quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Dois fatos e uma pergunta...

Voltei. O exílio foi em decorrência dos estudos. Em outra postagem destacarei algumas novidades made in Itália...Agora apresento dois fatos e uma pergunta...
Fato 1:
"Maria Aparecida evita olhar para a sua imagem refletida no espelho. Faz quatro anos que a jovem paulistana saiu da cadeia, mas, nem que quisesse, conseguiria esquecer o que sofreu durante um ano detenção. Seu reflexo remonta ao ocorrido no Cadeião de Pinheiros, onde esteve presa após furtar um xampu e um condicionador que, juntos, valiam R$ 24 reais. Lá, Maria Aparecida de Matos pagou pelo seu 'crime': ficou cega do olho direito. Portadora de 'retardo mental moderado', a ex-empregada doméstica foi detida em flagrante em abril de 2004, quando tinha 23 anos. Na delegacia, não deixaram que telefonasse para a família. Foi mandada diretamente para a prisão, onde passou a dividir uma cela com outras 25 mulheres. Em surto, a jovem não dormia durante a noite, comia o que encontrava pelo chão, urinava na roupa. Passado algum tempo, para tentar encerrar um tumulto, a carceragem lançou uma bomba de gás lacrimogênio na área das detentas. Uma delas resolveu jogar água no rosto de Maria Aparecida, e a mistura do gás com o líquido fez com que o seu olho fosse queimando pouco a pouco. 'Parecia que tinha um bicho me comendo por dentro', conta. A pedido das colegas de pavilhão, que não aguentavam mais os gritos de dor e os barulhos provocados pela moça, ela foi transferida para o 'seguro', onde ficam as presas ameaçadas de morte. Maria Aparecida passou a apanhar dia e noite. 'Eu chorava muito de dor no olho, e elas começaram a me bater com cabo de vassoura' relembra, emocionada. Somente depois quando compareceu à audiência de seu caso, sete meses depois de ter sido detida, sua transferência para a Casa de Custódia de Franco da Rocha, na Grande São Paulo, foi autorizada. Lá diagnosticaram que havia perdido a visão do olho direito [...] Entrou com um pedido de haebas corpus no STJ que, em maio de 2005, concedeu à liberdade provisória à jovem, 13 meses depois de ter sido presa por causa de 24 reais [...]"
Fato 2:
"O mesmo recurso jurídico - habeas corpus - pedido pela advogada de Maria Aparecida para que respondesse o processo em liberdade foi solicitado e concedido, em 24 horas, a outra mulher. Mas um "pouco" mais rica: a empresária Eliana Tranchesi, proprietária da butique de luxo Daslu, em São Paulo, condenada em primeira instância a 94,5 anos de prisão, [...] 42 anos pelo crime de descaminho consumado (importação fraudulenta de um produto lícito)...[...]".
Por que a Justiça não pune os ricos?, texto de Tatiana Merlino, vencedora do prêmio Wladimir Herzog, na categoria "Revista" " (todo o texto...vide: http://www.rodrigoviana.com.br/ , publicado terça, 20/10/2009).
Essa é a realidade. Uma Justiça com duas velocidades. Uma primeira velocidade para os delitos tradicionais - leia-se, o furto do primeiro caso - na qual o fim é assegurar o cárcere já pela custódia cautelar e não apenas com o trânsito em julgado da decisão. E uma segunda velocidade para os crimes de colarinho branco ou rosa, pois fica mais bunitinho, para as "pessoas respeitadas", no qual o cárcere é um verdadeiro tabu, algo quase inédito, digamos, uma perspectiva a não ser ainda alcançada.

sábado, 10 de outubro de 2009

Fixação da Pena na Lei n. 11.343/06

A aplicação da pena-base é processo que passa, em regra geral, pela análise do art. 59 do Código Penal. Para as infrações da Lei de Drogas, entretanto, outras condições devem ser consideradas, preponderantemente, sobre as circunstâncias judiciais. Dispõe o art. 42 da Lei n. 11.343/06 que "o juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância, sobre o previsto no art. 59 do CP, a natureza e a quantidade da substância ou produto, a personalidade e conduta social do agente".
Não faltarão vozes a salientar que o legislador em nada inovou, mas esse não é o entendimento a seguir, porquanto a doutrina penal entende que "as circunstâncias listadas no art. 59 do CP têm pesos idênticos, de modo a nenhuma preponderar sobre qualquer outra" (Boschi, in Das Penas e de seus Critérios de Aplicação, 2002, p. 219), bandeira não erguida no preceito especial.
Assim, o termo mais importante do artigo é o substantivo feminimo preponderância, sendo que no contexto da Nova Lei possui dois sentidos, ou seja, preceder e prevalecer. Isso significa que as circunstâncias elencadas no art. 42 da Lei n. 11.343 devem ser aplicadas anteriormente e devem ser aferidas de forma mais energética às arroladas no art. 59 do Código Penal.
A presente regra tem o efeito de alterar a tendência de se aplicar pena-base no mínimo legal. Mas como proceder essa análise? Uma reflexão inicial sobre o assunto leva-me a estabelecer em relação à natureza das drogas, uma ordem de decrescente de potencialidade e periculosidade: ópio, heroína, cocaína, ckack, as drogas sintéticas (anfetaminas, ecstasy, lsd), haxixe e maconha. Quando mais prejudicial a droga maior deve ser a majoração dessa circunstância judicial.
Contudo, nosso legislador não adotou expressamente o critério matemático para diferenciar o quantum de pena-base deve ser aplicado quando da apreensão de pouca ou muita quantidade de droga. O motivo da omissão - e somente por ser um - é a dificuldade de se mensurar/distinguir num caso concreto o que se configura a posse de quantidade mínima, da posse de quantidade moderada, da posse de quantidade de relevância notória e da posse de quantidade expressiva de droga. Não veja outra solução a não ser estipular concentrações "X", "Y", "Z", ou seja, definir que até 1kg de maconha, por exemplo, a pena-base se eleve de três meses, entre 1kg e 3kg que o aumento seja de seis meses, e assim sucessivamente, bem como para todas as demais drogas. Estipular uma quantidade mínima seria mais prudente, inclusive, para realizar a distinção entre traficante e usuário. Muito simples: abaixo de 50grama de maconha, és usuário e não se discute absolutamente nada. Isso afastaria, inclusive, a aplicação dos critérios legais estipulados no art. 28, § 2º que, não obstante objetivos, são analisados subjetivamente e, assim, passíveis de gerar diferentes interpretações para idênticas situações.
Destarte, na aplicação da pena o essencial é que o magistrado, seguindo a política criminal que foi estabelecida pelo legislador, coaja mais gravemente o réu em razão, preponderantemente, da natureza da droga. E para as situações em que seja apreendidas quantidades diversas, que seja coerente para aumentar a pena de maneira proporcional.
Mas uma das questões mais importantes, pelo menos no meu sentir, é saber se o art. 42 da Lei de Drogas influencia a variação da fração correspondente ao art. 33, § 4º da Lei n. 11.343/06 quando o agente preenche simultaneamente todas as condições legais? Segundo entende a Min. Laurita Vaz, HC n. 132;106/MS, DJ 05/10/2009 a quantidade e a qualidade da droga podem conduzir a aplicação da fração no patamar mínimo. Estaria correto esse raciocínio?
O legislador ao inserir no texto do art. 42 da Lei n. 11.343/06 a expressão na fixação das penas não se refere às fases de aplicação da dosimetria, mas sim as espécies de pena cominadas pelo legislador no preceito secundário de algum crime previsto na legislação. Logo, é na pena-base e apenas nesse momento que natureza e quantidade da droga devem ser consideradas, sendo que o julgado de relatoria da Ministra viola gravemente o princípio do bis in idem, tendo em vista que a mesma circunstância estaria sendo utilizada por duas vezes. Inclusive destaquei essa idéia em artigo científico: A Causa Especial de Diminuição de Pena na Nova Lei de Drogas, Revista IOB de Direito Penal, n. 44, 2007, p. 46.
Na realidade, parece-me que há uma insatisfação no Judiciário no sentido de que não é correto que a fração de diminuição aplicada na terceira fase da dosimetria compense ou ainda ultrapasse o aumento dado quando da fixação da pena-base. Ou seja, se o magistrado aumenta a pena-base em 1 ano por conta de 10kilos de maconha apreendidos não admite diminuir a pena na terceira fase na fração de 2/3 (quando ausente qualquer circunstância desfavorável ao réu), pois entende que a preponderância da natureza e quantidade da droga seria afastada. Mas a preponderância apenas vale na primeira fase e ponto final. Por isso destaquei que a nova regra também objetiva criar uma mentalidade de maior retribuição já na fixação da pena-base.
Antes assim proceder, e ter sua decisão atacada por recurso, do que buscar camuflar a violação do princípio do bis in idem, como também já observei, isto é, ou por ignorância do texto de lei ou por absoluta má fé, juízes deixam de considerar as duas circunstâncias (quantidade e qualidade) na pena-base para considerá-las na terceira fase e, assim, desconsideram a própria aplicação da diminuição da pena. Ou seja, criam critérios extralegais para ferrar ainda mais o acusado.

domingo, 4 de outubro de 2009

Doutorado - Parte 1

No último mês recebi alguns emails pedindo que colocasse no blog algumas informações sobre o doutorado aqui em Milão. Sobre minha escolha como bolsista respondi individualmente, mas aqui repito: devo minha aceitação à generosidade do corpo docente e, especialmente, ao amigo Bruno Tannus que foi quem descobriu a possibilidade. Muita sorte! Tenho que aproveitar.

No que diz respeito aos encontros, apenas agora é possível escrever alguma coisa, pois a primeira jornada acabei perdendo em razão de ainda estar no Brasil resolvendo os últimos problemas. Assim, participei na última sexta-feira, junto com outros dez doutorandos de Milão, bem como de professores assistentes e pesquisadores desta Universidade, e ainda outros de Universidades próximas, de seminário cujo enfoque trabalhado foi o Direito Penal Substantivo Italiano frente aos julgamentos da Corte Européia de Direitos Humanos (CEDU).

Os objetivos do encontro foram dois: 1) trabalhar a oportunidade de tutela jurisdicional por parte da Corte Européia de Estrasburgo em casos de lesões aos direitos fundamentais do indivíduo não adequadamente tutelados pelo sistema penal italiano; e, 2) as 0brigações de adequação por parte de cada um dos órgãos do Estado italiano que desempenham um papel em relação à norma incriminadora em decorrência dos julgamentos da CEDU. Estes objetivos foram analisados, particularmente, em relação à temática dos limites ao uso legítimo de arma de fogo - destacando um leading case envolvendo caso italiano atualmente sob o exame da Corte de Estrasburgo (a norte do jovem Carlo Giuliani no encontro do G8 em Genova) -, mas também foram trabalhadas ulteriores temáticas de particular atualidade, como a tutela do indivíduo contra os atos de tortura e a expulsão de estrangeiros, este com análise recentíssima de julgado da Corte Européia (final de setembro).

A sistemática do encontro agradou. Cinco horas iniciais de aprofundamento teórico, com quatro doutorandos e um convidado especial (Doutor Emanuele Nicosia, Prof. Universidade de Palermo) se intercalando em apresentações orais. Pausa para a pizza do almoço. Na volta apresentei uma pequena síntese da primeira condenação do Brasil pela Corte Interamericana em decorrência de violações de ordem substantiva e processual (caso Ximenes - resumo encontra-se no blog), bem como as principais semelhanças e diferenças entre a CIDH (Costa Rica) e a CEDU (Estrasburgo). Depois o Professor da Universidade de Milão, Doutor Francesco Viganò apresentou em uma hora vários precedentes e a discussão teve seqüência com análise de casos práticos e intervenções do convidado Nicosia.

Em sete tópicos procurarei destacar o que de mais significativo foi delineado. Por evidente tive os idiomas a meu desfavor, pois oito horas de aula, intercalada entre italiano e inglês, é um pouco pesado para quem ainda se adapta. Enfim, apresento o que entendi relevante.

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01. Introdução. As relações entre Corte Européia de Direito Humanos (doravante apenas CEDU) e o direito penal substancial italiano têm sido até agora pouco estudadas pela doutrina italiana, em enorme contraste com o interesse que há muito tempo se dedica à matéria de cunho processual. Isso porque as decisões da CEDU versam basicamente sobre duas questões processuais: a) a irrazoabilidade da duração dos processos; b) o descumprimento do princípio do contraditório na formação da prova.
01.1 Um exame da recente jurisprudência da Corte, ampliada também a outros casos em que a Itália está como parte resistente evidencia, todavia, a tendência marcante da Corte estender suas decisões também ao direito penal substancial do país contraente e a estatuir, assim, princípios aplicáveis também ao ordenamento penal interno.
01.2 Disso resulta ao observador italiano ao menos dois novos horizontes de interesse: a) os advogados possuem uma nova modalidade de tutela dos direitos fundamentais do ofendido, posterior a garantia de acesso ao sistema interno nacional e não limitada, necessariamente, a possibilidade de ressarcimento pecuniário na hipótese de futura afirmação de violação dos direitos fundamentais; b) de outro lado, as orientações interpretativas da Corte põem uma série de obrigações de adequação não apenas ao sistema penal italiano, mas igualmente aos protagonistas do sistema penal, isto é, agentes de polícia, promotores, juízes e legisladores, como o fim de prevenir futuras violações, que devem agir vinculados aos princípios estatuídos nos julgamentos da CEDU.

Doutorado - Parte 2


02. Direitos fundamentais CEDU e direito penal substantivo. As diretrizes fundamentais de tutela. Do sistema de tutela dos direitos fundamentais desenhado pela CEDU e de protocolos adicionais derivam, essencialmente, duas diretrizes de tutela concernente ao direito penal: a primeira, mais tradicional, é aquela definida como “tutela dos direitos fundamentais frente ao direito penal”; a segunda, mais moderna, e por isso considerada mais problemática, é aquela que se etiqueta como “tutela dos direitos fundamentais mediante o direito penal”.

02.1. Proteção dos direitos fundamentais frente ao direito penal. Esta primeira diretriz é aquela, característica do constitucionalismo moderno, da tutela dos direitos fundamentais em razão da pena. Mesmo a pena sendo instrumento irrenunciável de defesa social, não se deve prestar a garantia do arbítrio estatal. O núcleo dessa garantia é encontrado no princípio da culpabilidade (previsto na Constituição Italiana), bem como em outras diretrizes delineadas pela CEDU, em especial ao princípio da legalidade, nos moldes delineado em qualquer Constituição moderna, isto é, do indivíduo ter o direito de saber quais condutas lhe estão proibidas anteriormente a sua prática, porém com uma ampliação às mudanças de entendimento jurisprudencial malam partem, isto é, não se pode punir o comportamento que em momento anterior ao julgamento era considerado um indiferente penal aos olhos dos magistrados.

02.1.1 Uma série de garantias também circundam a pena em si considerada. A ela também se aplica o princípio da legalidade, isto é, deve estar prevista anteriormente à prática da conduta; o princípio da humanidade também é aplicável, primeiro, vedando a imposição de pena de morte; depois, proibindo a imposição de pena com caráter aflitivo (tortura ou tratamento desumano ou degradante) e, igualmente, a limitação de pena não necessária da vida privada do condenado, o que resultou, antes da mudança legislativa de 2004, na condenação da Itália em casos de limitação de recebimento de correspondência pelos presos condenados a prisão perpétua.

02.1.2 A tutela dos direitos fundamentais frente ao direito penal também significa que uma norma penal não pode limitar liberdades fundamentais, isto é, não se pode sancionar o direito à consciência ou à religião. Em síntese é um dos vértices do princípio da lesividade ou ofensividade que é garantido de forma mais ampla pela CEDU do que pela Constituição Italiana.

02.2 Tutela dos direitos fundamentais mediante o direito penal. É, sobretudo, essa segunda diretriz que importa, pela tradição jurídica italiana, decisamente original. A idéia de fundo, emersa gradativamente nas últimas duas décadas de jurisprudência da Corte, é que o direito penal não é um instrumento de compreensão dos direitos fundamentais dos destinatários da norma (o réu, ou potencial réu), mas é, primeiramente, um instrumento de tutela dos direitos fundamentais da vítima do crime; e é um instrumento às vezes irrenunciável por parte de um Estado que deseja fazer valer a própria obrigação de tutela dos direitos fundamentais. Cabe destacar, inclusive, que em alguns julgamentos pela CEDU houve sanções aos Estados que não têm predisposto uma eficaz tutela penal de alguns direitos fundamentais por meio das normas de direito penal, deixando, desta forma, a vítima desprovida de tutela adequada, sendo que o itinerário lógico que conduzem a estas decisões pode ser assim esquematizado:

02.2.1 Qualquer Estado contraente é obrigado a assegurar, ao interno da própria jurisdição, a tutela dos direitos fundamentais reconhecidos pela CEDU e seus protocolos adicionais.

02.2.2 Do reconhecimento de um direito fundamental deriva, ao encargo dos Estados, não só o dever de abster-se de violá-lo por meio de ações dos órgãos públicos, porém também a obrigação positiva de ater-se ao fim de prevenir possíveis violações dos direitos fundamentais por parte de terceiros sendo que, no caso de verificar-se uma violação, de ater-se ao objetivo de sancionar eficazmente o autor da violação, primeiro para dissuadir os demais a não prática de ação equivalente e, segundo, para assegurar uma equânime satisfação à vítima da violação.

02.2.3 Cada Estado é livre para decidir mediante quais instrumentos assegurará a tutela dos direitos fundamentais de agressões por parte de terceiros que não respeitam o ordenamento interno. Mas releva que a tutela desses direitos seja adequada na visão da CEDU quanto aos escopos outrora evidenciados, ou seja, dissuasão dos demais para não cometimento de uma infração e garantia de satisfação da vítima.

02.2.4 Nos casos mais graves de violação dos direitos fundamentais (entre os quais estão os que atentam contra a vida humana) se deve, inclusive, considerar que a ameaça e imposição de uma pena é o único instrumento adequado para assegurar a tutela efetiva (preventiva, ou ao menos, reparatória) dos direitos violados.

02.2.5 Que o Estado pode ser igualmente responsabilizado pela violação da própria obrigação de tutela em relação à vítima da agressão por um terceiro em razão de não haver predisposto uma normativa penal idônea a prevenir e a sancionar eficazmente uma futura violação, bem como por não aplicar adequadamente as valorações da CEDU. Sobre a última passagem ainda há particular consideração: que a CEDU não somente pretende, a respeito de alguma grave violação de direito fundamental, como, por exemplo, os fatos de abuso sexual ou de redução à condição análoga a de escravo, mas também, conforme veremos, de homicídio ilegítimo por parte de operações policiais, que a legislação do Estado preveja o fato como crime, mas, e em especial nos pronunciamentos mais recentes, pretende também, que o fato concretamente resulte punível (censurando o Estado que preveja causa de justificação ou também causa de não punibilidade muito ampla ou elástica), e que a pena ameaçada e concretamente imposta resulte adequada à gravidade da infração cometida, sendo também possível mencionar que o Estado é responsável quando o autor da violação há se beneficiado da suspensão condicional da pena, ou se é condenado a uma pena relativamente baixa uma vez comparada a gravidade da infração praticada.

02.3 Uma perspectiva, assim, abrirá num plano supranacional novo caminho de tutela dos direitos fundamentais aos defensores das vítimas de crimes mais graves, bem como, solicitará uma compreensão mais séria a respeito de alguns mecanismos de indulgência previstos no ordenamento substancial italiano, os quais levam por prejudicar uma legítima expectativa da vítima do crime quanto à satisfação efetiva contra os autores da violação.

Doutorado - Parte 3

03. O objeto de análise pela CEDU. O que será impugnado perante CEDU é uma conduta concreta (ativa ou passiva) atribuída ao Estado, que é lesiva a um direito do recorrente. E a responsabilidade estatal será atribuída a uma ação de qualquer de seus órgãos ou poderes – o legislativo, o judiciário ou o executivo – inadequada em relação aos valores impostos pelo CEDU.

03.1 Ações dos órgãos do Poder Executivo. As hipóteses estatisticamente mais freqüentes são aqueles em que a responsabilidade estatal deriva de conduta de órgãos relacionados ao Poder Executivo, não necessariamente, acrescente-se, a um órgão estatal, mas também a um órgão regional ou de administração territorial autônoma, como consagra a CEDU.

03.1.1 No atinente à matéria penal, é possível que a violação decorra de uma ilegítima ação ativa – lesiva de um direito fundamental do indivíduo – por um órgão administrativo que tenha a tarefa de assegurar o direito penal, como, por exemplo, por parte da polícia ou, também, da administração carcerária, com a prática de tortura ou tratamento desumano ou degradante contra pessoa privada de liberdade, bem como de homicídios de suspeitos delinqüentes em colisão com o art. 2º da CEDU que diz respeito à proteção da vida.

03.2 Ações dos órgãos do Poder Judiciário. Uma violação ao direito fundamental também pode derivar, no todo ou em parte, de uma ação de um órgão do Poder Judiciário que, nesta hipótese, revela particular relevância em matéria penal.

03.2.1 A obrigação de efetuar um inquérito pronto e efetivo há como destinatário primário no ordenamento italiano a magistratura inquerente (no Brasil, MP). Eventual deficiência ou retardo depois da conclusão do inquérito por parte do magistrado (leia-se, aqui, promotor) competente poderá acarretar uma responsabilidade do Estado pelo inadimplemento de obrigação positiva. Isso é relevante, em especial, quando a acusação se omite (culposamente) na produção de prova necessária a propositura da inicial e, como efeito conseqüencial, acaba por acarretar a prolação de um provimento de absolvição pela aplicação do cânone in dubio pro reo, como, por exemplo, nas torturas que se verificam no sistema carcerário.

03.2.2 A responsabilidade como resultado do provimento jurisdicional. Especialmente no que se refere ao direito penal substantivo pode-se citar, como exemplo de violação de um direito fundamental, a prolação de decisão coercitiva contra conduta que é considerada albergada pela liberdade reconhecida pela CEDU. Ademais, uma violação poderá restar caracterizada por provimento que, não obstante siga uma jurisprudência consolidada pela Corte Superior, a qual, no entanto, está em desconformidade com as diretrizes consignadas pela CEDU. Esclareça-se, apenas, que o objeto de julgamento pela Corte de Estrasburgo não será a responsabilidade do juiz que prolatou a decisão, mas do ordenamento interno. Finalmente, a violação poderá ser ponderada em razão de fixação de uma pena muito baixa para caso de extrema gravidade ou da amplitude de aplicação de causas de justificação ou exculpação.

03.3 Defeito de adequação da legislatura nacional. A responsabilidade do Estado resistente ainda poderá derivar se a CEDU entender que a violação é resultado da ineficácia da própria legislação destinada à proteção do direito fundamental, como, por exemplo, não prevendo a punição penal do infrator; ou se dá aplicação da legislação por parte do Poder Executivo ou do Poder Judiciário deriva a violação (neste caso, a lei nacional seria a causa moral da violação); ou quando idêntica legislação não oferece eficaz proteção contra ataques dos órgãos públicos ou por terceiros; e, por fim, quando o Estado não modifica um eventual defeito substancial da lei – e que conduz repetidas violações – deixando de observar os postulados de proteção dos direitos fundamentais impostos pela CEDU. Em todos esses casos, como remédio subsidiário, decorre a obrigação imediata de reparação dos danos ao ofendido recorrente.

Doutorado - Parte 4

04. Exemplo dos limites ao uso de força letal por parte da polícia. Um exemplo no qual se encontra o perfil enunciado é representado pela vasta jurisprudência da Corte em matéria de uso ilegítimo de armas, mas precisamente, em matéria dos limites ao uso de uma força letal da parte das polícias em relação à exigência de tutela do direito à vida consagrada pela CEDU.

04.1 A tutela do direito à vida imposta pela CEDU. O direito de qualquer pessoa a vida está protegido pela lei. A pena de morte foi definitivamente banida entre os Estados Membros da União Européia (art. 2º). Mas não haverá violação deste direito fundamental quando a morte resulte do recurso a força, tornado absolutamente necessário: a) para assegurar a defesa de qualquer pessoa contra uma violência ilegal; b) para efetuar uma detenção legal ou impedir a evasão de uma pessoa detida legalmente; c) para reprimir, em conformidade com a lei, uma revolta ou uma insurreição (art. 2º, 2).

04.2 O recurso à Corte de Estrasburgo depende de condição, isto é, do infrutuoso resultado no julgamento interno da violação ao direito fundamental, seja pela ineficácia do inquérito por não ter a autoridade responsável aclarado o fato suficientemente pela não realização de prova necessária, seja pela falta ou pela inadequada punição do responsável, etc. E, por evidente, que tenha a violação sido realizada por um ou vários agentes de polícia.

04.3 A violação ao direito à vida (art. 2º) poderá ser substancial ou processual.

04.3.1 Violações substanciais. No que concerne a estas violações, os princípios elaborados da Corte são os seguintes: a) a absoluta necessidade de eliminar o direito à vida (nas situações que são permitidas) deve ser vista restritivamente. Deve-se analisar proporcionalmente no caso concreto o fim perseguido pela força pública e a gravidade da conseqüência provocada; b) a violação à disposição legal pode ser reconhecida ainda que a vítima não resulte morta, mas seja simplesmente exposta a um grave risco de morte em razão da conduta do agente estatal. O decisivo é o uso de força potencialmente letal, em particular a explosão da arma de fogo, e não a efetiva conseqüência da conduta; c) a violação ao direito à vida pode ocorrer de forma não intencional, quando, por exemplo, seja usada a força policial com fim intimidatório, mas desde que a vítima seja exposta a uma situação de risco de morte; d) o erro de proibição não legitima a atuação da força policial (ex. legítima defesa putativa), salvo se fundamentado em boas razões ou em circunstâncias do fato que também induziriam em erro um considerado agente estatal modelo; e) a violação poderá estar radicada num defeito de organização e de planejamento da operação por parte dos superiores hierárquicos do agente, porquanto eles têm a obrigação de assumir, em via preventiva e em cada contexto, a cautela necessária para minimizar o risco do uso de força letal durante uma operação.
04.3.1 No que se refere à definição da proporcionalidade necessária, a Corte de Estrasburgo tende a utilizar um instrumento internacional não elaborado no seio da União Européia, mas em sede da Organização das Nações Unidas que estabelece princípios básicos para utilização do uso de armas de fogo para prevenção de crimes e tratamento dos delinqüentes, assinado em Havana (1990). Este instrumento prevê (art. 9º) que o uso de arma de fogo para efetuar uma prisão apenas é considerado legítimo quando qualquer outro meio se apresente ineficaz, bem como quando do confronto com aqueles sujeitos resulta um perigo para a vida dos agentes ou terceiros. E só admite um homicídio intencional de quem está sendo detido – com a explosão da arma de fogo contra parte vital do corpo humano – quando absolutamente necessário para a tutela da vida dos agentes ou de terceiros.

04.3.2 As violações processuais. No que concerne às violações das obrigações processuais relativas ao art. 2º da CEDU, a Corte insiste que o homicídio por parte da força estatal seja exposto claramente no inquérito para que possa ser estabelecida a exata dinâmica dos fatos, e, assim, diminuir a possibilidade de absolvição fundada na insuficiência de provas.

04.3.2 Nos pronunciamentos mais recentes a Corte têm enfatizado a necessidade de efetiva punição dos responsáveis pela violação (com sanções penais e disciplinares) para uma justa satisfação da vítima, destacando que esse objetivo não pode ser alcançado tão-somente por meio de uma reparação de danos na esfera cível diante da extrema gravidade do fato, isto é, um atentado contra o mais importante entre os direitos fundamentais do homem.

04.3.3 Censura à legislação do Estado resistente. Sempre freqüentes são os pronunciamentos por parte da Corte censurando a legislação vigente no Estado resistente em matéria de uso legítimo das armas por parte dos agentes estatais, considerando-as inadequadas a respeito dos postulados impostos no art. 2º da CEDU. Transparente é a lógica da censura: uma lei que autorize de forma muito ampla e/ou imprecisa os agentes estatais a fazerem uso de uma força letal, de um lado instiga prática de homicídio fora dos casos permitidos e, de outro, comporta a impossibilidade de sancionar penalmente pelo ordenamento interno o agente que violou o direito fundamental e que, assim, será beneficiado.

Doutorado - Parte 5

05. Carlo Giuliani. O caso, atualmente em análise pelos julgadores de Estrasburgo, refere-se ao homicídio de Giuliani por parte de um agente policial durante um tumulto paralelamente ao encontro do G8 em Genova (2001). O exempo poderá ilustrar eficazmente quais são as novas possibilidades de tutela jurisdicional no plano internacional derivadas dos julgamentos da Corte de Estrasburgo em matéria do art. 2º, sobre as quais seguimos a exposição.

05.1 A reconstrução dos fatos. 20 de julho de 2001. Uma guarnição não blindada da polícia resta isolada e sem proteção no meio de um grande número de manifestantes armados com pedras, pedaços de pau de barras de ferro, e com evidente intenção agressiva. O vidro lateral da guarnição é quebrado por pedra lançada pelos manifestantes. Três policiais estavam em seu interno, entre eles Mario Placanica, auxiliar de apenas vinte anos que se intoxicou com o gás lacrimogêneo por ele mesmo lançado, e que por este motivo recebeu ordens de seu superior para se afastar da zona de perigo. Preso ao pânico, Placanica grita para os populares se afastarem, ameaçando-os de morte em caso de negativa. Então realiza dois disparos de arma de fogo, um deles atingindo a face de Carlo Giuliani, que se encontrava a breve distância da guarnição e portava um extintor. Outro policial, na direção do veículo, engata a marcha ré e passa por cima do corpo de Giuliani, neste tempo caído ao solo. Depois, insere a primeira marcha e passa uma segunda vez sobre o corpo, afastando-se. Os socorristas chegam apenas para constatar a morte do jovem. A autópsia realizada sobre o cadáver conclui que a causa da morte foi o disparo do projétil que atingiu a vista de Giuliani e não a sucessiva investida por parte do motorista da guarnição sobre o seu corpo. Em relação à trajetória do projétil, em sede de autópsia se constatou perfuração do alto para baixo. Essa conclusão, no entanto, restou modificada por uma série de consultas técnicas, pois com prova de vídeo, uma vez que o corpo fora cremado, os peritos verificaram que a trajetória da bala fora modificada pelo impacto com uma pedra lançada pelos populares, sendo que um seu fragmento atinge o rosto da vítima adentrando de baixo para cima, sendo esta a causa da morte. Com base nessa reconstrução dos fatos, a magistratura de acusação formula pedido de arquivamento do feito. Afirma que o disparo não fora promovido em direção à vítima e entende que a conduta do agente estatal estava acobertada pela excludente de legítima defesa, ainda que se considere o dolo eventual, porque no momento do disparo os três policiais encontravam-se expostos a uma série agressão a suas incolumidades ou, inclusive, as suas vidas, por parte do grupo que circundava o veículo. Sob esta condição, o disparo de arma de fogo, que possivelmente não fora efetuado em direção a nenhum dos populares, mostrou-se uma medida proporcional e necessária em relação ao perigo. A legítima defesa é aceita e o arquivamento se verifica.

05.2 O recurso à Corte de Estrasburgo. Exauridas as vias de recurso interno os familiares da vítima recorrem à Corte de Estrasburgo revelando violação por parte do Estado ao direito fundamental da vida sob o viés substantivo e sob o aspecto processual, pois vejamos.

05.2.1 Preliminarmente afirmam que a Corte não está vinculada a reconstrução dos fatos operada em nível interno. Assim, contestam a afirmação de que o projétil foi desviado por uma pedra arremessada pelos populares e negam, inclusive, que os ocupantes do veículo estivessem expostos a um perigo de vida uma vez que os manifestantes não se encontravam munidos de armas letais, muito menos esse perigo decorria da conduta da vítima. Logo, o uso da arma de fogo representou um meio desproporcional, contrário ao art. 2º, como entende a jurisprudência de Estrasburgo.

05.2.1 No mérito e, sobretudo, os recorrentes alegam a defeituosa organização e gestão da operação policial, imputando aos superiores hierárquicos de Placanica responsabilidade penal tendo em vista o descumprimento de vários princípios básicos em matéria de uso de arma de fogo emanados da Organização das Nações Unidas, já destacado. Primeiro, pois não resultou clara uma indicação preventiva ao uso de arma. Depois, dentro das circunstâncias, os policiais deveriam usar armas neutralizadoras, mas não letais. Terceiro, que estes deveriam estar em guarnição blindada, própria para minimizar o risco de eventual agressão. Quarto, a escolha de jovens e inexperientes policiais em situações de desordem pública. Finalmente, os recorrentes argumentam sobre a generalidade como é definida a causa de justificação da legítima defesa prevista no Código Penal Italiano que não indica de maneira precisa os pressupostos sobre o uso de armas letais, bem como, contrariando as decisões da Corte, não menciona o requisito da proporcionalidade a respeito do escopo perseguido.

05.2.2 Sob o aspecto das obrigações processuais relativas ao art. 2º da CEDU os recorrentes lamentam defeitos de efetividade, presteza e independência do inquérito, bem como a falta de participação do órgão de acusação na maior parte das tarefas de investigação. Ausência de efetividade, pois o inquérito enviado à acusação se mostrou parcial e incompleto, porquanto se restringiu aos policiais participantes, sem mencionar as omissões por parte dos superiores responsáveis pela operação. Ausência de presteza, porquanto, com base no inquérito, o órgão de acusação requereu seu arquivamento com fundamentação considerada superficial uma vez a impossibilidade de realização de nova autópsia em razão de o cadáver ter sido cremado. Por fim, vício na independência, pois o inquérito foi prolatado com participação de um dos peritos que posteriormente publicou em artigo científico que o projétil havia sido desviado e que o disparo fora praticado em ação de legítima defesa, estudo este que serviu de fundamento ao pedido e conseqüente deferimento do arquivamento do inquérito.

05.2.2 Os recorrentes também lamentam não terem participado na maior parte dos atos do inquérito, uma vez que a processualística italiana não garante qualquer papel na produção da prova. Eis o segundo motivo do recurso, em decorrência da inobservância do direito da parte ofendida de participar da formação da prova, como previsto na CEDU. Por fim, argumentam a falta de imediato socorro por parte do Estado depois que a vítima fora atingida pelo disparo e, sucessivamente, investida a guarnição policial sobre o seu corpo.

05.3 A Corte, em data de 07 de fevereiro de 2007, admitiu o recurso, afastando preliminar argüida pelo Governo Italiano de que os recursos internos não haviam sido eliminados, pois ainda está em aberto a possibilidade de reparação dos danos civis. Recorrendo a decisões da própria Corte, entenderam os julgadores que, embora a hipótese do ressarcimento efetivo em sede civil aos familiares de Giuliani seja possível, esta não seria suficiente para assegurar uma satisfação completa, considerando a extrema gravidade do fato. Aguarda-se, ainda, a decisão de mérito.

Doutorado - Parte 6

06. Impactos da jurisprudência de Estrasburgo sobre o ordenamento italiano em termos de obrigação de adequação deste com respeito às indicações provenientes daquela. Do ponto de vista do direito internacional frisa-se, preliminarmente, que é pacífico que o ordenamento italiano tem a obrigação de adequar-se à CEDU. Dever que, como antes delineado, também se estende a todos os órgãos e poderes estatais. Primeiro ao legislador, com sucessivos pedidos pela Corte para que proceda à adequação do ordenamento de acordo com os postulados da CEDU, isto é, altere a legislação vigente que se apresenta divergente às obrigações emanadas da CEDU e de seus protocolos, uma vez que a liquidação de danos realizada no caso concreto não é suficiente para a satisfação da vítima de violação, sendo fundamental rever a legislação para evitar a repetição de violações aos direitos fundamentais. Segundo aos julgadores, com particular referência aos operadores das cortes superiores para elaboração de orientações de interpretação de casos aos magistrados inferiores de acordo com as diretrizes provenientes da Corte de Estrasburgo com a intenção de assegurar o respeito aos direitos humanos já em sede de primeiro grau de jurisdição nacional. Seria a adoção da doutrina de vinculação de um ponto de vista do ordenamento interno aquilo que se possa chamar de “direito de Estrasburgo”. Outras notas mais específicas para o Poder Executivo e para o Poder Judiciário:

06.1 Obrigações a cargo dos órgãos do Poder Executivo. Dever-se-á subordinar o uso de arma letal pelos agentes estatais recorrendo não apenas aos pressupostos da legítima defesa consagrados no Código Penal, porém também aos posteriores pressupostos individuados nos julgamentos da Corte e, em particular, aqueles que derivam dos princípios básicos consagrados pela ONU e que sucessivamente são o norte nas decisões da CEDU. Os agentes superiores deverão orientar os agentes inferiores, estes selecionados e formados por meio de processo idôneo, quanto ao uso de armas letais em singulares operações. E sob o ponto de vista processual é necessário que se assegure a realização de um inquérito interno eficaz para apuração de responsabilidade depois de qualquer episódio no qual tenha sido utilizada uma arma de fogo por parte do agente estatal.

06.2 Obrigações a cargo dos órgãos do Poder judiciário: a) no que concerne à magistratura de acusação (inquirente) deve observar as obrigações processuais relativas ao art. 2º CEDU com atuação efetiva e independente para evitar a pré-constituição de condições para um efetivo recurso à Corte por parte das pessoas ofendidas; b) no que concerne à magistratura judicante deve saber que a Convenção Européia dos Direitos Humanos faz parte do ordenamento jurídico italiano e que tem a mesma natureza da legislação ordinária, sendo que na hipótese de uma lei ordinária contrariar a norma convencional deverá o juiz questionar a legitimidade da norma interna remetendo a questão à Corte Constitucional. Especificamente ao tema de uso de arma letal, o juiz ordinário deve realizar uma interpretação convencionalmente conforme o art. 53 do CP (legítima defesa), ou seja, a inserção em via hermenêutica na descriminante do requisito não escrito da proporcionalidade entre a conduta do agente público e os escopos perseguidos, sendo que o conteúdo da proporcionalidade é dado pelos princípios básicos estatuídos pela ONU (arts. 5º, 9º e 10). No caso de violação aos critérios convencionais deverá o magistrado aplicar pena adequada com duplo escopo: 1) prevenir eficazmente que no futuro nova violação por parte de outro agente estatal não se realize; 2) assegurar justa satisfação à vítima ou a seus familiares.

Doutorado - Parte 7

07. Notícias a respeito de posteriores atritos entre a Convenção e o vigente direito penal italiano: novas perspectivas de tutela dos direitos fundamentais e obrigação de adequação do ordenamento italiano. Interessa lançar um olhar em dois setores do vigente direito penal italiano que se apresentam em confronto com as obrigações decorrentes dos julgados da CEDU.

07.1 Atos de tortura. Um dos setores nos quais o ordenamento italiano se apresenta mais deficitário a respeito das obrigações derivadas da CEDU é, notoriamente, a de insuficiência de tutela prestada contra as vítimas de atos de tortura ou de tratamento desumano ou degradante operado por competência da força pública. O problema fundamental que aflige o ordenamento penal italiano a respeito das diretrizes européias está representado pela total ausência de uma norma penal que incrimine especificamente, e com pena eficaz, as condutas que constituem violação ao art. 3º CEDU segundo os princípios elaborados pela jurisprudência de Estrasburgo com base na Convenção da ONU contra atos de tortura (1984) e da Convenção do Conselho Europeu (1987). Eventuais atos de violência física provocados por agentes estatais contra pessoas privadas de liberdade resultam comumente puníveis, no ordenamento italiano, como crime de lesão corporal. Assim, diante da baixa reprimenda é possível a suspensão condicional da pena sempre que não se verificar, o que não é incomum, a própria prescrição. Em conclusão, a responsabilidade nesta matéria está nas mãos do legislador.

07.2 Expulsão dos estrangeiros. Não pode haver ingerência da autoridade pública quanto ao exercício do direito ao respeito da vida privada e familiar senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para defesa da ordem e prevenção de infrações graves. Nesse caso, a responsabilidade está a cargo tanto do executivo quando do judiciário.
Repito: em síntese, destaquei o que consegui apurar depois de muitas horas de jornada (oito no total). As exposições em lingua estrangeira (italiano e inglês) ainda acarretam um pouco de dificuldade de compreensão. Assim, limitei-me a expor o que ficou compreendido.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

XIMENES LOPES V. BRASILE

Destaco a intervenção que realizei hoje em Milão durante módulo do doutorado. O seminário tem como tema a Convenção Européia de Direitos Humanos e o Direito Penal.

Milano, 2 ottobre 2009.

Saluto a tutti.
Primo devo dire che sono molto felice di avere vinto questa borse di studio e potere stare con voi. Per me questo è veramente significativo. Pòi, scusate per gli errori di italiano, ma faccio ancora fatica di parlare fluido.

I’ intervento chè come base la sentenza della Corte Interamericana dei diritti dell’uomo di 04 luglio 2006 del caso Ximenes Lopes contro il Brasile.
È bisogno affermare che non è un “leading case” come, per esempio, quello relativo all’uccisione del giovane C. Giuliani ad opera per un agente della forza pubblica a Genova. Forse sia piu interessante il fatto che è succeso a Londra due o tre anni fà con all’uccisione del brasiliano Jean Charles anche per un polizia in metro. Ma sono incerto se questo fatto gia è arrivato a CEDU. Tuttavia, se non è un “leading case” rappresenta per la prima volta che la Corte Interamericana ha deciso un reato contro il Brasile. E anche questo fatto è historico perchè è la prima condanna in America per violazione di diritto dell’uomo con probleme mentali [1].

Piccola sintesi. In 1º ottobre 1999, la madre di Damião Ximenes Lopes ha internato lui, che aveva probleme mentali, nella clinica di ripouso di Guararapes (città di nome uguale). Trè giorni piu tarde, lei ritorna alla clinica per visitarlo, ma è informata da un impiegato che suo “filglio non poteva ricevere”. Però, lei entra nella clinica gridando il nome di Ximenes e subito lui è venuto in un stato deperito, con vari ematome e con le mani incatenati.

Sua madre ha chiesto a un impiegato per fare la doccia a lui. Dopo lei ha cercato il medico responsabile della clinica e che era anche l’esperto di medicine legale della città. Lui ha prescritto alcune medicine senza almeno visitare Ximenes. Dopo la madre ha chiesto dove si trovava suo figlio e un’impiegata della clinica ha detto che è successo una lotta forte fra Ximines e le infermiere e che lui, in virtù di questo, sarebbe stato moltissimo lesionato. La madre lo ha trovato in un letto, completamente nudo e ancora con le mani attacate. Poi, quando lei è tornata a sua casa ha ricevuto una telefonata della clinica con comunicato della morte di Ximenes.

L’autopsia disposta sul cadavere conclude che la causa della morte è un “l’arresto cardio-respiratorio”. Questa è firmata per direttore della clinica, il stesso medico che aveva prescritto solamente medicine a Ximenes. Davanti alle circostanze, la famiglia di Ximenes decide diprendere il cadaver pel l’analisi nella principale città dalla provincia. Conclusione: “morte certificata di indeterminata causa”. Da questo momento la famiglia capisce che la tortura che ha sofferto Ximenes era la causa della morte e, cosi, ha richiesto in giudizio civile il resarcimento de danno e in giudizio penale ha colaborato con la magistratura inquirente. E dopo la famiglia ha richiesto davanti alla Corte Interamericana.

Sentenza della Corte. Resarcimento alla famiglia con $ 135.000.00.

Deciso. La Costituzione Brasiliana autorizza l’uso delle istituzione private per complementare il dovere pubblico di fornire l’assistenza medica. Significa un’estensione dell’esercicio del dovere publico. Così, il Brasile era responsabile degli atti impiegati della clinica. Ha deciso che il Brasile è responsabile della violazione del art. 4º (diritto a vita) e art. 5º (diritto a incolumità fisica). E ha deciso anche che il Brasile è responsabile della violazione di oblighi di garanzie e protezione di accesso a giustizia (art. 8º e art. 25), perchè uno degli elementi del processo avuto previsto nella Convenzione Interamericane è che i tribunali del paese che è parte resistente decidano i casi in un tempo ragionevole. Tuttavia, la responsabilità civile ed criminale non ancora avuti raffinato in momento di questa sentenza. E questo più di 75 settimane. È tutto.

Grazie a tutti.
L.

[1] Nell’ ambito della CEDU, caso di Storck v. Germania, n. 61.603/00, j. 16/06/2005.