natureza penal”.

O pedido de anulação foi feito pela defesa do empresário JCE, que responde por crime de corrupção ativa (suborno) por supostamente contribuir para um fundo destinado ao pagamento de propinas a funcionários públicos no estado.

No recurso apresentado ao Supremo, a defesa argumentou que o MP do Rio de Janeiro teria agido como polícia ao instaurar inquérito criminal e oferecer denúncia contra o empresário. De acordo com os advogados, o ato deveria ser considerado nulo desde o início.

Decisão

Fundamentado em jurisprudência do STF, especialmente em decisões da Segunda Turma da Corte, o ministro Celso de Mello destacou que, apesar de a presidência do inquérito policial caber à autoridade policial, nada impede que o órgão da acusação penal (Ministério Público) possa solicitar, à Polícia Judiciária, novos esclarecimentos, novos depoimentos, ou novas diligências, sem prejuízo de poder acompanhar, ele próprio, os atos de investigação realizados pelos organismos policiais.

Celso de Mello ressaltou ainda que “a atuação do Ministério Público no contexto de determinada investigação penal, longe de comprometer ou de reduzir as atribuições de índole funcional das autoridades policiais - a quem sempre caberá a presidência do inquérito policial - representa, na realidade, o exercício concreto de uma típica atividade de cooperação, que, em última análise, mediante requisição de novos elementos informativos e acompanhamento de diligências investigatórias, além de outras medidas de colaboração, promove a convergência de dois importantes órgãos estatais (a Polícia Judiciária e o Ministério Público) incumbidos, ambos, da persecução penal e da concernente apuração da verdade real”.

O ministro lembrou, no entanto, que nem o Ministério Público e nem a Polícia Judiciária estão autorizados a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao suspeito e ao indiciado, que não mais podem ser considerados meros objetos de investigação. “O indiciado é sujeito de direitos e dispõe, nessa condição, de garantias legais e constitucionais”, destacou.

Ele também ressaltou que a pessoa investigada tem o direito assegurado de ter acesso a toda informação já produzida e formalmente incorporada aos autos como provas, pois tais informações podem servir para sua própria defesa.

Ao concluir que a investigação por parte do Ministério Público reveste-se de integral legitimidade constitucional, o ministro negou o recurso para considerar válida a investigação promovida pelo Ministério Público fluminense.

Esse caso envolveu extensa investigação criminal promovida pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro contra chefes do crime organizado, delegados de polícia e outros agentes policiais, supostamente envolvidos em práticas como corrupção ativa e passiva.

Envolvido na investigação, o empresário teve negada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro alegação quanto à nulidade da investigação conduzida pelo Ministério Público - decisão que foi posteriormente confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça e contra a qual foi impetrado o RHC 83492 no Supremo.

Fonte: Supremo Tribunal Federal

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Antecipação de prova testemunhal

O mero risco de esquecimento dos fatos não serve de argumento para antecipação de prova testemunhal em caso de processo suspenso por falta de citação do réu. A decisão é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Para os ministros, essa alegação é genérica e não demonstra de forma concreta a necessidade da antecipação. Por isso, gera constrangimento ilegal ao acusado.

A Justiça do Distrito Federal havia determinado a suspensão do processo e a coleta dos testemunhos da vítima e testemunhas mencionadas na denúncia, de forma antecipada. Para o julgador inicial, “se a produção dessa prova for postergada ao momento em que o denunciado for localizado e comparecer a juízo, corre-se o risco de que os fatos se percam na memória dessas pessoas, com prejuízo para a apuração da verdade”.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) confirmou o entendimento. “A procrastinação na coleta dos depoimentos contribuirá para a imperfeição da prova, em detrimento do princípio da verdade real”, afirmou o tribunal local. “Em crimes cujas provas são predominantemente testemunhais, a lembrança dos fatos é extremamente importante. Nada mais razoável que sejam de pronto colhidas, já que evidente a possibilidade de esmaecerem”, completou.

Urgência genérica

No entanto, para a ministra Laurita Vaz, o Código de Processo Penal (CPP) autoriza a produção antecipada de provas apenas quando sejam consideradas urgentes diante do caso concreto. Para a relatora, a alegação abstrata de que a prova testemunhal é sempre urgente, em razão do risco de fragilização ou perda com a passagem do tempo, não serve como justificativa para a hipótese.

“A afirmação de que a passagem do tempo propicia um inevitável esquecimento dos fatos, se considerada como verdade absoluta, implicaria a obrigatoriedade da produção antecipada da prova testemunhal em todos os casos de suspensão do processo, na medida em que seria reputada de antemão e inexoravelmente de caráter urgente, retirando do juiz a possibilidade de avaliá-la no caso concreto”, explicou.

A ministra ressaltou que o tema foi recentemente sumulado pelo STJ. O caso se enquadraria na situação prevista pela Súmula 455, que afirma: “A decisão que determina a produção antecipada de provas com base no artigo 366 do CPP deve ser concretamente fundamentada, não a justificando unicamente o mero decurso do tempo.” RHC 24964

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Redução da pena pelo trabalho

Tramita na Câmara o Projeto de Lei 6977/10, do deputado Carlos Bezerra (PMDB-MT), que disciplina a redução da pena de presidiários com a prestação de serviços, a chamada remissão, e determina os benefícios trabalhistas a que eles terão direito. A proposta altera a Lei de Execução Penal (7.210/84).

Segundo o texto, o trabalho do preso garantirá a eles os seguintes direitos:

- remuneração,

- férias, após 12 meses de trabalho, que equivalem a 15 dias de redução da pena,

- 13º salário, que poderá ser alternado com 15 dias de redução da pena,

- contribuição previdenciária e

- hora-extra, com um dia de remissão a cada oito horas-extras.

"O trabalho é, em essência, aliado à educação, o melhor instrumento para a recuperação de quem cometeu o crime. Mas esse instrumento tem sido pouco ou mal utilizado pelos que administram o cumprimento das penas", disse o deputado. Para ele, o projeto, ao disciplinar o regime de trabalho dos presos, vai estimular a prática nos presídios do País.

Tramitação

O projeto tramita apensado ao PL 704/95, do ex-deputado Ricardo Izar, que também trata do trabalho nos presídios. Ambos serão examinados na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Se aprovados, seguem para o Plenário.

Fonte: Câmara dos Deputados Federais

Ausência de fundamentação

Por falta de fundamentação concreta no decreto de prisão, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus a fim de que acusado que atropelou e matou dois homens aguarde o julgamento em liberdade. Os ministros da Quinta Turma seguiram o voto da relatora, ministra Laurita Vaz, que impôs ao réu o compromisso de comparecimento a todos os atos do processo e entrega da carteira de habilitação.

Em novembro de 2008, após sair de uma festa, o acusado, professor de educação física, atropelou dois homens que andavam de bicicleta. Com medo de ser linchado pela população, o motorista procurou ajuda num quartel próximo ao local do acidente. Testemunhas afirmam que o réu dirigia em alta velocidade, fazendo zigue-zague, e que ele só não fugiu do local do acidente porque seu carro tinha quebrado.

Preso em flagrante, ele confessou a ingestão de cervejas e energético. O teste do bafômetro, feito mais de sete horas após o acidente, registrou a concentração de 0,15 miligramas de álcool para cada litro de ar expelido dos pulmões. Não foi realizado o exame clínico de embriaguez, tampouco o carro foi periciado, já que a população ateou fogo no veículo sem ao menos ter sido feito laudo de acidente de trânsito.

A primeira instância, ao pronunciar o professor, alegou que na fase processual bastariam os indícios da autoria, sendo a certeza necessária apenas na condenação. E, ao negar o direito ao recurso em liberdade, afirmou que a necessidade de prisão preventiva persistiria em razão da garantia da ordem pública e para resguardar a aplicação da lei penal, pois o acusado reside fora do distrito da culpa. Também em razão de o crime ter causado clamor público, a liberdade poderia provocar descrédito ao Poder Judiciário.

O Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) manteve a decisão da juíza, deixando para que o Tribunal do Júri - juiz natural da causa - fizesse melhores indagações.

No pedido ao STJ, a defesa alegou ausência de dolo e ilegalidade no teste do bafômetro - já que a garantia do aparelho estava vencida há quase dois anos, interferindo em seu correto funcionamento, além do que teriam sido coletados apenas 300 mililitros de ar, quando o volume mínimo para um exame confiável é de um litro e meio de ar. Foi pedido o trancamento da ação penal, por ausência de justa causa, e a liberdade, ou, alternativamente, que fosse declarada a nulidade do processo, desde o recebimento da denúncia. Também foi solicitada a retirada das provas supostamente ilícitas.

Voto

A ministra Laurita Vaz afirmou que o habeas corpus não é uma via adequada para que seja analisada a falta de caracterização do dolo eventual, o erro na tipificação do crime e a ilegalidade na produção da prova de embriaguez. Mas, também, não considerou ter sido demonstrada fundamentação concreta para a prisão.

Para a relatora, não houve comprovação da periculosidade do acusado, que é primário e portador de bons antecedentes. A ministra disse que o fato de ele residir em cidade diferente daquela em que está sendo processado não justifica a prisão preventiva.

Os demais ministros da Quinta Turma acompanharam o voto da relatora. HC 162678

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

Síndrome do pânico

Homem portador de síndrome do pânico, condenado a 20 anos de prisão por latrocínio, em regime inicial fechado, não poderá cumprir a pena em prisão domiciliar. Essa foi a decisão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que seguiu o voto do relator, ministro Napoleão Maia Filho, que considerou que a doença pode ser tratada no próprio estabelecimento prisional.

No pedido de habeas corpus, a defesa alega que o paciente sofre de doença grave - síndrome do pânico - e que é inviável o seu tratamento dentro de estabelecimento prisional, requerendo, assim, o reconhecimento do direito de cumprir pena em regime de prisão domiciliar.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) já havia negado o pedido, afirmando que o paciente já está recebendo a medicação necessária para o tratamento e que a prisão em residência particular somente é permitida aos que estiverem em regime aberto, sendo incompatível em regime semiaberto ou fechado.

No voto, o ministro Napoleão Maia Filho ressaltou que está correto o entendimento do TJMG no sentido de que, não sendo inviável o tratamento do paciente no estabelecimento prisional em que cumpre a pena, aplica-se à hipótese dos autos o disposto no artigo 117 da Lei n. 7.210/1984, que autoriza a concessão de prisão domiciliar apenas para condenados maiores de 70 anos, acometidos de doença grave, mulheres com filho deficiente físico ou mental, menor de idade ou gestante.

O relator reiterou ainda que a jurisprudência tem admitido a concessão de prisão domiciliar a condenados em regime fechado somente em situações “excepcionalíssimas”, quando comprovada a impossibilidade da assistência médica no estabelecimento prisional em que cumpre a pena.

No caso julgado, não foi demonstrada essa impossibilidade, já que, na eventualidade de necessidade de tratamento médico externo, há a possibilidade de o condenado obter permissão para sair do estabelecimento mediante escolta. HC 173928

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

Carnaval no xadrez

O ministro Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal (STF), indeferiu liminar no Habeas Corpus (HC 106701), impetrado pela defesa do presidente da escola de samba carioca Unidos de Vila Isabel, Wilson Vieira Alves, mais conhecido como Moisés. Sua prisão preventiva foi decretada no último dia 23 de abril depois de investigação da Polícia Federal para desbaratar a chamada “máfia de caça-níqueis”, com atuação nos municípios de Niterói e São Gonçalo (RJ). De acordo com a denúncia do Ministério Público Federal (MPF), Moisés seria o “homem de frente” da banca do jogo de bicho no tocante às máquinas caça-níqueis nestes dois municípios.

No STF, a defesa de Wilson Vieira Alves alegou excesso de prazo na instrução criminal, dado que ele está preso há mais de 230 dias. Seus advogados argumentam que estaria havendo desrespeito ao Plano de Gestão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estabelece prazo máximo de 105 dias para a prisão provisória. Outro argumento utilizado foi o de que o tratamento conferido ao denunciado ofende os princípios da razoabilidade, proporcionalidade, presunção da inocência, devido processo legal e razoável duração do processo. Além disso, as premissas que embasaram seu decreto de prisão seriam “inverídicas”, segundo seus advogados.

A defesa pediu a imediata expedição de alvará de soltura e garantiu que, solto, Wilson Vieira Alves comparecerá a todos os atos processuais designados pelo juiz da causa (4ª Vara Federal de Niterói). Mas, de acordo com o ministro Ayres Britto, não há, de imediato, os pressupostos que autorizam a concessão dessa medida. “E a primeira dificuldade que encontro está na consideração da firme jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal no sentido da inadmissibilidade de impetração sucessiva de habeas corpus, sem o julgamento definitivo do HC anteriormente impetrado”, disse Ayres Britto.

Tanto no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (com sede no Rio de Janeiro), quanto no Superior Tribunal de Justiça (STF), foram indeferidas liminares em habeas corpus para que Wilson Vieira Alves respondesse ao processo em liberdade. Segundo o ministro Ayres Britto, o exame de eventual excesso de prazo na prisão processual deve ser feito em cada caso concreto, observando peculiaridades, como a quantidade de réus e testemunhas, a complexidade do processo e o comportamento dos advogados dos acusados, que não podem retardar a causa.

“Peculiaridades que, no caso concreto, não se me afiguram favoráveis ao acatamento das alegações defensivas, até porque os autos dão conta de que foram denunciadas 38 pessoas no bojo da ação penal a que o paciente responde. A sinalizar, então, que se trata, em linha de princípio, de causa complexa”, afirmou o ministro em sua decisão. O Habeas Corpus, originariamente distribuído por prevenção ao ministro Gilmar Mendes, foi enviado ao gabinete do ministro Ayres Britto por força do inciso I do artigo 38 do Regimento Interno do STF, já que o ministro Gilmar Mendes não estava em Brasília e trata-se de medida urgente.

Processo relacionado: HC 106701

Fonte: Supremo Tribunal Federal

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Efeitos da condenação

A condenação penal por fato cometido por servidor público em atividade causa a perda do cargo mesmo que já esteja aposentado. A decisão é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em caso que trata da condenação de policial militar condenado a sete anos de reclusão por roubo qualificado.

O ex-policial cometeu o crime, juntamente com outros seis réus, em 29 de outubro de 2002. Em 4 de novembro, foi reformado e aposentado por invalidez. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) afastou o efeito de perda do cargo público em razão da condenação. O Código Penal prevê esse resultado para réu condenado a mais de quatro anos de privação de liberdade.

A ministra Laurita Vaz negava o pedido do Ministério Público Federal (MPF). Para ela, o Código Penal é taxativo quanto aos casos de perda do cargo, e não abrangeria os servidores inativos. Mas o ministro Gilson Dipp entendeu de forma diversa. Seu voto prevaleceu entre os ministros da Turma.

De acordo com o ministro, na data do crime o policial encontrava-se em exercício regular do cargo cuja perda foi declarada pela sentença penal. “Cuida-se, pois, de perda do cargo, não de cassação da aposentadoria. A aposentadoria é um fato posterior, já irrelevante e que pode vir a ser atingida no caso de perda do cargo sem qualquer ofensa a direito”, completou o ministro Gilson Dipp.

Segundo o ministro, o efeito de perda do cargo seria administrativo, ainda que atribuída por lei ao juízo criminal. Nessa linha, seu efeito seria similar ao da perda do cargo em razão de sentença civil por infração disciplinar. A jurisprudência civil seria consolidada nesse caso e plenamente aplicável. Resp 914405

O ministro concluiu afirmando que a decisão não incide em interpretação extensiva ou analógica de lei penal, mas apenas conjuga as normas pertinentes ao tema.

Fonte: Superior Tribunal Justiça

Embriaguez ao volante

Serão definidos pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) quais meios de prova são legítimos, além do bafômetro, para a caracterização do estado de embriaguez do motorista. A uniformização da jurisprudência deverá ocorrer com o julgamento do Recurso Especial 1.111.566, do Distrito Federal. A tese foi considerada repetitiva e submetida ao regime do artigo 543-C do Código de Processo Civil (CPC). Assim, estão suspensos todos os processos nos tribunais de segunda instância que discutam o mesmo assunto, até que o entendimento seja uniformizado.

O recurso especial foi interposto pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). O pedido é para que seja reformada a decisão em habeas corpus que trancou ação penal contra um motorista de Brasília que dirigia supostamente bêbado.

Segundo observou o relator desembargador do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), a antiga redação do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) exigia apenas que o motorista estivesse sob influência do álcool, sem indicar quantidade específica, sendo capaz de atender à exigência um simples exame clínico.

Na decisão que trancou a ação, ele lembrou que a Lei n. 11.705/2008 incluiu na redação do artigo a concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas ou três décimos de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões. Ao concluir pelo trancamento da ação penal, ele considerou que a prova técnica é indispensável para a comprovação, só podendo ser aferida com o uso do chamado bafômetro ou com o exame de dosagem etílica no sangue.

“O legislador procurou inserir critérios objetivos para caracterizar a embriaguez, mas inadvertidamente criou situação mais favorável àqueles que não se submeteram aos exames específicos. A lei que pretendia, com razão, ser mais rigorosa, engessou o tipo penal”, afirmou. “Se a lei é mais favorável, retroage para tornar a conduta atípica”, acrescentou ao trancar a ação penal.

Recurso

Insatisfeito, o MPDFT recorreu ao STJ, sustentando violação dos artigos 43, I, e 157, ambos do Código de Processo Penal (CPP), e do artigo 306 do CTB. Segundo afirmou, a inclusão - efetivada pela Lei n. 11.705/08 ao artigo 306 do CTB - de concentração equivalente a seis decigramas de álcool por litro de sangue não significa, de forma alguma, abrandamento da norma penal.

Para o MPDFT, criou-se, na realidade, apenas maior dificuldade para comprovação fática daquilo que está contido na denúncia. “Afinal, afigura-se legítima a recusa do suspeito a soprar o etilômetro ou fornecer sangue para a alcoolemia”, observou. “Legítima, na verdade, mas, em hipótese alguma, condicionadora da atuação punitiva estatal”, ressaltou o representante do MPDFT no recurso.

No STJ, o órgão ministerial alega que é perfeitamente possível a comprovação do estado de embriaguez por outro meio idôneo - “no caso, o já realizado exame clínico por perito médico, que, com métodos cientificamente comprovados e com o uso das regras de experiência, pode atestar, com segurança, se o examinado encontra-se com concentração de álcool no sangue superior ao indicado na lei penal”, acrescentou.

Repetitivo

O ministro Napoleão Maia Filho, relator do caso na Quinta Turma, decidiu submeter o julgamento à Terceira Seção, colegiado que reúne também os ministros da Sexta Turma, para definir a questão. Determinou, ainda, a suspensão de todos os processos nos tribunais de segunda instância que discutam o mesmo assunto, até que o entendimento seja uniformizado.

Como determina a Resolução n. 08/STJ, todos os ministros da Terceira Seção e os presidentes dos tribunais de Justiça de todos os estados e dos tribunais regionais federais serão comunicados da decisão de afetar o julgamento à Terceira Seção, em regime de repetitivo.

Em seguida, o Ministério Público Federal (MPF) deverá emitir parecer sobre o caso. Só, então, o recurso será julgado.

Fonte: Superior Tribunal Justiça

sábado, 18 de dezembro de 2010

Tráfico de drogas - medicamento irregular

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) declarou competente o Juízo Federal da 1ª Vara Criminal de Dourados (MS) para julgar uma tentativa de envio de 600 cápsulas de medicamentos para Portugal. O remetente do pacote interceptado pelos Correios foi indiciado pelo crime previsto no artigo 273 do Código Penal, relativo à distribuição e fornecimento de medicamento irregular. A Terceira Seção do STJ entendeu que ficou configurada, no caso, a internacionalização de tráfico de drogas e, por isso, a ação deve ser processada pelo juízo federal.

O investigado responde por postar nos Correios, em 8 de abril de 2009, sem registro e sem selo de importação, as drogas Fluexetina, Femproporex e Clordiazepam. O conflito de competência foi suscitado pelo Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal de Dourados (MS). À Justiça estadual cabe o julgamento quando não há interesse da União na lide.

O artigo 273 do Código Penal prevê punição para quem falsificar, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), não teria como se afirmar que os medicamentos eram oriundos de importação, pois não tinham o devido registro. O órgão recomendou a remessa do processo para a Justiça estadual, já que a conduta de exportar não estava tipificada no artigo 273, parágrafo primeiro, do Código Penal.

Para a relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, o resultado - entrega das substâncias para Portugal - não foi obtido, embora esse fosse o destino do pacote. Para a configuração da internacionalização do delito de tráfico de drogas, segundo ela, não se exige que a substância ultrapasse os limites territoriais, bastando que a execução do crime tenha se iniciado no Brasil.

A ministra também constatou que as substâncias apreendidas são elencadas como drogas pela Portaria SVS/MS n. 344/1998, do Ministério da Saúde, que lista substâncias sujeitas a controle especial. O artigo 66 da Lei n. 11.343/2006 ampliou o universo de drogas proibidas, referindo-se não apenas aos entorpecentes, mas às substâncias que se entendem prejudiciais à saúde pública.

Por fim, a relatora esclareceu que o enquadramento é provisório, sendo que ao final das investigações o MPF definirá na denúncia qual o tipo penal a ser atribuído à conduta. CC 112306

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Princípio da insignificância

A Segunda Turma do Supremo Tribunal (STF) negou nesta tarde (14) Habeas Corpus (HC 104401) em que a Defensoria Pública da União (DPU) pedia a aplicação do princípio da insignificância a um crime de furto cometido por três civis em residência de um cabo do Exército.

Segundo informações do processo, foram apreendidos na casa dos acusados um aparelho de videocassete, um rádio, um micro system e uma espingarda cartucheira calibre 20. “Não estou considerando insignificantes todos esses objetos e estou denegando (o habeas corpus)”, afirmou a relatora do habeas, ministra Ellen Gracie.

De acordo com a denúncia, os acusados foram presos em flagrante, no dia 23 de maio de 2004, pela suposta prática de furto realizado em residência localizada na Base de Selva do Guaramandi, no Assentamento Boa Vista, em Itinga, no Maranhão. A área pertence ao 50º Batalhão de Infantaria de Selva.

Fonte: Supremo Tribunal Federal

Extinção de punibilidade

Os ministros que compõem a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) entenderam que ação arquivada em razão de certidão de óbito falsa deve voltar a tramitar. O Código Penal (artigo 107, inciso I) estabelece que a morte do agente extingue sua punibilidade.

A questão foi analisada pela Turma no Habeas Corpus (HC) 104998, impetrado por Ivanildo Canuto Soares, no qual questionava decisão que o pronunciou por dois homicídios, na forma qualificada. Por maioria dos votos, a Turma negou o pedido.

No dia 15 de janeiro de 1998, ele e outros corréus teriam tirado a vida de duas vítimas, C.M.S. e M.M.C.J. Conforme a denúncia, uma motocicleta passou no local com duas pessoas que efetuaram disparos de arma de fogo contra as vítimas, que estavam em um carro. A defesa alega que nenhuma das oito testemunhas ouvidas imputa os fatos ao seu cliente, portanto sustenta que não foi possível relacionar o acusado ao cenário do crime.

A tese do acusado estava baseada em dois pontos. Os advogados buscavam anular o processo em razão de pretérita declaração de extinção de punibilidade, baseada em uma uma certidão de óbito de Ivanildo. Posteriormente, verificou-se que a certidão era falsa e o processo voltou a tramitar. A defesa também alegou que inexistiriam provas ou indícios suficientes à pronúncia de seu cliente.

As vítimas, policiais civis, foram mortas por terem detido um dos integrantes da quadrilha supostamente liderada pelo réu, Ivanildo, que comandava o tráfico ilícito de entorpecentes em uma favela, onde o crime foi cometido. De acordo com a delegada responsável pelo caso, Ivanildo Canuto Soares era o chefe do tráfico de drogas no local.

Voto do relator

O relator do HC, ministro Dias Toffoli, indeferiu o pedido. Ele se posicionou com base na teoria da existência jurídica, no sentido de que só tem incidência jurídica aquilo que existe de fato.

Portanto, Toffoli destacou que as questões que não existem para o mundo jurídico e, sequer para o mundo dos fatos, “podem ser desconsideradas e não há sobre elas sequer o trânsito em julgado”. O ministro citou vasta teoria jurídica nesse sentido, além de jurisprudência da Corte que já julgou, em precedentes, casos como esse, isto é, de certidão falsa de óbito em ação penal.

“A jurisprudência tem-se orientado no sentido de que, prevalecendo nessa fase da pronúncia o princípio in dubio pro societate [cabe ao júri popular a análise da questão] o réu somente deixará de ser submetido a julgamento do júri se inexistente o crime ou se não houve indícios de sua participação no fato”, disse o relator. No caso em análise, Toffoli verificou que tanto o magistrado de primeiro grau como o da Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo sustentam a existência de indícios bastantes que justificam o julgamento do acusado pelo juízo natural do Tribunal do Júri.

“Contrariar essa afirmação implicaria em evidente necessidade de análise esmiuçada de prova coligida, não sendo o habeas corpus sede adequada para essa finalidade”, explicou. Para o ministro Dias Toffoli, “sobejam nos autos, ainda, indicativos de que o paciente [Ivanildo] é um dos maiores traficantes da Zona Leste da capital do estado de São Paulo, tendo sido inclusive preso no ano de 2008 no estado do Mato Grosso pela prática de tráfico internacional de 22 quilos de cocaína, logrando, contudo, mais uma vez furtar-se ao cumprimento do mandado de prisão expedido contra a sua pessoa”.

Divergência

Ficou vencido o ministro Marco Aurélio, que deferia a ordem, ao considerar que houve a extinção da punibilidade. “Certo ou errado foi prolatada uma decisão e, no campo penal, nós não temos a revisão criminal contra o envolvido. Então, se teria, na verdade, o crime de falso e não mais o homicídio”, entendeu.

Processo relacionado: HC 104998

Fonte: Supremo Tribunal Federal

Reintegração social

Estimular à reinserção social de presos egressos do sistema penitenciário resgatando sua auto-estima através do trabalho remunerado e digno e, consequentemente, contribuir para a redução da criminalidade com a plena recuperação dos condenados, além de sensibilizar a sociedade acerca das condições vividas pelos reeducandos. Com essa proposta o juiz Pedro Paulo de Oliveira, diretor do Foro de Barro Alto, estabeleceu um convênio com o município para que fossem adotadas medidas que facilitassem e agilizassem a reintegração social dos presos locais. A principal medida foi oferecer aos reeducandos, sob a orientação da Lei de Execução Penal, um trabalho remunerado na prefeitura, com disponibilização de uniformes e direito à salário mensal. “No País não temos ainda uma convênio nesse sentido. Este projeto tem como objetivo maior gerar ocupação e renda para detentos, além de combater o envolvimento com a cultura carcerária, especialmente no que diz respeito às drogas e ao ócio. Trabalhamos a recuperação dessas pessoas através do resgate da auto-estima dos detentos, da disseminação de valores positivos tais como consciência trabalho coletivo, transparência, honestidade e disciplina”, pontuou.

Segundo Pedro Paulo, que já foi delegado e conhece de perto a realidade do sistema carcerário, a decisão de implantar um projeto de âmbito social voltado para a recuperação dos detentos foi tomado após um tempo de estudo sobre a situação caótica que assola as cadeias públicas e às condições desumanas à que eles são submetidos. “A reintegração do presidiário à sociedade esbarra em vários obstáculos, que inviabilizam qualquer esforço institucional de recuperação do indivíduo infrator. Nessa luta é preciso contar não apenas com uma estrutura carcerária eficiente, capaz de proporcionar ao preso uma capacitação mínima de subsistência ao ser liberto, mas também, com o apoio da sociedade e dos poderes constituídos. O Judiciário também tem sua parcela de responsabilidade social”, ponderou.

Entre as obrigações do município de Barro Alto, previstas no convênio, estão a disponibilização de 20 vagas ao Poder Judiciário local para as funções de serviços gerais nos órgãos da administração pública municipal, além de uniforme padronizado, transporte e alimentação aos reeducandos participantes do projeto; utilização de métodos e equipamentos de trabalho que sejam seguros e não envolvam riscos para a saúde dos apenados; fornecimento de todo o equipamento e roupas de proteção pessoal para o desempenho das suas atividades laborais.

A prefeitura também deverá manter meios seguros para o acesso aos lugares de trabalho; tratamento respeito e digno com os participantes do projeto; abrir conta bancária para todos os reeducandos; efetuar pagamento através de depósito individual até o 5º dia útil do mês subsequente àquele trabalhado e ajuda de custa no valor de ¾ do salário mínimo; fiscalizar e relatar mensalmente ao Judiciário local, sob o aspecto meramente administrativo, a frequência, jornada de trabalho e execução dos trabalhos daqueles inseridos no projeto. Já o Judiciário local terá de selecionar os reeducandos participantes do projetos de acordo com os critérios previstos na Lei de Execução Penal (Lei nº 7210/84), solicitar às polícias civil e militar acompanhamento de segurança em todas as etapas dos trabalhos dos reeducandos; aplicar o instituto da remissão nos termos da referida lei e cumprimento da norma àquele que cometer falta disciplinar no exercício laboral do projeto.

Sobre o convênio

Para a celebração do convênio (nº 001/010) foram levados em consideração pontos como a situação das prisões, que não apresentam condições adequadas para a integração social do condenado, conforme prevê a Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84), além de provocar reincidência e o aumento das taxas de criminalidade; o descrédito na pena de prisão e sua falência em termos de medidas retributivas e preventivas; a aplicação efetiva da Lei de Execução Penal, que visa humanizar o cumprimento das penas, viabilizando a reinserção social do indivíduo; a falta de conhecimento da sociedade de que o sistema penitenciário é apenas um elo que vai desde a prática do crime até a recuperação da pessoa que o praticou; o esforço concentrado dos poderes constituídos e da própria sociedade em recuperar o indivíduo; o trabalho remunerado como instrumento eficaz para dar dignidade ao reeducando.

Fonte: Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

Maria da Penha

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) aprovou há pouco, em caráter conclusivo, o Projeto de Lei 4367/08, da deputada Elcione Barbalho, que estabelece que o namoro configura relação íntima de afeto para os efeitos previstos pela Lei 11.340/06, conhecida como Lei Maria da Penha. O projeto segue agora para análise do Senado, caso não haja recurso para votação pelo Plenário da Câmara.

Essa lei garante, no atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, que a polícia ofereça proteção à vítima, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário; encaminhe-a ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal; forneça transporte a ela e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida; e, se necessário, acompanhe-a para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar, informando a ela os direitos garantidos pela lei e os serviços disponíveis.

O relator, deputado Regis de Oliveira (PSC-SP), votou pela constitucionalidade, juridicidade e boa técnica legislativa.

Fonte: Câmara dos Deputados Federais

Combate ao racismo

Acompanhando a Recomendação nº 11 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o Conselho Nacional do Ministério Público recomendou às unidades do Ministério Público a criação de promotorias especializadas no combate ao racismo e à discriminação racial. Conforme o voto do relator, conselheiro Achiles Siquara, o Conselho ressalvou que cada MP deve considerar condições como o respeito à Lei de Responsabilidade Fiscal.

A decisão foi tomada no exame do Pedido de Providências 1005/2009-04, apresentado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República. O relator fez um levantamento nas unidades do MP e verificou que hoje apenas o MP da Bahia conta com uma promotoria especializada, ainda que outros tratem da questão em outras promotorias. Os MPs deverão enviar ao Conselho informações sobre o cumprimento da recomendação no prazo de 120 dias.

O Plenário também decidiu incluir no planejamento estratégico do CNMP a atuação nacional no combate à discriminação. Em processo anterior - o pedido de providências n. 1285/2009-12, instaurado a partir de ofício da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e relatado pelo conselheiro Bruno Dantas -, o Conselho já havia enviado ofício ao procuradores gerais destacando a importância do combate à discriminação.

Fonte: Conselho Nacional do Ministério Público

Flagrante preparado

Não ocorre flagrante preparado quando a atividade policial não provoca o cometimento do crime ou induz a ele. No caso da venda de produtos prejudiciais à saúde pública, a mera guarda do artigo ilícito com o objetivo de vendê-lo já consuma o crime. O entendimento é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

O réu foi preso com 124 ampolas de anabolizante por policial que se passou por usuário da substância. Para a defesa, o flagrante teria sido preparado, o que levaria à anulação de todo o processo, à inexistência de provas e à atipicidade da conduta.

Mas, para a ministra Laurita Vaz, a nulidade não existiu. Segundo ela, a atitude do policial não levou a vítima a praticar o crime previsto no artigo 273, parágrafo 1º-B, incisos I, III e V, do Código Penal. A descrição do delito prevê várias ações, e a conduta ilícita se configura com a prática de qualquer delas.

Para a relatora, o mero depósito do produto para venda já consumaria o crime. Mesmo que o ato de venda do anabolizante incorra em flagrante preparado, o delito de manter o produto depositado para comercialização já tinha sido consumado antes, concluiu. RHC 23416

Fonte: Superior Tribunal de Justiça

O valor da academia

O sucesso do sistema ITCMD Fácil está fazendo escola no Estado. No início desse mês, a inovação criada pela SEF foi tema de monografi a da acadêmica em Direito Roberta Freitas, da Faculdade Uniban, sob o tema “A incidência do ITCMD no Divórcio”. O professor Julio Cesar Marcellino Jr., que é doutorando em Direito e atua na Consultoria Jurídica da SEF, participou da banca. De acordo com ele, a acadêmica dedicou parte expressiva de sua pesquisa para enaltecer a importância e o sucesso da ferramenta. O ITCMD Fácil despertou também o interesse do Ministério Público do Estado de Santa Catarina. Por meio do Centro de Apoio Operacional da Ordem Tributária (COT), coordenado pelo promotor de Justiça Rafael de Moraes Lima, o MP solicitou mais informações sobre a questão do “valor venal” dos imóveis a serem tributados pelo ITCMD, que não é o constante na tabela das prefeituras, mas sim o valor médio de mercado, como está previsto na legislação. De acordo com o coordenador do ITCMD Fácil, Luiz Carlos Mello, o MPSC solicitou à Fazenda informações adicionais para instruir os Promotores que precisam opinar em Juízo, nos casos de inventários judiciais.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Direito penal de trânsito

O juiz em substituição na comarca de Cumari, Hugo Gutemberg Patiño de Oliveira, absolveu José Vieira de Oliveira, acusado de homicídio culposo contra João Justino Filho, em um acidente de carro. No dia 31 de dezembro de 2005, José dirigia um caminhão branco, marca volvo, no sentido Catalão (GO) - Uberlândia (MG), quando as duas rodas do último eixo traseiro se desprenderam do veículo ocasionando a colisão com um carro da faixa contrária, que transitava normalmente em sua mão de direção. Devido a gravidade do impacto, a vítima morreu no local.

Segundo laudo de vistoria, a ausência de peças (porca, trava, aranha, roela lisa e rolamento) no eixo do caminhão sugere que as rodas saíram porque uma porca se soltou. O Ministério Público alegou que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do denunciado que negligenciou os cuidados mínimos na manutenção do veículo.

Por sua vez, o magistrado afirmou “ser impossível exigir de uma pessoa de normal diligência a fiscalização diária e perene das condições de cada elemento componente de um veículo, seja ele de grande porte ou não”. Ele acrescentou ainda que há dúvidas se houve ou não negligência ou imprudência na conservação do caminhão. “Seria necessária uma análise quanto a possibilidade de não ser imputável ao acusado a culpa do acidente”, disse Gutemberg. Sendo assim, quando as provas contidas nos autos não são suficientes para afirmar a participação do acusado no fato, impõe-se a aplicação do princípio in dubio pro reo, ou seja, na dúvida decide-se à favor do réu.

Fonte: Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

Dica de leitura: BEM, Leonardo Schmitt de. Direito Penal de Trânsito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Embriaguez ao volante - doutrina

Pessoal, segue abaixo parte da aula que ministrei na ESA-PR no início de setembro. Todos que tiverem acesso a esse ensaio devem repassá-lo ao maior número de pessoas possível. Vocês entenderão o meu pedido.

Quem quiser usar como tese de defesa tem minha permissão. Os Promotores que quiserem usar como fundamento do pedido de arquivamento da ação penal também poderão fazer. Quem quiser decidir com base no que ensinei tem carta branca.

É preciso estudar, é preciso ler. E não apenas as ementas.

É um pouco grande, mas tenho TOTAL CERTEZA que vale a leitura.

Obrigado.

_________

A tipicidade delitiva e os problemas de comprovação da materialidade delitiva
Quando tudo parece resultar esclarecido – ao menos foi nossa tentativa – eis que a descrição legal confeccionada pela Lei n. 11.705/08 ao art. 306 requer a comprovação de concentração mínima de álcool no organismo do condutor do veículo automotor. E como poderá ser comprovada a materialidade é um dos problemas mais tormentosos relacionados ao delito. Isso porque a mais relevante polêmica descortinada com a nova lei se refere ao nascimento sem vida do preceito quanto à constatação da embriaguez se o condutor do veículo automotor se negar em ceder seu corpo ou parte dele para a realização do teste de alcoolemia. Explicamos melhor.
Em sua redação anterior, para configuração do delito, não era suficiente que o agente dirigisse o veículo automotor depois do consumo de álcool, pois era necessário que estivesse sob o seu efeito, isto é, conduzisse anormalmente por estar embriagado. A norma penal, porém, não fixava o quantum de concentração de álcool por litro de sangue a fim de impor a negativa de condução. Para aferição dessa circunstância – e conseqüente tipificação delitiva, porquanto espécie de norma penal em branco – o juiz recorria ao art. 276 da Lei n. 9.503/97 que estabelecia o limite com o qual o agente estava impedido de dirigir, isto é, seis decigramas de álcool por litro de sangue ou três décimos de miligramas de álcool por ar expelido dos pulmões conforme fator de conversão decorrente da Lei Henry [1].
Este fator de conversão era aplicado, por exemplo, no Tribunal de Justiça de Santa Catarina: “pela legislação de trânsito, a concentração de 0,6 dg/l de álcool no sangue equivale a 0,3 mg/l de álcool no ar expelido pelos pulmões, ressaltando-se que as suas medições se fazem por meio de diferentes exames. O primeiro é conhecido como exame de sangue e o último por bafômetro, isto é, enquanto um se utiliza de amostra de sangue o outro é feito por meio do ar expelido pelos pulmões. Registra-se que as grandezas utilizadas a medir os índices se diferem, e como pode se observar são respectivamente decigrama por litro de sangue e miligrama por litro de ar expelido dos pulmões (Recurso criminal n. 05.027273-0, rel. Des. Solon d'Eça Neves, j. 04/10/2005).
Relevante afirmar que se o agente embriagado se negasse a realização do exame era possível suprir sua omissão por todos os meios de prova em direito admitidos. Com a redação atual, para completa tipificação também é necessário provar a concentração mínima de álcool no organismo do condutor do veículo, até porque se trata de um elemento normativo do tipo penal. Resta saber se qualquer prova em direito continua apta à aferição desta circunstância ou se há exigência dela ser obtida apenas de maneira específica, ou seja, mediante análise pericial.

3.1. A (im) possibilidade de prova testemunhal para comprovação da alcoolemia
Nesse aspecto, a primeira pergunta necessária a enfrentar é saber se é possível recorrer à prova testemunhal para fins de caracterização da materialidade delitiva? Essa discussão é a tônica em todas as Instâncias Estaduais de Controle, conforme se poderá observar dos precedentes favoráveis e contrários, pois vejamos exemplificativamente.
Favoravelmente podemos citar:
“Apelação crime. Embriaguez ao volante. Absolvição sumária. Art. 397, inciso III, do Código de Processo Penal. Ausência de teste de alcoolemia. Descabimento. Determinando o prosseguimento do feito. Descabe a absolvição sumária do réu sob o argumento de que o fato narrado na denúncia não constitui crime pela ausência de teste de alcoolemia. Embora a prova da existência do crime previsto no art. 306 da Lei n. 9.503/97, observada a redação da Lei n. 11.715/2008, deva ser feita, preferencialmente, por meio de perícia, tal pode ser suprida, pelo teste etilômetro (bafômetro) ou exame clínico e, mesmo, pela prova testemunhal” (TJRS, 2º C. Crim., Apelação criminal n. 700.316.657-97, rel. Desª. Marlene Landvoigt, j. 29/06/2010, DJ 28/07/2010).
“Habeas corpus. Homicídio culposo na direção de veículo automotor e embriaguez ao volante. Trancamento da ação penal. Aventada ausência de justa causa. Impossibilidade de análise aprofundada de provas na via eleita. Possibilidade de aferição da conduta delituosa prevista no art. 306 da Lei n. 9.503/97 por outros elementos que não o bafômetro. Fundamentação sucinta na decisão de recebimento da denúncia. Ausência de ilegalidade. Constrangimento ilegal não evidenciado. Ordem denegada” (TJPR, 1ª C. Crim., Habeas corpus n. 683.038-2, de Cambé, Rel. Juiz conv. Luiz Osório Panza, j. 08/07/2010).
“Crime de embriaguez ao volante. Art. 306 da Lei n. 9.503/97. Necessidade de dar interpretação hermenêutica à Lei n. 11.705/2008, para atender aos seus próprios fins. Ausência de teste do bafômetro. Estado etílico que pode ser demonstrado por outras provas. Recurso ministerial provido. Ao operador do direito, atento as incongruências do legislador, outra solução não resta do que lançar mão da hermenêutica jurídica para decifrar a vontade da lei em face da realidade do país e da necessidade de impor mais rigor aos infratores das normas de trânsito” (TJSC, 2ª C. Crim., Apelação criminal n. 2009.007530-3, de Seara, rel. Des. Irineu João da Silva, j. 19/05/2010).
Ainda é possível encontrar decisão que, além de autorizar a comprovação da materialidade do delito por prova testemunhal, aplica um direito penal pessoal, pois afirma que para configuração do tipo penal configurado na lei de trânsito não é exigida concentração mínima de álcool no sangue, bastando que a conduta humana tenha sido praticada sob a influência de substância alcoólica ou de efeitos análogos. Nessa linha:
“Apelação crime. Dirigir sem habilitação. Embriaguez ao volante. Irresignação defensiva. Pretendida absolvição por ser atípica a conduta do acusado. Impossibilidade. Conduta evidenciada pelo conjunto probatório. Imprudência comprovada. Autoria e materialidade devidamente comprovadas. Está caracterizada a conduta descrita no art. 306 do Código de Trânsito se comprovada influência de álcool ou substância de efeitos análogos no agente, não sendo necessária a determinação do quantum desta substância no sangue. Estado de embriaguez é circunstância que, por si só, expõe a dano potencial a saúde de outrem” (TJMT, 2ª C. Crim., Apelação criminal n. 2943/2010, de Água Boa, rel. Des. Gérson Ferreira Paes, j. 10/03/2010).
Como “advogar” um direito penal pessoal acarreta fatalmente uma aplicação antidemocrática das normas penais, passamos diretamente a análise dos precedentes dos Tribunais Sulistas, pois todos, sem exceção, mencionam decisão do Superior Tribunal de Justiça que está servindo como paradigma no que diz respeito à possibilidade de se valer de prova diversa à pericial. Valho-me do texto da ementa em que se verifica que a embriaguez pode ser aferida por outros elementos, inclusive prova testemunhal.
Assim: “Recurso ordinário em habeas corpus. Tipicidade. Crime de trânsito. Embriaguez ao volante. Art. 306 da Lei n. 9.503/97. Recusa ao exame de alcoolemia. Inviabilidade da pretensão de trancamento da ação penal pela ausência de comprovação de que preenchido o elemento objetivo do tipo. Concentração de álcool do sangue. Desnecessidade de realização de exame específico para aferição do teor de álcool no sangue se de outra forma se puder comprovar a embriaguez. Estado etílico evidente. Parecer ministerial pelo desprovimento do recurso. Recurso desprovido” (STJ, 5ª Turma, Recurso em habeas corpus n. 26.432/MT, rel. Min. Napoleão Nunes Mais Filho, j. 19/11/2009, DJ 22/02/2010).
Lançando um olhar não apenas à ementa da decisão – como é a praxe na prática forense – mas ainda ao corpo do acórdão, vê-se que o Ministro relator expressamente aderiu ao parecer ministerial, porquanto o considerou irrepreensível. Transcrevemos o respectivo parecer: “não subsiste a alegação de que a falta de realização de exame de alcoolemia induz à atipicidade, pois a jurisprudência desse Eg. STJ tem admitido a comprovação da materialidade do delito por outros meios de aferição da embriaguez”. Na seqüência a Subprocuradora faz citação, para ilustrar sua tese, de outro julgado em que foi decidido que “a recusa do condutor do veículo legitima os agentes de trânsito à realização de outro tipo de prova para se verificar a presença de notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor, resultantes do consumo de álcool. Este outro tipo de prova é o Auto de Constatação de Embriaguez, realizado através da observação do comportamento do condutor apreendido” (STJ, 5ª Turma, Recurso em habeas corpus n. 20.129/MT, rel. Min. Gilson Dipp, j. 24/04/2007, DJ 04/06/2007).
Posto isto, entendemos necessário realizar um esclarecimento: por evidente não há vedação em se valer, como forma de decidir, do parecer ministerial, salvo quando a proposta apresentada é totalmente equivocada, como no presente caso. Infere-se que a representante ministerial se valeu de um precedente do Superior Tribunal de Justiça que faz menção a um texto de lei já não mais vigente quando da apresentação do parecer. A Subprocuradora, valendo-se de julgado da Corte Superior – a decisão do Min. Gilson Dipp –, continuou atribuindo existência e eficácia a um texto já modificado (em 2008) em um parecer emitido em 2009.
Para tocar com as mãos o que estamos tentando demonstrar passemos a leitura do preceito antes da última reforma legislativa específica. O art. 277, § 2º com a redação da Lei n. 11.275/2006 apresentava o seguinte conteúdo: “no caso de recusa do condutor à realização dos testes, exames e da perícia previstos no caput deste artigo, a infração poderá ser caracterizada mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas pelo agente de trânsito acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor resultantes do consumo de álcool ou entorpecentes, apresentados pelo condutor”. Observem: o teor deste preceito é que balizou a fundamentação da decisão do Min. Gilson Dipp no julgado utilizado pela Subprocuradora e que teve parecer acatado – porque irretocável – segundo o Min. Napoleão Nunes Maia, servindo a decisão deste como modelo perante os citados Tribunais Sulistas.
Mas depois da promulgação da Lei n. 11.705/08 a redação do art. 277, § 2º se refere de forma expressa somente à infração administrativa de embriaguez ao volante. Atentem: “a infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor”. Com a referência taxativa ao art. 165 da Lei n. 9.503/97 o legislador impediu a aferição da embriaguez para fins de comprovação do delito do art. 306 do Código de Trânsito por qualquer outra prova em direito admitida. Isso, ao menos, com base nesse preceito. Em síntese, não é mais possível valer-se de uma interpretação extensível nos moldes da antiga redação. A atual redação do art. 277, § 2º da Lei n. 9.503/97 somente vale para a infração administrativa de embriaguez ao volante.
Síntese: não será mais possível suprir a omissão do condutor que se negar a realizar o teste pericial com base no art. 277, § 2º da Lei n. 9.503/97 com a promulgação da Lei n. 11.705/08, porque esta regra não tem cabimento para a infração criminosa de embriaguez ao volante (art. 306). Repetimos: se possível valer-se da prova testemunhal, outro fundamento legal deverá balizar a sua incidência.
Redobremos nossa atenção. A fundamentação lançada no acórdão da lavra do Min. Napoleão Nunes Maia não é distante a que perfilhou o Min. Felix Fischer em caso anterior verificado no Mato Grosso do Sul. Por considerarmos relevante passamos a ilustração. Entendendo que não havia prova da materialidade do delito do art. 306 da Lei n. 9.503/97, pois seu cliente não foi submetido à realização do exame de alcoolemia para demonstrar que no momento do fato a concentração de álcool no seu sangue era maior que a prevista na lei, o defensor impetrou uma ordem de habeas corpus.
O indeferimento se processou nestes termos: “Habeas corpus. Conduzir veículo sob o efeito de álcool. Preliminar. Via inadequada. Prefacial que confunde com mérito. Pedido de trancamento da ação penal. Indícios de autoria e de materialidade. Matéria fática. Inadmissibilidade análise. Constrangimento não caracterizado. Ordem denegada. Havendo, em princípio, indícios de autoria e prova da materialidade, ainda que feita por testemunhas, nos termos do art. 277, § 2º do CTB, com a redação que lhe deu a Lei n. 11.275/2006, não há falar em trancamento da ação penal por falta de materialidade” (TJMS, 1ª Turma Crim., Habeas corpus n. 2009.001854-7, rel. Des. Gilberto Castro, j. 17/02/2009).
O relator apenas não se ateve a um detalhe: a regra do art. 277, § 2º da Lei n. 11.275/2006 não mais vigia no momento da ocorrência dos fatos – conforme destacado: dia 28/11/2008 – porque em junho do mesmo ano a Lei n. 11.705 alterou a redação daquele preceito. Assim, nenhum parâmetro diverso ao da prova pericial poderia ser utilizado para aferir a materialidade. As demais provas passaram a ser admitidas apenas para comprovação da infração administrativa de embriaguez ao volante (art. 165). Logo, o constrangimento ilegal que já era evidente tornou-se ainda maior. Conseqüentemente houve a proposição de novo habeas corpus e com idêntico resultado: indeferimento.
Decidiu o Superior Tribunal de Justiça: “[...] Processual penal. Habeas corpus. Art. 306 do CTB. Alegação de ausência de justa causa para a persecução penal. Comprovação da embriaguez. Exame de alcoolemia não realizado por ausência de equipamentos na cidade. [...] Para a comprovação do crime do art. 306 do CTB, o exame de alcoolemia apenas pode ser dispensado nas hipóteses de impossibilidade de sua realização (inexistência de equipamentos necessários na comarca ou recusa do acusado a se submeter ao exame), quando houver prova testemunhal ou exame clínico atestando indubitavelmente (prontamente perceptível) o estado de embriaguez. Nestas hipóteses, aplica-se o art. 167” (5ª Turma, Habeas corpus n. 132.374, rel. Min. Felix Fischer, j. 06/10/2009, DJ 16/11/2009).
É evidente que o Tribunal ad quem não observou o erro de fundamentação do Tribunal a quo. Ademais, em nosso sentir, praticou outro equívoco. Infere-se que o exame de alcoolemia não foi realizado por falta de equipamentos hábeis, mas porque houve exame visual os julgadores decidiram pela presença da prova da materialidade do crime e, portanto, denegaram a ordem. Para nós a análise é simples: o Tribunal pode ter desfavorecido duplamente o impetrante, pois, primeiramente, conforme os expertos, “é sabido existirem pessoas que sofrem sérios transtornos, tanto somáticos quanto mentais, por influência de baixa alcoolemia, sem correspondência a um estado de embriaguez” [2] e, em segundo lugar, inexistindo o aparelho de bafômetro nada impedia a realização de exame pericial colhendo uma amostra de sangue. Por conseguinte, o Tribunal Superior negou efetividade ao teor do art. 306 do Código de Trânsito.
Sabe-se que diante da suspeita de condução irregular em razão da ingestão de álcool deve o agente de trânsito ou o policial, civil ou militar, cientificar o condutor da possibilidade de se submeter ao exame pericial. No entanto, sua negativa é lícita porque ninguém está obrigado a produzir provas em prejuízo próprio. Este princípio, previsto no Pacto de San José da Costa Rica (art. 8º, II, g), ainda não teve seu significado aniquilado pelo Supremo Tribunal Federal, devendo ser tratado como uma garantia fundamental de todos os cidadãos.
Assim: “Habeas corpus. Constitucional. Impossibilidade de se extrair qualquer conclusão desfavorável ao suspeito ou acusado de praticar crime que não se submete a exame de dosagem alcoólica. Direito de não produzir provas contra si mesmo. [...] Nemo tenetur se detegere. É certo que, ao contrário do afirmado na denúncia, não se pode presumir que o paciente estaria alcoolizado pela recusa em se submeter ao exame de dosagem alcoólica: a Constituição da República impede que se extraia qualquer conclusão desfavorável àquele que, suspeito ou acusado de praticar alguma infração penal, exerce o direito de não produzir prova contra si mesmo [...]” (Habeas corpus n. 93.916-3/PA, rel. Min. Carmen Lúcia, j. 10/06/2008).
Entretanto, no precedente jurisprudencial da Corte Catarinense outrora referido, o Desembargador relator, acompanhado por unanimidade por seus pares, afirmou que considerar imprescindível o exame pericial para aferição da tipicidade do crime do art. 306 da Lei de Trânsito seria atentar contra vários princípios do processo penal brasileiro e, inclusive, a lógica. Para fundamentar a decisão, valeu-se o intérprete da doutrina de Fernando Capez e os seguintes dizeres: a ausência do teste de bafômetro e do exame de sangue não afasta a possibilidade de comprovação da ebriedade por outros meios, pois é sabido que podem ser supridos pelo “exame clínico feito pelo médico, que atesta ou não o estado de embriaguez, verificando o comportamento do sujeito através de sua fala, seu equilíbrio, seus reflexos, etc. na falta desses exames, a jurisprudência tem admitido a prova testemunhal” [3]. E particularmente complementou: “e, isso, salvo melhor juízo, mesmo após a edição da Lei n. 11.705/2008” para afirmar ao final: “donde se conclui, na linha esboçada pela doutrina, que, fiel ao que prescreve o art. 291 do Código de Trânsito Brasileiro, aplicando-se aos crimes de trânsito as normas gerais do Código de Processo Penal, nas infrações que deixam vestígios, indispensável o exame de corpo de delito (art. 158), mas sendo ele impossível, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta (art. 167).
A negativa do condutor na realização do exame pericial não pode ser suprida simplesmente com a aplicação do art. 167 da Lei Adjetiva, segundo o qual “não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta”. Não obstante a Lei de Trânsito contemple a aplicação subsidiária das normas processuais (art. 291, caput), o preceito remetido deve ser interpretado com absoluta reserva para que o exame de corpo de delito não seja substituído indevidamente pela prova testemunhal, principalmente em casos de falha do próprio sistema (ausência de etilômetro). Ademais, sobre a desídia do condutor em não se submeter à perícia e a sua impossibilidade de substituição pela prova testemunhal, doutrina Heráclito Mossin que “verifica-se pelo texto legal que a prova testemunhal apresenta-se como expediente meramente supletivo para a comprovação do exame de corpo de delito, somente sendo admissível quando for impossível a perícia por impedimento legal ou por fato absolutamente invencível. Se a inspeção não pode ser realizada porque por incúria da pessoa interessada ou da própria autoridade a quem incumbia produzir a prova os vestígios desapareceram, não pode essa inspeção ser substituída pela prova testemunhal, pois não se verifica na espécie fato absolutamente invencível” [4].
O que atenta contra a lógica é tentar buscar uma equiparação entre a prova testemunhal e a prova pericial. Aguardamos algumas respostas: cada agente de trânsito equivale a quantos decigramas de álcool por litro de sangue? Quantos policiais são necessários para aferir o percentual alcoólico? Qualquer perito, por mais competente, apenas em um olhar, sendo decididamente responsável, jamais conseguirá atestar se a concentração de álcool no organismo do agente alcança o nível de intensidade exigida no texto legal. Como afirmar, livre de imprecisão, que o condutor está com sete ou cinco decigramas de álcool por litro de sangue? Em sendo assim, que justiça é essa em que o condutor que estiver bem perante o policial, mas com taxa de álcool superior a permitida em lei continuará em liberdade, mas aquele que pouco bebeu e se apresenta tonto por qualquer circunstância ou mesmo pela bebida, pode ser preso em flagrante?
Atentem que com a modificação do Código de Trânsito, o imprescindível passou a ser a comprovação do quantum de álcool presente no sangue do condutor. No entanto, erroneamente, considerável parcela da Magistratura e do Ministério Público vale-se da prova testemunhal para comprovar o que não é exigido legalmente, ou seja, a influência do álcool no comportamento do condutor.
Isso sem contar a contradição de depoimentos, conforme o próprio Tribunal de Justiça de Santa Catarina decidiu: “Apelação criminal. Crime de trânsito. Teste do bafômetro inexistente. Impossibilidade de comprovação do estado de ebriedade do motorista através de prova indireta, porque, na espécie, há apenas o depoimento de um policial, que não corrobora com as demais testemunhas ouvidas em juízo. Materialidade do crime não comprovada. Absolvição que se impõe” (TJSC, 1ª C. Crim., Apelação criminal n. 2007.053271-1, de Xaxim, rel. Des. Rui Fortes, j. 26/10/2009).
E destacamos uma última consideração: a doutrina utilizada no presente acórdão apresenta-se desatualizada. É suficiente reparar o ano de sua edição. Transcorrida mais de uma década e, em seu intervalo, verificada uma reforma legislativa, seria pertinente o seu esquecimento. Assim, o “salvo melhor juízo” é a parte a ser considerada no acórdão, pois o próprio defensor da tese – ressalte-se, correta antes da reforma legislativa – não mais sustenta sua proposição. Numa entrevista à Carta Forense, questionado sobre a limitação de decigramas para configuração do tipo penal, respondeu: “no momento em que o nível de alcoolemia (seis decigramas de álcool por litro de sangue) foi inserido como elementar do tipo incriminador, tornou-se imprescindível a comprovação cabal dessa dosagem sob pena de atipicidade da conduta. O nível de álcool, por se tratar de medida técnica, necessita de demonstração pericial. Em outras palavras, não se consegue extrair o exato nível de alcoolemia mandando o agente ‘fazer o quatro’ ou ‘dar uma andadinha’. A Lei fala em seis decigramas de álcool por litro de sangue, tornando imprescindível, perdoe-me a redundância, o exame de sangue. Não há como substituir essa prova. O certo é que a prova testemunhal será incapaz de suprir o exame de corpo de delito e qualquer outro exame pericial, que não meça diretamente a concentração de álcool por litro de sangue, tornando dúbia a presença da elementar de natureza objetiva, imprescindível para a configuração do fato típico” [5].
E nessa linha de entendimento destacamos outros julgados:
“Habeas corpus. Embriaguez ao volante. Mero exame clínico genérico. Falta de materialidade. Trancamento da ação penal por justa causa. O tipo penal do art. 306 do CTB exige a comprovação da concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas. O mero atestado médico genérico onde consta ‘hálito etílico no momento do atendimento médico, sugerindo consumo alcoólico. Sugiro nível etílico sérico para confirmação’, embora apto para comprovação da infração administrativa de trânsito, não é suficiente para identificar o teor de concentração de álcool no organismo do motorista superior a seis decigramas, tal como é exigido na descrição da conduta típica. Falta de justa causa para a ação penal. Concederam a ordem. Unânime” (TJRS, 3ª C. Crim., Habeas corpus n. 70037253119, Capão da Canoa, rel. Des. Odone Sanguiné, j. 22/07/2010, DJ 30/07/2010) [6].
“Embriaguez ao volante. Nova redação do art. 306 da Lei n. 9.503/97, que exige concentração de no mínimo 0,6 decigramas de álcool por litro de sangue, a qual só é aferível por meio de exame pericial, o qual não foi realizado. Lei que retroage porque benéfica ao apelante. Inexistindo prova da materialidade, de rigor a absolvição” (TJSP, 1ª C. Crim., Apelação criminal n. 990.08.196386-8, rel. Des. Ericson Maranho, j. 13/08/2009) [7].
“Recurso crime em sentido estrito. Decisão que rejeita a denúncia. Embriaguez ao volante (art. 306 do CTB). Ausência de prova da concentração de álcool por litro se sangue. Inviabilidade de prova exclusivamente testemunhal. Materialidade não comprovada. Decisão correta. Recurso desprovido” (TJPR, 2ª C. Crim., Recurso crime n. 635506-6, Foz do Iguaçu, rel. Des. Miguel Kfouri Neto, j. 22/04/2010)[8].
Ainda a majoritária jurisprudência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais: “Apelação criminal. Crime de trânsito. Embriaguez ao volante. Lei n. 11.705/08 mais benéfica ao réu. Ausência de exame técnico imprescindível para a configuração do delito. Absolvição. Apelo ministerial prejudicado. Recurso defensivo provido. A Lei n. 11.705/08 introduziu novo requisito para a configuração do crime previsto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, qual seja, a constatação exata do nível de álcool no sangue, dificultando, assim, a caracterização do crime. O condutor que não for submetido ao exame de sangue, ou ao bafômetro, não estará incurso nas iras do art. 306, pois não restará comprovada a materialidade delitiva, vez que ausente prova sobre elementar do tipo penal” (TJMG, 4ª C. Crim., Apelação criminal n. 1.0145.06.318439-7/0001, rel. Des. Herbert Carneiro, DJ 10/07/2009) [9].
Muito recentemente, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça: “Habeas corpus. Ação penal. Trancamento. Embriaguez ao volante. Ausência de exame de alcoolemia. Aferição da dosagem que deve ser superior a seis decigramas. Necessidade. Elementar do tipo. [...] 2. Com o advento da referida lei, inseriu-se a quantidade mínima exigível e excluiu-se a necessidade de exposição de dano potencial, delimitando-se o meio de prova admissível, ou seja, a figura típica só se perfaz com a quantificação objetiva da concentração de álcool no sangue o que não se pode presumir. A dosagem etílica, portanto, passou a integrar o tipo penal que exige seja comprovadamente superior a seis decigramas. Ordem concedida” (STJ, Habeas corpus n. 166.377/SP, rel. Min. Og Fernandes, DJ 01/07/2010).
Destacou o relator que a circunstância da quantidade de álcool é uma elementar objetiva do delito que deve ser necessariamente demonstrada por prova pericial e, por conseguinte, não se admite prova indireta ou exame de corpo de delito supletivo. Em termos: “a figura típica só se perfaz com a quantificação objetiva da concentração de álcool no sangue” e isso, parece-nos evidente, não se pode presumir. Por isso repetimos: uma coisa é afirmar que a pessoa está influenciada pelo álcool e outra coisa é dizer a específica quantidade de álcool para fins de comprovação da materialidade. Na esteira do relator, a dosagem etílica passou a ser componente do tipo, sendo que a ausência de comprovação por meio de prova pericial – exame técnico – impossibilita precisar a concentração de álcool [10].
E do Supremo Tribunal Federal em decisão monocrática: “O tipo previsto no art. 306 do CTB requer, para sua realização, concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas por litro de sangue. Parece-me evidente que a imputação delituosa há de ser feita somente quando comprovado teor alcoólico igual ou superior ao previsto em lei. Ora, não tendo sido realizado o teste do ‘bafômetro’, falta, obviamente, a certeza de satisfação desse requisito, necessário, repita-se, a configuração típica” (STF, Habeas corpus n. 100.472, rel. Min. Eros Grau, j. 27/09/2009).
Pelo exposto, frisamos que a comprovação da materialidade delitiva por parte do representante ministerial não pode ser feita por meio de utilização de uma prova testemunhal nos termos da decisão do Superior Tribunal de Justiça que está servindo de modelo de consulta por parte dos Tribunais Estaduais. Ademais, de nada adianta a invocação dos princípios processuais se na colheita de provas a acusação transgride preceitos constitucionais. Assim, a nosso ver, a existência material do fato só poderá ocorrer por meio de exame pericial, sob pena de implicar em nulidade processual.
Cássio Honorato, contudo, integrante do Ministério Público do Estado do Paraná apresentou uma nova tese. Considerando às milhares de mortes em razão de eventos de trânsito propôs a flexibilização do direito do condutor não produzir provas contra a sua pessoa e frisou que as argumentações doutrinárias de primeira hora de que a incidência da punição penal estaria afastada diante da negativa do agente em se submeter ao exame pericial devem ser desconsideradas [11]. Neste contexto sugeriu uma dupla tipicidade na redação do art. 306 da Lei n. 9.503/97, ou seja, a presença de dois crimes na nova redação do tipo penal e comprovados de formas diversas. Vejamos mais detidamente.
Seguindo sua orientação ficará comprovada a materialidade da primeira parte do tipo (até o termo decigramas) por meio do exame de sangue para aferir a concentração mínima de seis decigramas de álcool no tecido sangüíneo ou por meio do bafômetro para constatar concentração mínima de três décimos de miligramas de álcool por litro de ar expelido dos pulmões. Sobre a aplicabilidade da prova pericial teceremos alguns comentários na seqüência do ensaio. Nesse momento prendemos a atenção no inusitado.
O Promotor resolveu inovar destacando que a segunda parte do dispositivo deve ser interpretada de maneira extensiva, para incluir na expressão ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine a dependência, o próprio álcool. Assim, entende que caso o condutor do veículo se negue à realização do exame pericial, o crime pode ser caracterizado pela adequação da conduta à segunda parte da redação, pois o agente estava sob a influência de álcool que, por sua vez, também é considerada substância psicoativa que causa dependência e, por conseguinte, qualquer prova em direito admitida poderá ser utilizada para comprovação, pois no caso não é necessária uma dosagem mínima [12].
Por evidente não há palavras avulsas na lei. Quando o legislador utilizou na segunda parte do tipo penal o termo outros por evidente não quis abranger o álcool, porém justamente o contrário, isto é, enaltecer drogas psicoativas diversas. Ademais, o ordenamento jurídico é conjunto de normas harmônicas e o que o Promotor sustenta é uma desarmonia normativa, pois como tratar a mesma situação de forma diversa? Aliás, decidiu o Tribunal do Paraná: “por outro aspecto, não se pode proceder à interpretação extensiva da norma – ‘ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência’ – que ilustra o art. 306 do CTB. Isso porque, além de analogia in malam partem, o legislador foi específico quanto ao álcool, determinando a quantidade necessária para caracterização do delito” (TJPR, 2ª C. Crim, Recurso criminal n. 635506-8, de Foz do Iguaçu, rel. Des. Miguel Kfouri Neto, j. 22/04/2010).
Nem sempre em direito penal valem os argumentos das autoridades, mas, por vezes, a autoridade dos argumentos, mesmo de primeira hora. Não existem duas normas penais na redação do artigo. Antes de inovar, para também tentar salvar essa infração, deveria este Promotor valer-se da instituição que representa e deflagrar uma bandeira de revogação do presente artigo e proposição de um novo texto, quiçá como o defendemos na seqüência deste trabalho.
Atualmente a infração está presente no plano da existência, mas não no plano da eficácia, pois é improvável – ou mesmo quase impossível – que alguém seja condenado nos moldes deste tipo penal. Aliás, desconhecemos qualquer pessoa que cedeu parte do seu corpo para realização do exame de sangue em mais de dez anos desta lei específica. Faz-se necessária que outra redação não estipule um limite mínimo, mas que somente destaque que o condutor esteja sob o efeito (e não com ‘bafo’) do álcool, sendo possível aferir essa circunstância simplesmente por meio de prova testemunhal.
Por que não é prudente prever um grau mínimo de concentração etílica? Porque assim apenas a prova pericial alcançaria um resultado seguro sobre a embriaguez, sendo impossível equipar aquela a eventual prova testemunhal. Nossa proposta surpreende aos mais críticos, porque é justamente o inverso da atual, isto é, afastamos a prova pericial para contemplar como meio hábil a prova testemunhal, primeiro por ser mais justa, pois antes era possível o condutor do veículo automotor encontrar-se bem para dirigir, mas ter ultrapassado a concentração mínima permitida, o que caracterizaria o crime, e, em segundo lugar, por ser mais segura, porque sendo insuficiente o consumo prévio de álcool, a prova testemunhal será útil para atestar situação de risco proibido criado pelo condutor sob o efeito do álcool. Claro que será necessário a não divergência entre os depoimentos prestados para que essa prova adquira total relevância. Mas essa possível – e até provável divergência – é passível de acontecer em todo processo penal e, por isso, não pode ser óbice a sua aceitação. Além disso, defendemos que a influência do álcool na condução do veículo passe a ser considerada qualificadora dos delitos culposos de trânsito (homicídio e lesão corporal), elevando de forma automática o limite mínimo e o máximo destes crimes quando da aplicação da pena-base.
Enquanto isso não ocorre, analisamos a comprovação da materialidade delitiva por meio da prova pericial, mormente, a (in) constitucionalidade do bafômetro.
3.2. A comprovação da materialidade do delito por prova pericial
Ponto pouco discutido na doutrina [13] e ainda esquecido nos Tribunais Estaduais e Superiores se refere à inconstitucionalidade da utilização do bafômetro para aferição do estado de alcoolemia. O parágrafo único do art. 306 da Lei n. 9.503/97, com redação dada pela Lei n. 11.705/08, determina que “o Poder Executivo federal estipulará a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo”. Como efeito, foi editado o Decreto n. 6.488, em junho de 2008, que prevê no art. 2º a equivalência entre seis decigramas de álcool por litro de sangue e três décimos de miligrama por litro de ar expelido pelos pulmões.
Entendemos existir três marcantes inconstitucionalidades com esta construção. Primeira: “ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei” (art. 5º, II). Lei em sentido estrito, isto é, como resultado do processo legislativo e não da atuação do Poder Executivo. Assim, apenas a título de exemplo, pois inúmeros os precedentes, entendemos incorreto o teor de decisão do Tribunal de Justiça Catarinense: “[...] Diante da vigência da Lei n. 11.705/08, que alterou o texto do art. 306 do Código de Trânsito brasileiro, o teste em aparelho de ar alveolar pulmonar – etilômetro – conhecido como bafômetro, faz-se imprescindível para a comprovação da materialidade do delito, não podendo ser suprido por outros meios de prova” (TJSC, 2ª C. Crim., Apelação criminal n. 2009.064582-5, da Capital, rel. Desª. Marli Mosimann Vargas, j. 08/02/2010).
Há quem possa argumentar que algumas matérias são absolutamente relevantes para a tutela de determinados bens jurídicos – em especial à disponibilidade da vida e/ou da integridade física – e, assim, a remissão a modalidades inferiores de atos normativos não implicaria uma violação do princípio da reserva legal, ainda que provenientes de fontes distintas. Isso por evidente é correto, porém apenas para normas penais em branco, como a lei de drogas. Recorrer ao que algum setor da doutrina denomina de “administrativização da norma penal” [14] só é possível se o juiz necessita lançar mão de outra norma para preencher um tipo penal o que, sem sombra de dúvidas, não é o caso do atual art. 306 da Lei n. 9.503/97.
Ademais, ainda que atualmente se exija a mesma concentração de álcool que antes da reforma legal, isto é, a concentração prevista na antiga redação do art. 276 da Lei n. 9.503/97, o atual tipo incriminador fala apenas de concentração de álcool no sangue. Como a equivalência tem relação com os fins criminais, é evidente que aceitar que o parágrafo único configura um tipo incriminador seria atentar contra o princípio da legalidade. Sob essa fundamentação, em julgado de primeiro grau, o togado catarinense declarou “a invalidade do bafômetro como meio de prova hábil para caracterizar a materialidade do caput, que prescreve como crime seus decigramas de álcool presentes no tecido sanguíneo” (Autos de ação penal n. 023.06.387369-1, da Capital, rel. Juiz Alexandre Morais da Rosa, j. 27/08/2009).
Já destacamos que não deveria ser previsto nenhum tipo de concentração ou de quantidade de álcool na redação legal em razão da dificuldade de se realizar a prova, mas como assim procedeu, também cumpria ao legislador destacar expressamente no tipo penal o quantum de álcool expelido pelos pulmões necessário a caracterização do delito. Aliás, são poucos os que observaram outra inconstitucionalidade, pois a questão probatória foi remetida ao Poder Executivo sendo que, com uma simples leitura da Carta Constitucional, depreende-se que a competência para legislar sobre matéria processual é exclusiva do Poder Legislativo (art. 22, I). É suficiente para exemplificar: “ao enrijecer o próprio tipo penal inserindo na norma penal incriminadora o grau de concentração de álcool por litro de sangue, o legislador limitou qualquer procedimento de ampliação típica. Mas, ainda que se admitisse uma extensão, tal somente poderia ser realizada por quem detém a legitimidade constitucional para tanto, em decorrência natural do princípio da reserva legal. Dito de outra forma, o legislador não poderia conceder à Administração a absoluta liberdade para estabelecer em quais hipóteses e circunstâncias em que o tipo penal fechado poderia ser ampliado” (Autos de ação penal n. 050.09.02604-5, da Capital, rel. Juiz Marcos Zilli).
Por isto, impossível dizer que a submissão voluntária ao bafômetro é relevante para fins de prova criminal. Violações ao princípio da reserva legal, da legalidade e da separação de poderes não podem ser compensadas pelo comportamento do agente. Em termos simples: a ação do condutor em realizar o teste do bafômetro não mascara a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 306 da Lei n. 9.503/97 ainda que parte da doutrina defenda essa possibilidade e alguns Tribunais a ela se filiem como tivemos oportunidade de destacar [15].
3.3. A negativa de produção de prova em prejuízo próprio
Repetimos que o princípio de que ninguém é obrigado a agir em prejuízo próprio, previsto no Pacto de San José da Costa Rica, ainda não teve seu significado aniquilado, devendo ser tratado como uma garantia fundamental de todos os cidadãos. As teses dos Tribunais reconhecendo a inconstitucionalidade das decisões em contrário ao nemo tenetur se detegere aplicam-se perfeitamente ao caso. Aliás, segue precedente do Superior Tribunal de Justiça: “é inconstitucional qualquer decisão contrária ao princípio, o que decorre da inteligência do art. 5º, LXIII, da Constituição da República e art. 8º, § 2º, g, do Pacto de São José da Costa Rica. Precedentes” (STJ, 6ª Turma, Recurso em Mandado de Segurança n. 18.017/SP, Min. Paulo Medina, DJ 02/05/2006).
Entretanto, em estudo sob a firma de Juliana Pereira Coutinho e sua assessora [16], ambas do Departamento da Polícia Rodoviária Federal, outro enfoque foi apresentado. Aduziram que a tutela dos direitos coletivos está acima da proteção dos direitos individuais, não se confundindo e sim se sobrepondo aos aludidos direitos de presunção da inocência e proibição de auto-incriminação, isto é, que as garantias individuais (art. 8º, § 2º) devem ser limitadas se colidirem com interesses coletivos (art. 32). Concluíram pela legalidade de utilização do bafômetro e obrigatoriedade do condutor se submeter ao teste, sendo que sua recusa enseja punição pelo crime de desobediência. Este estudo foi balizado pela Advocacia Geral da União, com recomendação de Maria de Lourdes de Oliveira para que sejam alertadas as Regionais que em caso de descumprimento do teste o condutor seja enquadrado no art. 330 do Código Penal.
Destacamos: “Nota-se então que o próprio Pacto [...] pôs limitações ao exercício dos direitos por ele também previstos. Assim, o exercício de um direito fica limitado à preservação dos direitos das demais pessoas, da segurança de todos e as justas exigências do bem comum [...]”. “Não obstante a importância dos direitos fundamentais, eles não podem ser entendidos em sentido absoluto, em face da natural restrição resultante do alcance do bem comum”. “Impedir a Administração de utilizar-se dos meios disponíveis e legais para fiscalizar a situação dos condutores é tornar a Lei inócua prejudicando sua própria razão de ser, qual seja, evitar óbitos no trânsito [...]”.
Por evidente há um núcleo de autonomia individual inatacável que deveria ser sempre preservado para o exercício da dignidade humana. Ocorre que esse núcleo é mínimo nas condutas de trânsito porque na ponderação entre o interesse de liberdade civil e a proteção de bens jurídicos, prevalece o último. Tolhe-se o núcleo de liberdade imponderável, pois, embora não seja proibido beber, é proibido beber em demasia e depois se colocar na direção de um veículo, pois, assim, cria-se um risco manifesto para o bem jurídico. Existe redução da liberdade, mas com ganho social, porque reduzido o grau de domínio do agente pela ingestão de álcool, a disponibilidade da vida alheia restará em maior grau protegida.
Esse mesmo pensamento é externado no estudo acima destacado. No entanto, a intervenção na esfera privada em nome de um interesse coletivo não é automática, mas pode ser justificada. Desta forma é preciso delimitar quando isso pode acontecer. Diante deste quadro entendemos importante dizer, antes de tudo, que “a legitimidade dos fins não justifica a ilegalidade ou inconstitucionalidade dos meios cuja adoção se entenda necessária a consecução dos objetivos visados, por mais elevados, dignos e inspirados que sejam” (STF, ADPF n. 144, rel. Min. Celso de Mello, DJ 26/02/2010) ou que “não se pode tolerar violação de direito fundamental em nome do resultado” (Autos de ação penal n. 023.09.039518-5, da Capital, Juiz Alexandre Morais da Rosa, j. 26/08/2009).
Isso significa que a intervenção apenas é legítima quando realizada no limite da legalidade, entendida no aspecto processual e penal. E simultaneamente à legalidade vincula-se a idéia de proporcionalidade, pois do contrário, em nome de um interesse coletivo, até a prática da tortura será permitida. Vê-se que uma tentativa sem limites de salvar o preceito significa encobrir uma deficiência do legislador e, ao mesmo tempo, autorizar outros absurdos, pois segundo o estudo deverá prevalecer o interesse público a todo preço. Depreende-se a seguinte mensagem: legisle como bem entender porquanto o bem comum estará a sua disposição.
E sob aplausos da Advocacia-Geral da União exigiram punição pelo crime de desobediência a quem se negar a realização do teste, ignorando entendimento pacífico dos Tribunais Superiores conforme o qual o crime contra a Administração Pública não se caracteriza quando a lei prevê pena de natureza civil ou administrativa, sem ressalvar expressamente a aplicação cumulativa com a pena prevista no próprio tipo (art. 330). Do Supremo Tribunal Federal: “Habeas corpus. Crime de desobediência. Atipicidade. Motorista que se recusa a entregar documentos à autoridade de trânsito. Infração administrativa. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que não há crime de desobediência quando a inexecução da ordem emanada de servidor público estiver sujeito à punição administrativa, sem ressalva de sanção penal. Hipótese em que o paciente, abordado pelo agente de trânsito, se recusou a exibir documentos pessoais e do veículo, conduta prevista no Código de Trânsito como infração gravíssima, punível com multa e apreensão do veículo (art. 238)” (STF, Habeas corpus n. 88.452, rel. Min. Eros Grau, j. 02/05/2006).
Satisfaz a conclusão de Sylvia Steiner: “[...] decorrência lógica do princípio da presunção de inocência, o direito ao silêncio, se exercido pelo acusado, não pode gerar qualquer presunção em seu desfavor. Não se concebe um sistema de garantias no qual o exercício de um direito constitucionalmente assegurado pode gerar sanção ou dano [...]. [...] Os preceitos garantistas constitucional e convencional conduzem à certeza de que o acusado não pode ser de qualquer maneira compelido a declarar contra si mesmo, ou a colaborar com a colheita de provas que possam incriminá-lo” [17].

[1] PATARO, Oswaldo. Medicina legal e prática forense. São Paulo: Saraiva, 1976.
[2] ZACHARIAS, Manif; ZACHARIAS, Elias. Dicionário de Medicina Legal. Curitiba: Educa, 1998.
[3] MOSSIN, Heráclito Antônio. Curso de Processo Penal. São Paulo: Atlas, 1998.
[4] CAPEZ, Fernando; GONÇALVES, Victor Rios. Aspectos criminais do Código de Trânsito Brasileiro 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
[5] CAPEZ, Fernando. Jornal Carta Forense, segunda feira, 4 de agosto de 2008.
[6] Desta Instância de Controle, com idêntico posicionamento: “Habeas corpus. Crime de trânsito. Trancamento da ação penal por ausência de justa causa. Inexistência de prova técnica da concentração de álcool no sangue. Assim, inexistindo prova técnica acerca do teor alcoólico do sangue do paciente à época dos fatos, inviável a comprovação da materialidade do delito através de provas indiretas (testemunhas)” (TJRS, 3ª C. Crim., Apelação criminal n. 70030686836, de Cachoeira do Sul, rel. Des. Odone Sanguiné, j. 27/08/2009, DJ 02/09/2009). Ou: “Lei n. 9.503/97. Código de Trânsito Brasileiro. CTB. Art. 306. Embriaguez ao volante. O tipo penal em estudo refere, expressamente, o teor alcoólico a partir do qual a ação é considerada criminosa. Ausente demonstração da materialidade, cuja única alternativa é consagrada pela própria Lei, falta elemento indispensável para o regular desenvolvimento da ação penal” (TJRS, 3ª C. Crim., Apelação criminal n. 70036534303, de Porto Alegre, rel. Des. Ivan Bruxel, j. 24/06/2010).
[7] Desta Corte de Justiça, com idêntico posicionamento: “No caso vertente, o apelante não teve aferida a graduação alcoólica por litro de sangue, por meio de exame químico toxicológico ou por etilômetro, aparelho de ar alveolar conhecido como ‘bafômetro’, o que seria necessário, pois assim exige o atual Código de Trânsito Brasileiro. O laudo pericial juntado ao feito se limitou ao exame clínico a que se submeteu o apelante, sendo, portanto, imprestável para comprovar a materialidade do delito, daí por que a absolvição do apelante é medida que se impõe” (TJSP, 1ª C. Crim, Apelação criminal n.990.09.146828-2, de Cachoeira Paulista, rel. Des. Mario Devienne Ferraz, j. 19/10/2009).
[8] Deste Tribunal de Justiça, com idêntico posicionamento: “Embargos de declaração. Omissão. Acórdão que negou provimento ao recurso em sentido estrito. Rediscussão da matéria de mérito. Caráter infringente. Inadmissibilidade. Delito de embriaguez. Prova técnica. Necessidade. Os embargos de declaração não têm a finalidade de devolver a matéria para reexame visto que o efeito modificativo é excepcional e previsto apenas para os casos de manifesto equívoco no julgado. A caracterização do delito de embriaguez ao volante, tendo em vista a nova redação do art. 306 dada pela Lei n. 11.705/08, exige a quantidade igual ou superior a de 0,6 dg de álcool por litro de sangue, podendo esta somente ser aferida mediante prova técnica. Embargos rejeitados” (TJPR, 2ª C. Crim, Embargos de declaração n. 0603835-7/01, de Foz do Iguaçu, rel. Des. Noeval de Quadros, j. 18/02/2010). Ainda: “Apelação criminal. Conduzir veículo automotor, na via pública, com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência (art. 306 da Lei n. 9.503/97, alterado pela Lei n. 11.705/2008). Não comprovação do índice de teor alcoólico no sangue. Absolvição decretada. Com a nova redação do art. 306 da Lei n. 9.503/97 atualmente exige-se a concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas para a configuração do crime” (TJPR, 2ª C. Crim., Apelação criminal n. 477559-5, rel. Des. Noeval Quadros, j. 25/09/2008). “Apelação crime. Sentença condenatória. Embriaguez ao volante. Não existência de prova técnica. Exegese do art. 306 da Lei n. 9.503/97, alterado pela Lei n. 11.705/2008. Retroatividade da lei penal mais benéfica. Inteligência do art. 5º, inciso XL, da Constituição Federal. Extinção da punibilidade” (TJPR, 4ª C. Crim., Apelação criminal n. 0533118-8, de Palotina, rel. Des. Domingos Perfetto, j. 11/03/2010).
[9] Igualmente, deste Tribunal: “Apelação criminal. Art. 306 da Lei n. 9.503/97. Materialidade não comprovada. Absolvição. Inexistindo meios de comprovar a materialidade do delito previsto no art. 306 da Lei n. 9.503/97, com a nova redação dada pela Lei n. 11.704/08, é de se absolver o apelante por ausência de prova de existência do fato considerado criminoso. Provimento do recurso que se impõe” (3ª C. Crim., Apelação criminal n. 1.0349.07.017109-6, rel. Des. Antônio Carlos Cruvinel, DJ 27/05/2009).
[10] Concordamos parcialmente com esse julgamento, visto que o Ministro relator entende que a prova da concentração de álcool no organismo do condutor pode ser realizada de duas maneiras: por exame de sangue ou teste de aparelho alveolar. Nossa restrição diz respeito ao último procedimento, pois o entendemos inconstitucional.
[11] Honorato, Cássio Mattos. “Dos Crimes de Embriaguez ao Volante e as Alterações Introduzidas pela Lei n. 11.705/08”, in pós-graduação de Direito de Trânsito na Faculdade Uniban, campus São José-SC.
[12] Parte da doutrina penal afirma que no preceito se identificam duas hipóteses, mas sem a ampliação excessiva dada por Cássio Honorato. Por todos, por exemplo: Marcão, Renato. Crimes de Trânsito. São Paulo: Saraiva, 2009, para quem à persecução penal na segunda parte do artigo é imprescindível de prova pericial, sendo suficiente a produção de prova oral. E como resolver a situação na qual o agente simultaneamente se embriaga e consome drogas?
[13] Nossa contribuição: BEM, Leonardo Schmitt de. Direito Penal de Trânsito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010.
[14] SANTOS, Juarez Cirino. Direito Penal. Parte Geral. Curitiba: Lumen Juris/ICPC, 2006.
[15] MARCÃO, Renato. Crimes de Trânsito. São Paulo: Saraiva, 2009.
[16] COUTINHO, Juliana Pereira. Anexo I. Análise acerca da Legalidade do uso do Etilômetro. Ministério da Justiça. Departamento de Polícia Rodoviária Federal. Consultoria Jurídica.
[17] STEINER, Sylvia Helena de Figueiredo. A Convenção Americana sobre Direito Humanos e sua Integração ao Processo Penal Brasileiro. São Paulo: RT, 2001.