quinta-feira, 15 de março de 2012

Embriaguez ao volante

I. Considerações iniciais sobre o delito de embriaguez ao volante

É indiscutível a relevância do crime de embriaguez ao volante no Direito penal, embora seja discutível uma série de aspectos que o envolvem. Não obstante seja distinto o propósito deste ensaio, primeiramente importa tecer duas rápidas considerações sobre uma decisão do Supremo Tribunal Federal que rechaçou a tese da inconstitucionalidade do delito que havia sido colocada em jogo. [1]

Em primeiro lugar, pela leitura do acórdão é evidente que a tese principal foi superficialmente analisada. Basta verificar que um tema complexo, explorado exaustivamente pela doutrina penal, foi analisado em um voto de cinco laudas que, descontadas as citações, quiçá não alcance três. Observa-se que o relator rejeita a tese, porém nem ao menos procura apresentar qual o fundamento constitucional da lesividade, isto é, se ele está expresso ou implícito em algum preceito. Além disso, eventuais aplausos pela síntese não encobrem as críticas à cartilha de que o Direito penal é o Direito judicial, e nada mais, pois o voto é motivado com total falta de distinção entre o vértice dogmático da conformidade do crime de perigo abstrato com o princípio da lesividade e o vértice político-criminal da necessidade desta técnica de incriminação.

Em segundo lugar, não obstante o ministro relator tenha delimitado corretamente a objetividade jurídica da presente infração ao descrevê-la como “a incolumidade física ou até mesmo a vida de indivíduos da coletividade”, insistiu erroneamente, como ainda o faz um setor da doutrina penal nacional, [2] em justificá-la em seu voto destacando tanto um precedente jurisprudencial quanto um parecer ministerial que se valeram da expressão sonora incolumidade pública. [3]

Afastando-se dessas questões, minha proposta será avaliar o aspecto relacionado à legitimidade desta infração tendo em vista se tratar de um crime de perigo abstrato. Analisarei de forma não aparente quatro tendências de legitimação do delito. Entendo que o contexto é pertinente, pois em realidade não muito distante poderemos estar diante de nova redação do artigo 306 da Lei de Trânsito ensejando, seguramente, algumas polêmicas de interpretação. [4]

II. Tendências de fundamentação do delito de embriaguez ao volante

a) Delito de perigo abstrato como delito formal

Na prática há quem entenda a embriaguez ao volante como um delito de perigo abstrato por se tratar de igual modo de um delito formal. [5] Isso porque haveria um traço distintivo entre os crimes de perigo, isto é, crime de perigo enquanto crime formal é o crime de perigo abstrato e o crime material de perigo é o crime de perigo concreto. Ao decidir por aquela justificativa o magistrado seguiu unicamente o propósito legislativo de punir pela simples desobediência à norma de cuidado para assegurar as expectativas sociais. [6]

Desconhecendo a melhor doutrina penal ou, em outros termos, somente conhecendo a clássica dicotomia entre crime de perigo concreto e crime de perigo abstrato, automaticamente o togado converteu o agente que praticou a conduta descumprindo unicamente a regra de segurança no trânsito, isto é, sem considerar as outras circunstâncias do caso concreto, em agente delitivo. [7] Entendo que essa fundamentação afronta as exigências de un Direito penal próprio de um Estado democrático de Direito.

Ademais, verificando-se realmente a supressão do percentual alcoólico da redação do tipo penal como é a intenção do legislador no projeto de lei referido, realizando-se a simples leitura dos respectivos elementos objetivos da nova redação e desconsiderando-se todas as circunstâncias do caso concreto, não haverá nenhuma distinção entre a futura infração penal e a atual infração administrativa, ensejando, a meu ver, patente ofensa ao princípio non bis in idem. [8]

Diante dessa possível conseqüência, é forçoso definir otros modos de se perfazer a tutela penal quando não se verifica diretamente a lesão ou o perigo concreto de lesão, isto é, de delimitar o vínculo entre a técnica de tutela e o bem jurídico tutelado. Assim, o ensaio seguirá com a análise de três diferentes modelos: os delitos de perigosidade concreta, os delitos de perigo geral e os delitos de potencial perigo, todos como espécies de delitos de perigo abstrato.

b) Delito de perigo abstrato como delito de perigosidade concreta

Referem Hirsch e Wohlers aos tipos penais que proíbem “condutas cuja perigosidade reside em que conduzem a situações não mais controláveis pelo autor e que, por essa razão, podem acarretar como conseqüência um perigo concreto aos correspondentes objetos jurídicos que entrem em seu âmbito de atuação”. [9] A essa conceituação segue a classificação dos delitos de perigosidade concreta como espécie de delitos de perigo abstrato. Exemplificam como ação concretamente perigosa o delito de embriaguez ao volante previsto no Código Penal alemão (§ 316/1). Essa incriminação é idêntica à nova proposta legislativa, isto é, “ela se realiza com a mera conduta de dirigir embriagado, sem que seja necessário um requisito adicional, como a lesão ou o perigo concreto para determinado bem jurídico protegido”. [10]

A construção dos penalistas alemães tem por fim afastar a punição penal pela desobediência. Aludem que as ações que geram um perigo provável aos bens jurídicos, em uma análise ex ante, podem ser punidas quando eles entram no raio de ação da conduta ilícita. E o perigo decorreria unicamente da ação de dirigir embriagado. A diferença para com os delitos de perigo concreto é que a análise do perigo não seria realizada em perspectiva ex post.

Em caso de importação desta doutrina, teria de discordar de sua aplicação para o atual contexto, pois não obstante uma concentração etílica superior à prevista no tipo penal, essa circunstância é apenas uma e não a única a ser considerada ex ante. Idêntica consideração valeria para um futuro contexto, porquanto em uma perspectiva ex ante, mesmo depois da mínima ingestão de álcool, que já estaria proibida pela lei da tolerância zero, se ninguém entrar na “área de influência” da ação do agente, não haveria conduta concretamente perigosa.

Entendo, ademais, que não haveria nenhuma diferença prática entre a conduta (proposta futura) de conduzir depois do mínimo consumo de álcool daquela conduta de dirigir sem a permissão de habilitação (art. 309), porém, seguindo o Código de Trânsito, para essa infração – que inclusive pode ser muito mais perigosa que a primeira – exige-se também análise da realização do perigo. Como duas medidas de idêntico peso poderão ser diversamente avaliadas pelo magistrado?

E embora haja várias pessoas no “horizonte causal da ação do agente”, em uma perspectiva ex ante ainda é possível avaliar que o agente pode controlar com perfeita aptidão a situação real, mas a essência do crime de perigo abstrato, independente da espécie, é estabelecer uma presunção em sentido contrário e que não admite prova. E nosso legislador recorre a essa técnica também com o novo projeto de lei. Mas ela é perigosa, porquanto demasiadamente geral, abstraindo elementos imprescindíveis de análise na situação concreta. [11] O pertinente é que “o perigo seja presumido com a realização da conduta, até que o contrário não seja provado”. [12]

E a quem competiria essa contraprova? Primeiramente ao próprio condutor, apesar da lembrança de Bacila de uma possível violação do princípio in dubio pro reo. [13] Depois ao magistrado, aqui como o observador médio, pois a tarefa do julgador não é pensar simplesmente sobre o direito, mas ainda sobre a justiça do direito. É a justiça, mais que o direito, que serve aos anseios de um Direito penal democrático. E a contraprova é possível nesse delito? A doutrina tende a admitir essa exceção apenas quanto aos tipos de perigo para bens jurídicos individuais. [14]

Aqui é necessário retornar a segunda observação que realizei em relação à decisão do Min. Ricardo Lewandowski. Em um primeiro momento o relator redefiniu a essência de definição do objeto jurídico tutelado pelo art. 306 do Código de Trânsito, contudo a remissão em seu voto tanto do julgado relatado pela ex-ministra Ellen Gracie [15] como do parecer ministerial [16] que fizeram alusão à incolumidade pública e à segurança viária, podem levar a errônea conclusão de que é tutelado no delito um bem jurídico coletivo e, assim, incompatível com a contraprova.

Essa remissão genérica é perigosa, pois, primeiro, o relator nem se preocupou em conceituar a incolumidade pública; em segundo, tampouco procurou diferenciá-la de uma coletividade de incolumidades particulares; finalmente, não se ateve que o trânsito em condições seguras nada mais é do que um princípio geral e que se apresenta, como descreve o italiano Paolo Veneziani, “claramente funcional”. [17] Aquelas expressões aproximam a fundamentação do bem jurídico de uma base ideal e não real, valorando-se a espiritualização penal que deve, muito ao contrário, ser totalmente refutada, como já o faz um setor da doutrina penal. [18]

O relevante, como em outra oportunidade já destaquei, prende-se ao fato de que a proteção do bem jurídico não deve servir de fundamento à expansão da pena, porém, pelo contrário, deve limitar o poder estatal de punir. Assim, em síntese, incolumidade pública nada mais é do que um bem jurídico aparente ou fictício, sendo que toda a tutela continua recaindo sobre a pessoa individual, mas sobre um número indeterminado ou indeterminável delas. E com isso, possibilita-se ao condutor e ao magistrado a realização da contraprova da presunção do perigo.

c) Delito de perigo abstrato como delito de perigo geral

Ainda pode suceder que o legislador preveja normas penais que pressupõem um comportamento geralmente perigoso segundo um juízo de probabilidade estatística. Nesse sentido, doutrina altamente qualificada se refere às condutas de massa nas quais é exigida uma padronização de comportamentos para evitar a realização tipicamente penal, como nos setores de risco, no qual o trânsito viário está incluído. E nesse contexto inserem a embriaguez ao volante. [19]

Já em jeito de crítica, vale começar interpretando Figueiredo Dias, pois o ilustre Catedrático de Coimbra frisa que não se deve no âmbito do Direito penal judicial, não obstante tenha o legislador presumido irrefragavelmente o perigo porque sua possibilidade é grande, próxima ou provável, desconsiderar os casos em que excepcionalmente o perigo não existe. [20]

Agora em análise particular, entendo que se poderia falar de padronização de comportamentos se o Código de Trânsito previsse uma taxa de concentração etílica no organismo humano que, desconsiderando todos os outros fatores concorrentes, a partir dela fosse possível afirmar sem qualquer dúvida que o álcool influencia indiscutivelmente na condução do veículo por qualquer pessoa. Essa interpretação pessoal não é descabida e para comprovar que a crítica merece maior atenção recentemente o Min. Luiz Fux, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4103 movida pela Abrasel, convocou audiência pública entendendo que “a temática versada na ADI reclama apreciação que ultrapassa os limites do estritamente jurídico, pois demanda abordagem técnica e interdisciplinar da matéria” e entre os temas controvertidos que o Ministro pontuou destaco aqueles pertinentes a minha anterior observação: “se a concentração de álcool por litro se sangue igual ou superior a seis decigramas gera, em qualquer pessoa, independentemente de sua compleição física, estado de embriaguez incapacitante para a condução de um veículo; se existe alguma concentração específica de álcool por litro de sangue capaz de atestar uma embriaguez incapacitante, de toda e qualquer pessoa, para a condução de um veículo automotor”. [21]

Ademais, em especial à legislação de trânsito atual, perfilho que se há dificuldade de comprovar empiricamente o perigo real quando o condutor ultrapassa a concentração etílica permitida pelo tipo incriminador, deve-se buscar outro fator concretizador do risco proibido diverso aquele que diz respeito ao consumo de álcool e não simplesmente adotar a punição por razões didáticas, como faz Wohlers, ou pedagógicas, como faz Roxin, para fortalecer a missão penal de prevenção geral. E novamente repito, suprimindo-se o percentual alcoólico com a aprovação do projeto de lei pelo Congresso Nacional, igualmente será necessário buscar um fator de concretização do perigo para diferenciar a futura infração penal da atual infração administrativa sob pena de ofensa ao princípio nos bis in idem.

Chegados aqui, para finalizar o tópico, há uma última questão que merece a pena deter atenção: o que seria um condutor não apto a dirigir depois do consumo de álcool? Essa pergunta tem importância singular mesmo com a definição de ações padrão no trânsito. Assim, entendo que todo aquele que consiga controlar o perigo como resultado da ingestão prévia de bebida alcoólica estaria apto a conduzir. Mas, ressalto: cabe só ao condutor controlar o perigo e não aos demais, pois estes não estão obrigados a se submeter aos riscos da conduta do infrator. Logo, embora ultrapassado o limite legal de álcool no sangue, se o condutor conduz em velocidade moderada, respeita os sinais de trânsito ou não realiza nenhuma ultrapassagem irregular, isto é, consegue compensar o perigo do consumo anterior, por exemplo, de três latinhas de cerveja que já seria suficiente para superar o mínimo permitido legalmente, ele não deve ser punido.

Na doutrina penal nacional, por exemplo, Luiz Flávio Gomes entende que essa análise configura os chamados crimes de perigo concreto indeterminado, pois além da condução sob a influência de álcool se faz necessária uma direção anormal. Embora adotando uma nomenclatura diversa, quiçá não a mais precisa, sua análise torna-se correta, sobretudo, em caso de aprovação do novo art. 306 do CTB quando será suprimida a taxa de concentração etílica no sangue. [22]

d) Delito de perigo abstrato como delito de potencial perigo

Hefendehl apresenta outra espécie de delito de perigo abstrato como delito de potencial perigo. [23] O relevante de sua construção é que ele limita o tipo penal objetivo pela idéia de criação de um risco proibido nos moldes da teoria da imputação objetiva. A anormal condução do veículo em razão da embriaguez (atual art. 306) ou de qualquer outro fator (futuro art. 306) e, portanto, contrária as normas de segurança no trânsito – em uma perspectiva ex ante – é que deverá ser considerada como criação de risco proibido para os bens jurídicos individuais que são tutelados penalmente, pois assim haverá potencialidade lesiva na ação praticada por parte do agente embriagado (atual) ou negligente (futuro) legitimando o tipo penal de delito. Essa análise será pertinente porque as suspeitas de condução por um agente embriagado ou negligente só nascem por sua direção anormal ou pela direção defensiva dos demais condutores.

Centrando maior atenção ao atual preceito incriminador, em síntese, é muito importante para tipificação do art. 306 do Código de Trânsito o que ocorre antes da realização do exame pericial. O superamento do risco-base quanto às regras de segurança provocadas por situações prepostas, como, por exemplo, manobras como andar em ziguezague ou pelo acostamento, ganha enorme importância porque, não obstante o consumo prévio do álcool seja desaprovado se superado um percentual, talvez, por si só, como destacado, dependendo da capacidade física e psíquica do condutor ou de sua estrutura orgânica, não supere o risco-base que acompanha a obediência à norma de cuidado.

E quais seriam as vantagens dessa construção em relação às anteriores? Comparando com a tese dos delitos de perigo abstrato como delitos formais, a vantagem estaria em não valorar com mais intensidade o significado da conduta delitiva, mesmo superando o risco-base, como uma negação das condições de vida em sociedade, em detrimento do real conteúdo do tipo penal que é a tutela da vida, da integridade física ou do patrimônio das pessoas que tomam parte do tráfego.

Para não punir pela mera desobediência ao comando normativo requer-se, assim, primeiramente, que o motorista crie um risco proibido (superando o risco-base relativo à norma de segurança no trânsito) e, depois, que haja bens jurídicos contra o qual as condutas arriscadas – condução em ziguezague, na contramão, etc. – possam estar direcionadas. E essa análise em momento algum modifica a natureza jurídica do delito do art. 306 da Lei de Trânsito, ou seja, a infração continua como delito de perigo abstrato, mas com uma especificidade maior.

Por sua vez, comparando com a tese dos delitos de perigosidade concreta, tem a considerável vantagem de diminuição de realização por parte do condutor de contraprova no sentido de que sua conduta não representou perigo aos bens jurídicos, pois como se defenderia de testemunhos dos agentes de trânsito atestando as manobras irregulares e, assim, aptas a ensejar uma situação de perigo aos bens jurídicos envoltos no raio de ação do condutor? Com a condução anormal do agente ou defensiva dos demais há possibilidade manifesta ofensa ao bem jurídico e, portanto, seria legítimo punir uma conduta por seu potencial perigo. [24]

Finalmente, comparando com a tese dos delitos de perigo geral e presente certas considerações anteriores, o fato de se portar adequadamente na direção mesmo superando a taxa de álcool no sangue (tipo penal atual) ou mesmo após a ingestão de um simples copo de cerveja (tipo penal futuro) revela que excepcionalmente o perigo não existe embora as conhecidas regras de experiência usadas para fundamentar a criação de delitos de perigo abstrato.

III. Conclusões

Creio que o leitor atento se deu conta que minha intenção foi legitimar a existência do delito de embriaguez ao volante como um delito de perigo abstrato. Nas linhas anteriores busquei colocar em relevo quatro das principais tendências e critiquei as três primeiras nos pontos que entendia discordantes com o contexto de um Direito penal democrático.

Minhas considerações, por evidente, são tímidas indicações para, quiçá, promover a análise de estudiosos mais qualificados e, assim, receber as devidas críticas e os possíveis elogios. Devo acrescentar que não pretendi em nenhum momento uma imposição de idéias, senão apenas promover uma pequena reflexão sobre essa interessante questão.

O estudo foi especialmente produzido àqueles magistrados que entendem que o Direito penal é o Direito judicial, e nada mais. Em outros termos procurei destacar, sublinho a traço grosso, a necessidade de um indispensável diálogo entre a Ciência penal e a magistratura.

Numa síntese deste ensaio: a) iniciei por apresentar a fragilidade dos argumentos combatentes da tese da inconstitucionalidade do delito de embriaguez ao volante, bem como a falta de clareza de uma interpretação constitucionalmente orientada do mesmo; b) solicitei cautela na análise do objeto jurídico do respectivo delito, porque nesse caso se está diante de um aparente bem jurídico coletivo construído da soma de vários bens jurídicos individuais; c) por mais de uma ocasião fui claro ao exigir uma análise restritiva por parte dos magistrados, pois se não há ninguém na rua ou nas imediações do veículo conduzido pelo condutor embriagado, não há porque puni-lo, embora comprovado que ele ultrapassou o limite mínimo permitido por lei; d) como também espero ter deixado claro que, existindo pessoas ou carros no raio do automotor conduzido pelo suspeito embriagado, a análise pelos juízes deverá ser teleológica, porque a aferição da tipicidade não deverá ocorrer unicamente pela descrição legislativa, sendo necessário precisar a nocividade da conduta preposta e oposta à proteção dos bens jurídicos; e, e) esclareci que essa análise pode ser adaptável à futura proposição legislativa ainda em trâmite no Congresso Nacional.

É o quanto basta.

_________________

[1] STF, 2ª Turma, Habeas corpus n. 109.269/MG, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE 11/10/2011.

[2] JESUS, Damásio de. Crimes de Trânsito. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 166; CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 308; MARCÃO, Renato. Crimes de Trânsito. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 306.

[3] Para outras considerações sobre o bem jurídico penalmente protegido, permitindo-se a citação própria: DE BEM, Leonardo Schmitt. Direito Penal de Trânsito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 159-161.

[4] A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado aprovou em caráter terminativo um projeto de lei que pode tornar mais rigorosa a Lei de Trânsito. Acaso também aprovado na Câmara dos Deputados, outra vez a redação do artigo da embriaguez ao volante ganhará novos contornos. Assim, segundo a proposta, “quem conduzir o veículo automotor sob a influência de álcool ou substância psicoativa que determine dependência” estará sujeito a pena de detenção, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir.

[5] TJDFT, 2ª T. Crim., Habeas corpus n. 2009.002002524-8, rel. Des. Souza e Ávila, j. 03/12/2009. Nessa situação, por exemplo, os julgadores esgotaram a análise da conduta típica analisando unicamente seus elementos objetivos, ou seja, fizeram uma verificação nua e crua de que o fato narrado corresponde ao tipo incriminador.

[6] JAKOBS, Günther. Derecho Penal. Parte General. Fundamentos y Teoría de la Imputación. 2ª ed. Trad. Joaquim Cuello Contreras e José Luiz Serrano Gonzáles de Murillo. Madrid: Marcial Pons, 1997, p. 44-45, acrescenta que “deve-se definir como o bem a proteger a firmeza das expectativas normativas essenciais frente à decepção, ou seja, firmeza frente às decepções que tem o mesmo âmbito que a vigência da norma colocada em prática”.

[7] Enganam-se os que pensam que a única classificação existente é a bipartida em delitos de perigo concreto e de perigo abstrato. HEFENDEHL, Roland. “El bien jurídico como eje material de la norma penal”, in La Teoría del Bien Jurídico. Trad. María Martín Lorenzo. Madrid: Marcial Pons, 2007, p. 193, nota 63, amplia estas categorías aos chamados “delitos de aptidão, delitos de perigosidade concreta e delitos de potencial lesivo”. Com interessante pesquisa no Brasil: BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Crimes de Perigo Abstrato. 2ª ed. São Paulo: RT, p. 141-170, elenca as diversas teorias pós-finalistas, como, por exemplo, “dos delitos de perigo abstrato como delitos de lesão, delitos de perigo abstrato como delitos formais e delitos de perigo abstrato como delitos de periculosidade”. Para excelentes considerações, da doutrina portuguesa: RODRIGUES, Marta Felino. As Incriminações de Perigo e o Juízo de Perigo no Crime de Perigo Concreto. Coimbra: Almedina, 2010, p. 13-106.

[8] O artigo 165 do Código de Trânsito, considerado uma infração gravíssima e com penalidade de multa e medida administrativa, com a redação dada pela Lei n. 11.705/08, é assim delineado: “dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência”.

[9] VON HIRSCH, Andrew; WOHLER, Wolfgang. “Teoría del bien jurídico y estructura del delito. Sobre los criterios de una imputación justa”, in La Teoría del Bien Jurídico. Trad. Spínola Tártalo. Madrid, 2007, p. 289-290.

[10] GRECO, Luís. Modernização do Direito Penal, Bens Jurídicos Coletivos e Crimes de Perigo Abstrato. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 33, nota 252 (aqui especialmente sobre Wolfgang Wohler).

[11] TRAPERO BARREALES, María. “Los delitos contra la seguridad vial”, in Libro em homenaje a Santiago Mir Puig. Madrid: La Ley, 2010, p. 866-867.

[12] ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro. Parte Geral. 5ª ed. São Paulo: RT, 2002, p. 561.

[13] BACILA, Carlos Roberto. Teoria da Imputação Objetiva. Curitiba: Juruá, 2008, p. 110, porquanto a “simples determinação do ônus da prova invertido pode ferir também o princípio, pois, caso o acusado não comprove uma ação inofensiva para os bens jurídicos, mesmo assim seria condenado”.

[14] RODRIGUES, Marta Felino. As Incriminações de Perigo e o Juízo de Perigo, p. 33-34.

[15] STF, 1ª Turma, Recurso em Habeas corpus n. 82.517-6/CE, relª. Minª. Ellen Gracie, DJE 21/02/2003, em termos literais: “o crime previsto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro (embriaguez ao volante) é crime de perigo, cujo objeto jurídico tutelado é a incolumidade pública e o sujeito passivo a coletividade.

[16] Retira-se textualmente do corpo do acórdão o entendimento do Parquet federal: “[...] Ora, o tipo penal descrito no art. 306 do CTB é de mera conduta, não tendo a lei exigido a efetiva exposição de outrem a risco, sendo irrelevante a avaliação subseqüente sobre a ocorrência de perigo à coletividade. Isto é, a objetividade imediata é a segurança viária e de forma indireta a incolumidade pública [...]” (grifo pessoal)

[17] STF, 1ª Turma, Recurso em Habeas corpus n. 82.517-6/CE, relª. Minª. Ellen Gracie, DJE 21/02/2003, em termos literais: “o crime previsto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro (embriaguez ao volante) é crime de perigo, cujo objeto jurídico tutelado é a incolumidade pública e o sujeito passivo a coletividade.

[18] DE BEM, Leonardo Schmitt. Direito Penal de Trânsito, p. 160. E também, muito mais qualificados: OTTO, Harro apud ANDRADE, Manuel da Costa. Consentimento e Acordo em Direito Penal. Coimbra, 2004, p. 110. Ainda: SCHÜNEMANN, Bernd. “El principio de protección de bienes jurídicos como punto de fuga de los límites constitucionales de los tipos penales y de su interpretación”, in La Teoría del Bien Jurídico. Trad. María Martín Lorenzo e Mirla Feldemann. Madrid: Marcial Pons, 2007, p. 222-223.

[19] Entre outros: WOLTER apud BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Crimes de Perigo Abstrato. 2ª ed. São Paulo: RT, 2010, p. 156 e ss. ROXIN, Claus. Política Criminal y Estructura del Delito. Barcelona: PPU, 1992, p. 51. Os autores fazem menção ao § 306/1 do Código Penal alemão que, como já destaquei, tem redação semelhante àquela estabelecida no novo projeto de lei do art. 306 do CTB.

[20] DIAS, Jorge de Figueiredo. O Problema da Consciência da Ilicitude em Direito Penal. 4ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1995, p. 407.

[21] Segundo notícia do portal eletrônico do Supremo Tribunal Federal, postada no último dia 05, “a convocação de audiência pública foi feita pelo ministro no curso da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4103, e será realizada no primeiro semestre de 2012 – com os interessados podendo se inscrever até a próxima sexta feira – para debater o objeto dessa ação. No processo, a Associação Brasileira de Restaurantes e Empresas de Entretenimento (Abrasel) questiona dispositivos que proíbem a venda de bebidas alcoólicas à beira das rodovias federais ou em terrenos contíguos à faixa de domínio com acesso direto à rodovia.

[22] GOMES, Luiz Flávio. Embriaguez ao volante (Lei 11.705/2008): exigência de perigo concreto indeterminado. Disponível em http://www.lfg.com.br 02 de julho, 2008.

[23] HEFENDEHL, Roland. El bien jurídico como eje material de la norma penal, 2007, p. 193.

[24] Embora a dificuldade em entender, em alguns pontos, as expressões utilizadas por Frank Zieschang no contexto dos delitos de perigo potencial, também ele destaca essa probabilidade de ofensa ao objeto da ação com a realização de condutas prepostas perigosas. As expressões “área de influência” e “horizonte causal da ação do agente” também são de sua escolha. Para a exposição das idéias do professor da Universidade de Würzburg, uma vez mais: RODRIGUES, Marta Felino. As Incriminações de Perigo e o Juízo de Perigo, p. 55-65.

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