segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Falsidade ideológica eleitoral

Durante sessão plenária realizada na tarde desta quinta-feira (11), os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) receberam denúncia (INQ 1990) do Ministério Público Federal (MPF) contra o senador Valdir Raupp de Matos (PMDB-RO) e José Carlos Silvério - responsável pela administração financeira da campanha de Raupp ao governo de Rondônia em 1998 - pelo crime de falsidade ideológica para fins eleitorais (artigo 350, do Código Eleitoral), em concurso de pessoas (artigo 29 do Código Penal). A votação ocorreu por seis votos a dois, vencidos os ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes, que se manifestaram pelo arquivamento do inquérito.

Com o recebimento da denúncia, e após o trânsito em julgado do acórdão, o parlamentar passará a responder, no STF, como réu em ação penal por crime de falsidade ideológica para fins eleitorais.

Denúncia

A denúncia contra Valdir Raupp e José Carlos Silvério foi oferecida no dia 13 de outubro de 2005 pelo então procurador-geral da República Antônio Fernando Souza. Conforme a denúncia, em 24 de novembro de 1998, os acusados protocolaram no Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia (TRE-RO) prestação de contas “contendo dados sabidamente inverídicos”.

Da demonstração de recursos arrecadados, segundo a denúncia, consta doação de R$ 90.350,00 em dinheiro, por uma empresa, parcelados nos dias 30 de setembro, 6 de outubro e 13 de outubro, todos do ano de 1998, para a campanha a governador de Raupp. No entanto, foi apurado no inquérito que a empresa não realizou qualquer contribuição para a campanha eleitoral de 1998.

De acordo com o Ministério Público, tal fato é comprovado por documento que contém declaração do proprietário da empresa e a informação prestada pela Secretaria da Receita Federal no sentido de que entre 1º de janeiro de 1997 a 31 de dezembro de 1998 não houve qualquer movimentação financeira feita pela empresa. Portanto, para o MPF, os denunciados inseriram declaração falsa em documentos para fins eleitorais, o que justificaria a instauração de ação penal.

Defesa

Os réus alegaram atipicidade da conduta, ausência de dolo e falta de elemento subjetivo do tipo. Valdir Raupp, especificamente, sustentou que, como candidato, não tinha conhecimento pessoal de que a empresa não havia feito a doação e que assinou a prestação de contas por imposição legal, além de não ter participado de sua elaboração.

MPF

O Ministério Público Federal entendeu que a presença ou não do dolo deve ser demonstrada no curso da ação penal. Também considerou que os dois denunciados são responsáveis pela veracidade das informações financeiras nela contidas. “O documento foi assinado livremente pelos denunciados e foi entregue pessoalmente pelos dois ao Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia”, afirmou o procurador-geral.

Ele ressaltou que uma das doações que teriam sido feitas pela empresa consiste no quarto valor mais elevado de todas as doações feitas para a campanha. “Não passaria desapercebido do candidato e, muito menos, daquele responsável por suas contas de campanha esse valor”, completou.

Materialidade e autoria

A relatora, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, votou no sentido de receber a denúncia. “A materialidade da infração penal parece-me suficientemente demonstrada, nessa fase de cognição ainda sumária, pelos documentos juntados”, disse. Para ela, há indícios de que foram inseridas declarações falsas na prestação de contas da campanha de Raupp para governador do estado de Rondônia, em 1998, na qual constam doações feitas pela empresa, "o que pode não ter ocorrido”.

Quanto à autoria, a ministra entendeu que estão presentes elementos suficientes que demonstram, pelo menos em princípio, “recair sobre os denunciados as práticas denunciadas pelo Ministério Público”. Segundo ela, o documento foi assinado pelos denunciados e neles constam recibos de que a empresa teria feito a doação, que foi negada por seu proprietário.

“A suposta falsidade somente fica evidenciada por ter havido uma declaração posterior da pessoa tida como doadora afirmando que as doações não ocorreram. Assim, está presente uma conduta supostamente lesiva e antijurídica, porque o Poder Judiciário ou qualquer outro órgão não teria condições materiais de procurar cada um dos milhares de doadores de campanha para investigar se a doação realmente foi feita”, explicou a relatora. Segundo ela, o Poder Público confia nas declarações e a investigação é realizada quando há, como no caso, apresentação com “indícios veementes” de suspeita de falsidade levantadas pelo Ministério Público Eleitoral.

A ministra observou que o delito é formal, portanto, e para a sua consolidação, não exige a ocorrência do resultado dano. “É fato incontroverso que os denunciados assinaram a demonstração de recursos arrecadados, o que leva a presunção de que tinham conhecimento e estavam em acordo com o que estavam assinando”, avaliou.

Além disso, ressaltou que os artigos 20 e 21 da Lei 9.504/97 (Código Eleitoral) estabelecem que “o candidato a cargo eletivo fará diretamente, ou por intermédio de pessoa por ele designada, a administração financeira de sua campanha, usando recursos repassados pelo comitê, inclusive os relativos à cota de fundo partidário, recursos próprios ou doações de pessoas físicas ou jurídicas na forma estabelecida nesta lei”. Também salientou que o candidato é solidariamente responsável pela veracidade das informações financeiras e contábeis de sua campanha devendo ambos assinar a respectiva prestação de contas.

Assim, a ministra analisou que “competirá à defesa dos denunciados fazer a contraprova ou ter a defesa suficiente do que apresentado pelo Ministério Público no transcorrer da instrução processual”, uma vez que os fatos estão narrados de forma clara, precisa e objetiva na denúncia, de acordo com o que prevê o artigo 41 do Código de Processo Penal.

Por fim, a relatora disse que não é aceitável denúncia feita por José Carlos Silvério de que os donos da empresa são fraudadores do fisco, não merecem credibilidade e estão atuando neste processo para criar dificuldades aos denunciados. “Essa afirmação não altera a imputação feita pelo Ministério Público”, disse, ressaltando que se algum ilícito tributário foi praticado por terceiros, isso deverá ser apurado pelas instâncias próprias e no momento devido.

O voto da relatora, pelo recebimento da denúncia, foi acompanhado pelos ministros Marco Aurélio, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto e Ellen Gracie.

Rejeição da denúncia

O ministro Dias Toffoli votou pelo arquivamento do inquérito. Segundo ele, o documento em questão teria natureza particular, e não pública, fato que implicaria na variação da prescrição da pretensão punitiva do Estado que, para o Toffoli, ocorreu no dia 24 de novembro de 2006. No mesmo sentido, votou o ministro Gilmar Mendes.

Fonte: Supremo Tribunal Federal

Nenhum comentário:

Postar um comentário