sexta-feira, 1 de julho de 2011

O entusiasmo do futebol

Hoje estou desportivo!

Destaco o brilhante texto do ex-jogador Sócrates publicado hoje no portal www.yahoo.com

Show de bola do Doutor.

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Por que o futebol causa tanto fascínio nas multidões? Por que tanta paixão, alegria ou lágrimas desenfreadas? Pensando bem, não deveria ser assim, já que o mundo do futebol é como uma roda gigante eternamente girando em torno de seu eixo central. Equipes ganham torneios, outras perdem. No ano seguinte, tudo geralmente é diferente. As vitórias causam euforia, as derrotas depressão. Passados esses momentos de alteração emocional tudo volta a zero e recomeça como se nada tivesse acontecido. Que algo mágico há no futebol que faz com que uma nação inteira se una?

Algo raro em países como o Brasil, onde o espírito comunitário (somos muito mais solidários que comunitários e mais individualistas do que se possa imaginar) e a aproximação entre desconhecidos só se dá entorno do futebol. Se fosse só aqui poderíamos imaginar alguma idiossincrasia nossa - como é o carnaval. Porém, ele ultrapassa línguas, religiões, raças, culturas, ideologias, países - como os que logo se enfrentarão em busca do título da Copa América. Que esporte é esse que cria confrontos e os acomoda, que multiplica rivalidades históricas fruto de conflitos de terras entre países vizinhos e ao mesmo tempo os coloca lado a lado em um campo de jogo a se respeitar? Os outros esportes não criam torcidas perenes e uníssonas; elas só aparecem temporariamente quando dos grandes eventos. Por que causas mais tocantes não comovem tanto quanto o futebol; como as crianças nas ruas, os terremotos, os tsunamis, a miséria extrema no coração da África e em alguns outros recantos, o genocídio e muitas outras? Quando a equipe vence uma competição a cidade para, a gente sai às ruas, os fogos aparecem, os torcedores se embebedam em uma enorme festa que já no dia seguinte é velha o suficiente para gerar expectativas para o próximo torneio. É fugaz toda essa explosão de euforia. Uma droga talvez tivesse um efeito mais duradouro, mas nunca teria um número tão alto de usuários. E o futebol, quando não oferece a vitória, provoca reações incontroláveis das massas que saem destruindo tudo o que veem pela frente, colocam fogo no mesmo estandarte que minutos antes beijavam, enfrentam as forças de segurança de peito aberto e sem armas como se eventuais outras agressões fossem menores e menos doloridas. A insanidade se estabelece em toda a sua expressão humana. Como dizia Nietzsche: “a loucura entre indivíduos é rara, mas entre as multidões é regra”. Como - relembrando algo que gostaríamos de esquecer ou pelo menos apagar da nossa história - nasceram o nazismo e o fascismo: através do entusiasmo popular. Uma nação entusiasmada pode ser maravilhosa ou, quem sabe, perigosa. As grandes emoções são poderes à mão de quem os veja, de quem os sinta; mesmo que seja prioritariamente para o mal.

Na Copa realizada na Argentina em 1978, assim como na vitória brasileira em 1970 no México, a junta militar de tudo fez um pouco para encobrir seus erros, seus métodos; a sujeira instalada nesses regimes tendenciosamente fora jogada para debaixo do tapete vermelho de sangue da nossa população agredida, torturada, desaparecida. Por isso muitas vezes me levo a pensar se poderemos um dia endereçar esse entusiasmo que gastamos no futebol em algo positivo para a humanidade, pois afinal de contas o futebol e a Terra têm algo em comum: ambos são uma bola. E atrás de uma bola vemos crianças e adultos, brancos e negros, altos e baixos, magros ou gordos. Com a mesma filosofia, todos a fantasiar sobre a própria vida.

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