quarta-feira, 2 de julho de 2014

Trabalho externo regime semiaberto

O relator da Ação Penal (AP) 470, ministro Luís Roberto Barroso, autorizou o trabalho externo de cinco condenados: os ex-deputados federais Valdemar Costa Neto, Pedro Côrrea e Carlos Alberto Rodrigues Pinto (Bispo Rodrigues) e os ex-tesoureiros do PT Delúbio Soares e do PL (atual PR) Jacinto Lamas. Por outro lado, negou o benefício ao ex-deputado federal Romeu Queiroz e ao advogado Rogério Tolentino. 

As decisões foram tomadas na análise dos agravos regimentais interpostos pelos condenados contra decisões do antigo relator da AP 470, ministro Joaquim Barbosa, nas execuções penais (EPs). Na sessão da última quarta-feira (25), o Plenário da Corte deu provimento ao agravo regimental interposto por José Dirceu e deferiu o pedido de trabalho externo por ele pleiteado. 

Com base nas teses fixadas nesse julgamento, o Plenário autorizou o relator a decidir monocraticamente os demais recursos sobre a matéria. Ao reformar as decisões anteriores que vetaram o trabalho externo, o ministro Roberto Barroso considerou que a exigência do cumprimento de um sexto da pena, prevista no artigo 37 da Lei de Execução Penal (LEP), para o apenado ter direito ao benefício não se aplica aos condenados no regime semiaberto. 

De acordo com o relator, há mais de 15 anos o Superior Tribunal de Justiça (STJ), órgão encarregado de uniformizar a interpretação do direito federal, consolidou esse entendimento, que é seguido pelos tribunais de justiça dos estados, responsáveis pela execução direta das penas aplicadas aos condenados. 

O ministro Luís Roberto Barroso destacou que o artigo 112 da LEP prevê a possibilidade de progressão de regime, com a transferência a regime menos rigoroso, por decisão do juiz, após o cumprimento de um sexto da pena. Ou seja, caso não haja incidente atípico na execução após cumprir um sexto da pena, o apenado em regime semiaberto passa para o regime aberto. 

 “Nesse momento, ela passa a ter automaticamente direito ao trabalho externo, por ser da essência do regime aberto. Isso significaria, então, que no regime semiaberto não haveria direito ao trabalho externo, porque se fosse exigível aguardar o cumprimento de um sexto da pena, o condenado já estaria no regime aberto”, fundamenta. 

 Segundo o relator, o trabalho externo para os condenados no regime semiaberto também é o melhor do ponto de vista pragmático levando em conta a atual situação carcerária do país. 

Relatando dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o ministro Roberto Barroso citou que o déficit de vagas no sistema penitenciário brasileiro é de 210.436 vagas. Além disso, diversos estados não possuem colônias agrícolas, industriais ou similares, onde os condenados no regime semiaberto deveriam cumprir sua pena. “Se todos reconhecem que o sistema está abarrotado e que não há oferta suficiente de trabalho interno mesmo nos poucos estabelecimentos que têm o perfil adequado para o regime semiaberto, por qual razão se haveria de negar o trabalho externo aos presos que preencham os requisitos subjetivos e tenham uma oferta real e adequada de uma instituição pública ou privada?”, apontou. 

 Delúbio Soares 

Em relação ao recurso de Delúbio Soares na EP 3, o ministro Roberto Barroso avaliou que o fato de o condenado ter solicitado trabalhar na CUT (Central Única dos Trabalhadores), da qual é um dos fundadores e onde atuou por vários anos, não impede a concessão do benefício. “Como todos os demais condenados em regime semiaberto que pleiteiam o direito ao trabalho externo, é certo que o agravante buscou uma oportunidade junto a pessoas do seu ciclo de relações”, disse. A seu ver, o fato de a oferta de trabalho vier de um local em que o apenado já atuou não é causa suficiente para a revogação do benefício, pois é uma forma legítima de reinserção social. 

 Valdemar Costa Neto 

Na decisão referente ao ex-deputado Valdemar Costa Neto (EP 19), que exercia a função de gerente administrativo de um restaurante, o relator sustentou que não há vedação legal ao trabalho externo em empresa privada e que o artigo 36 da LEP fala expressamente em “entidades privadas”. “Embora esse dispositivo cuide especificamente do trabalho externo para os condenados em regime fechado - que deve ser realizada em obras públicas - não seria coerente imaginar que o regime semiaberto, menos restritivo, estaria sujeito a vedações adicionais e implícitas”, assinalou. 

Conforme o ministro Roberto Barroso, o trabalho externo em entidade privada é efetivamente praticado na realidade do sistema carcerário, beneficiando vários condenados que se valem dessa oportunidade para encaminhar sua reinserção social. “Também aqui, não vejo qualquer fundamento constitucionalmente legítimo que justifique dar tratamento desigual aos condenados na AP 470 ou, o que seria muito pior, promover um retrocesso geral no sistema e restringir as perspectivas já limitadas dos presos no Brasil”, observou. 

Jacinto Lamas

O ministro Roberto Barroso também restabeleceu o trabalho externo deferido a Jacinto Lamas (EP 11) pelo juízo da Vara de Execuções Penais (VEP) do Distrito Federal. Conforme o relator, os autos atestam que Lamas vem desenvolvendo atividades laborativas, tanto na biblioteca interna quanto na limpeza e manutenção do estabelecimento prisional, sem anotação de indisciplina. “Não existem razões objetivas que desabonem a conduta carcerária do agravante”, afirmou. 

O relator reforçou que o ex-tesoureiro do PL entregou-se voluntariamente para o cumprimento da condenação e não há qualquer elemento que sugira o risco de que venha a se evadir. Constatou, ainda, a aptidão para o trabalho pretendido, na linha do que exige o artigo 37 da Lei de Execução Penal, portanto, sob o ponto de vista pessoal, não existe impedimentos à adoção da medida. Lamas recebeu oferta de emprego formulada por empresa de engenharia estabelecida no Distrito Federal há mais de 20 anos, sem que haja qualquer indicativo de inadequação. 

Pedro Corrêa

Em relação a Pedro Corrêa (EP 16), o relator reconsiderou a decisão questionada para restabelecer o trabalho externo em uma clínica de Garanhuns (PE). Segundo o ministro Roberto Barroso, a VEP de Pernambuco realizou procedimento de análise da adequação da proposta, incluindo a inspeção no local de trabalho, além de determinar a utilização de dispositivo de monitoramento eletrônico. O relator salientou que não há anotação de indisciplina do ex-deputado e também não há razões objetivas que indiquem falta de responsabilidade para o trabalho externo. Lembrou ainda que Corrêa também se entregou voluntariamente para o cumprimento da condenação e não há qualquer elemento que sugira o risco de que venha a se evadir. 

Quanto à questão da saída temporária, para evitar distinções em relação aos demais condenados que cumprem pena em Pernambuco, o ministro Roberto Barroso restabeleceu a decisão da VEP. O relator autorizou a saída para visitação à família, impondo a utilização de dispositivo de monitoramento eletrônico, com a ressalva de que seja observado um intervalo mínimo de 45 dias entre as saídas. 

Carlos Alberto Rodrigues 

O condenado Carlos Alberto Rodrigues Pinto (Bispo Rodrigues) recebeu convite para trabalhar em uma Estação de Rádio sediada em Brasília. Ao decidir na EP 17, o ministro Roberto Barroso mais uma vez frisou que o trabalho externo em entidade privada é não apenas possível, mas efetivamente praticado na realidade do sistema, beneficiando numerosos condenados que se valem de oportunidades como essa para encaminhar a sua reinserção social. O ministro lembrou que o sentenciado entregou-se voluntariamente para o cumprimento da condenação e não ha qualquer elemento que sugira o risco de que venha a se evadir. 

Além disso, constata-se que o Bispo Rodrigues apresenta a aptidão para o trabalho pretendido - de supervisor de manutenção na Rádio Antena 9 -, na linha do que exige o artigo 37 da LEP. “Sob o ponto de vista pessoal, portanto, não verifico impedimentos a adoção da medida”, concluiu o relator ao reconsiderar a decisão e permitir o trabalho externo para o condenado. 

Romeu Queiroz e Rogério Tolentino 

Com relação ao pedido de trabalho externo formulado pelo ex-deputado Romeu Queiroz e pelo advogado Rogério Tolentino, o ministro Roberto Barroso desproveu os agravos por eles interpostos, respectivamente nas EPs 12 e 20, e manteve decisão do então relator, ministro Joaquim Barbosa, que impedia a prática de trabalho externo para os apenados. Queiroz pretendia obter autorização para trabalhar na empresa RQ Participações S.A., de sua propriedade. Já Tolentino pedia autorização para trabalhar na mesma empresa e para estudar fora. Para o relator, da documentação juntada aos autos, não se verifica a realização de diligências prévias para aferição da idoneidade da proposta de emprego. 

O ministro Roberto Barroso ponderou que o convênio firmado entre Minas Gerais e a empresa do ex-deputado não especifica a jornada de trabalho a ser cumprida, “limitando-se a estabelecer o máximo de oito horas diárias”. Salientou ainda que “embora o convênio estipule as obrigações do empregador, não há menção aos mecanismos de controle da jornada de trabalho e das tarefas realizadas”. 

O ex-deputado pretendia ainda reverter decisão do então relator que não autorizou sua saída da penitenciária para participação em curso de Teologia, na modalidade ensino a distância, no horário de 19h30 às 23h30. Ao decidir sobre o pedido de estudo externo, o ministro levou em consideração os mesmos princípios observados em relação às condições que permitem autorizar o trabalho externo e que, em sua avaliação, dispensam o cumprimento de um sexto da pena. 

“Considero que a exigência do requisito temporal esvaziaria o instituto da saída temporária e a própria possibilidade, relevante para a ressocialização, de estudo externo”, ressaltou. Entretanto, o ministro registrou que, no caso de estudo, “esse entendimento não se encontra cristalizado na jurisprudência nacional”. Contudo, o relator destacou que, embora no pedido tenha sido especificada a unidade de ensino a ser frequentada, inexiste na decisão do juízo da VEP qualquer determinação ou ressalva quanto à fiscalização da rotina de estudo e datas de início e fim do curso. Dessa forma, ele afirmou que tal autorização está “em contrariedade à determinação legal de que o afastamento da unidade prisional deve durar o período necessário à realização da atividade educacional (LEP, artigo 124, parágrafo 2º)”. 

O mesmo critério foi utilizado pelo ministro para rejeitar o pedido de estudo externo para Tolentino. 

Fonte: Supremo Tribunal Federal

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